30
de Dezembro de 2022
diário
‘As Beiras’
E
para colher vantagens, deixam tudo às ‘escuras’ os ignóbeis abencerragens destas
novas ‘sinecuras’
Dos
jornais:
“A
minha filha liga-me e diz-me: 'Não temos nada. Estamos completamente às
escuras'". Mãe acusa senhorio de esquema em Lisboa
A mãe de uma jovem universitária que vive em Lisboa
denuncia um alegado esquema do senhorio do quarto que arrenda, para ficar com a
caução e, pelo menos, um mês de pagamento adiantado.
Alega que o homem começou a levantar problemas ao fim
de pouco tempo de estadia, pedindo dinheiro para despesas extraordinárias -
água, luz e internet - forçando a saída dos estudantes, sem depois voltar a
responder aos contactos.”
“Que medidas para obstar a tamanhos incómodos?”
Apreciada a concreta hipótese de facto, cumpre responder:
1. Situações do jaez destas foram e são frequentes hoje em dia: daí
que o legislador haja entendido conferir aos arrendatários, pela Lei 12/2019,
de 12 de Fevereiro, peculiar tutela.
2. Aí se proíbe expressamente o assédio no arrendamento, a saber, “qualquer comportamento ilegítimo
do senhorio, de quem o represente ou de terceiro interessado na
aquisição ou na comercialização do locado, que, com o objectivo de provocar a
desocupação do mesmo, perturbe, constranja ou afecte a dignidade do
arrendatário, subarrendatário ou das pessoas que com estes residam
legitimamente no locado, os sujeite a um ambiente intimidativo, hostil,
degradante, perigoso, humilhante, desestabilizador ou ofensivo, ou
impeça ou prejudique gravemente o acesso e a fruição do locado”.
3. “Sem prejuízo da
responsabilidade civil, criminal ou contra-ordenacional decorrente dos actos e
omissões em que se consubstancie [um tal] comportamento, o arrendatário pode intimar o senhorio a tomar providências ao seu dispor
no sentido de:
§ Cessar a produção de ruído fora dos limites legalmente
estabelecidos ou de outros actos, praticados por si
ou por interposta pessoa, susceptíveis de causar prejuízo para a sua saúde e a
das pessoas que com ele residam legitimamente no locado;
§ Corrigir deficiências do locado ou das partes comuns do respectivo edifício que constituam risco grave
para a saúde ou segurança de pessoas e bens;
§ Corrigir
outras situações que impeçam a fruição do locado, o acesso ao mesmo ou a
serviços essenciais como as ligações às redes de água, electricidade, gás ou
esgotos.”
4. Da intimação
constará a exposição dos factos que lhe dão causa: “no prazo de 30 dias a
contar da recepção da intimação, deve o senhorio mostrar que adoptou as medidas
necessárias para corrigir a situação” ou revelar as razões que justifiquem a sua
não adopção.
5. Se o locador não responder ou a situação se mantiver
injustificadamente por corrigir, sem prejuízo da responsabilidade civil ou
criminal por tais factos cabível, e da faculdade de acesso aos demais meios judiciais
ou extrajudiciais, pode o locatário:
§ Requerer
uma injunção contra o locador, por forma a que corrija
a situação patente na intimação; e
§ Exigir
o pagamento de uma sanção pecuniária
no valor de 20 € por cada dia a partir do final do prazo estabelecido, até se mostrar o cumprimento da intimação ou, se o não
cumprir, até ser decretada a injunção.
6. A sanção pecuniária será elevada em 50 % (30 €/dia) se
o locatário tiver, ao menos, 65 anos ou grau comprovado de deficiência de 60 %.
7. A intimação caduca, extinguindo-se a
respectiva sanção pecuniária, se a injunção não for requerida no prazo de
30 dias do termo do prazo inicial (também de 30 dias), ou se for
indeferida.
8. A injunção
é requerida no Serviço de Injunção em Matéria de Arrendamento (SIMA), criado no
seio da Direcção-Geral
da Administração da Justiça (DGAJ/MJ).
EM CONCLUSÃO:
a.
Sempre que o locador cause perturbação no locado, através seja de que
expediente for, por forma designadamente a impedir a sua normal fruição, pode o
locatário intimá-lo mediante comunicação a fazer cessar todo e qualquer comportamento
perturbador.
b.
O locador deve, em 30 dias, adoptar as medidas adequadas a restituir ao
locatário as condições de normal fruição do locado, ou seja, do lugar dado de
arrendamento.
c.
Se tal não ocorrer, cumpre ao locatário requerer, em 30 dias, no SIMA,
injunção tendente a que o locador emende a mão, como ainda,
d.
Por cada dia de atraso, uma sanção pecuniária de 20 €, excepto se tiver, ao
menos, 65 anos ou grau comprovado de deficiência de 60%, em que o montante
diário ascende a 30 €.
Mário Frota
Presidente do Instituto Luso-Brasileiro de Direito do
Consumo – Coimbra / Rio de Janeiro