terça-feira, 28 de setembro de 2021

PORTUGAL Nova Lei das Garantias dos Bens de Consumo (ainda no limbo)

 


GARANTIA COMERCIAL

A garantia comercial vincula o garante, o fornecedor, nos exactos termos das condições constantes da declaração de garantia e da publicidade, entretanto, veiculada ou exibida no momento da celebração do contrato.
A Lei-Quadro de Defesa do Consumidor prescreve, no n.º 5 do seu artigo 7.º , que
“As informações concretas e objectivas contidas nas mensagens publicitárias de determinado bem, serviço ou direito consideram-se integradas no conteúdo dos contratos que se venham a celebrar após a sua emissão, tendo-se por não escritas as cláusulas contratuais em contrário.”
Se, por exemplo, uma dada marca de automóveis se fizer eco de uma garantia de 7 anos nos escaparates de cidades e vilas, sem outras quaisquer alusões, mormente restrições, sejam de que natureza for, não poderá, com sucesso, opor aos consumidores as limitações ou exclusões que se propuser ou houver proposto inserir nos contratos. Porque tal tem de ser considerado como não escrito.
Tão elementar quanto isso.
No entanto, nem sempre se tem a consciência de que tal é vedado.
Há muito quem entenda que as divergências entre o constante da publicidade e o clausulado do contrato se sanam pela prevalência conferida ao conteúdo do contrato. E é exactamente a solução oposta que se premeia.
Em caso de dissonância entre a garantia ofertada na publicidade e a constante do contrato, é a que a publicidade veicula que vale, é a do contrato que se risca.
Curiosamente, no seio da Comissão Europeia, já se propendeu a aceitar que na disputa entre tais interesses, prevaleceria o constante do contrato que não o propalado na publicidade, o que constituiria uma traição sem par aos consumidores, atraídos por uma publicidade falaciosa e que jamais se imporia em concretas situações de facto.
Se os termos e condições da garantia comercial, em geral, não coincidirem, beneficiará o consumidor dos mais favoráveis, excepto se em momento precedente ao da celebração do contrato a publicidade for corrigida de forma idêntica ou comparável à original e com a ampla difusão conferida à originalmente veiculada.
Nos casos em que construtor ou promotor oferecer ao consumidor garantia comercial com a extensão de um determinado período tempo, para além dos limites da garantia legal conformemente observada, será directamente responsável perante o consumidor pela reparação ou substituição da coisa no decurso de vigência da garantia.
A declaração de garantia comercial deve ser reduzida a escrito ou constar de qualquer outro suporte duradouro e será presente ao consumidor até ao momento da entrega da coisa.
Tal declaração de garantia comercial deve ser redigida em língua portuguesa, de modo claro e inteligível.
Nela figurarão as menções que segue:
 O nome e o endereço do garante;
 A declaração clara de que o consumidor não perde pela garantia comercial os direitos à reposição da conformidade, à redução do preço ou à extinção do contrato, que da garantia legal constam e se perpetuarão na garantia comercial;
 Informação clara e expressa acerca do objecto da garantia comercial, designadamente sobre se ao consumidor incumbe ou não o ónus da prova durante o período de garantia legal em que tal não vigore, de harmonia com o que decorre do diploma legal em apreciação e durante o eventual período de extensão contratado;
 O procedimento a seguir pelo consumidor para o exercício da garantia comercial;
 A designação das coisas às quais a garantia comercial se aplica; e
 Os termos da garantia comercial.
Os direitos constantes da garantia deferem-se ao transmissário da coisa.
O incumprimento de quanto neste passo se prescreve não exime o garante dos termos da garantia a que se adscreve.
E constitui ilícito de mera ordenação social passível de coima (sanção em dinheiro) e de sanções acessórias.
Algo que importa de todo separar – e parece ocorrer com cada vez maior frequência – é o logro que consiste em o fornecedor impingir um contrato de seguro ao consumidor, como se fora uma garantia suplementar, agenciar o seguro como se fora mediador ou agente de seguros, e, em caso de desconformidade no período recoberto pela “garantia estendida”, lavar as mãos como Pilatos, afirmando simplesmente que é de fora aparte e que é à seguradora que incumbe desobrigar-se das responsabilidades emergentes do risco, da álea do contrato.
Trata-se obviamente de uma prática negocial enganosa, como tal prevista na Lei das Práticas Comerciais Desleais, e passível das sanções nela cominadas.
Com efeito, a lei considera que
“é enganosa a prática comercial que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos elementos a seguir enumerados e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que de outro modo não teria tomado:
 A existência ou a natureza do bem ou serviço;
 As características principais do bem ou serviço, tais como a sua disponibilidade, as suas vantagens, os riscos que apresenta, a sua execução, a sua composição, os seus acessórios, a prestação de assistência pós-venda e o tratamento das reclamações, o modo e a data de fabrico ou de fornecimento, a entrega, a adequação ao fim a que se destina e as garantias de conformidade, as utilizações, a quantidade, as especificações, a origem geográfica ou comercial ou os resultados que podem ser esperados da sua utilização, ou os resultados e as características substanciais dos testes ou controlos efectuados ao bem ou serviço;
 O conteúdo e a extensão dos compromissos assumidos pelo profissional, a motivação da prática comercial e a natureza do processo de venda, bem como a utilização de qualquer afirmação ou símbolo indicativos de que o profissional, o bem ou o serviço beneficiam, directa ou indirectamente, de patrocínio ou de apoio;
 O preço, a forma de cálculo do preço ou a existência de uma vantagem específica relativamente ao preço;
 A necessidade de prestação de um serviço, de uma peça, da substituição ou da reparação do bem;
 A natureza, os atributos e os direitos do profissional ou do seu agente, como a sua identidade e o seu património, as suas qualificações, o preenchimento dos requisitos de acesso ao exercício da actividade, o seu estatuto, ou as suas relações, e os seus direitos de propriedade industrial, comercial ou intelectual, ou os prémios e distinções que tenha recebido;
 Os direitos do consumidor, em particular os direitos de substituição, de reparação, de redução do preço ou de resolução do contrato nos termos do disposto no regime aplicável à conformidade dos bens de consumo, e os riscos a que o consumidor pode estar sujeito.
Por conseguinte, há que separar, nestes casos, “o trigo do joio”, como se diz por cá ou, de harmonia com o dito popular que aí vingou, “ o joio do trigo”…
 
Mário FROTA
 
apDC – DIREITO DO CONSUMO - Coimbra

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