A garantia dos bens
Dos bens móveis duradouros
Vale mais que três vinténs
Isto sem quaisquer desdouros
E por cada intervenção
Há um acréscimo legal
Seis meses de extensão
Para avolumar o ‘caudal’…
“Havia a convicção de que por
cada reparação, autêntica prestação de serviço, no concreto ponto de que se
tratava (caixa, embraiagem, motor…), acrescia uma garantia de dois anos, no
quadro da Lei Antiga. E, por conseguinte, quer se tratasse de bem ainda dentro
da garantia, quer já fora dela, tal deveria ocorrer invariavelmente,
circunscrito, porém, ao órgão objecto de intervenção..
Havia, no entanto, quem
discordasse, afirmando que a reparação, cabendo dentro da garantia, seria
naturalmente absorvida, outros diriam consumida, pela garantia ainda em vigor.
De tal maneira que nada
haveria a acrescentar à garantia
original.
No entanto, a lei mudou.
Pergunta-se como é que a Lei Nova
trata este assunto? A garantia consome as reparações, abre-se uma garantia nova
por cada uma das reparações? A garantia restringir-se-á ao elemento objecto de
intervenção, exigindo-se que o fornecedor revele a parte tocada do aparelho, se
for o caso?”
Apreciada a questão
- e reportando-nos tão somente ao que decorre da Lei Nova (DL 84/2021, de 18 de
Outubro), que entrou em vigor a 1 de Janeiro do ano em curso -, cumpre dizer o
que se nos oferece:
1.
A garantia legal, em decorrência da
Lei Nova, e por opção do legislador português, na esteira do que o Real Decreto
espanhol de 07 de Abril de 2021 previra, é, hoje, de três (3) anos.
2.
Nem todos os ordenamentos jurídicos
dos Estados-membros da U.E. foram “tão longe”: a França, por exemplo, mantém os
dois (2)
anos de antanho.
3.
Porém, os três (3) anos ora definidos poderão ser um logro, importa dizê-lo
de passagem, porque a presunção de não conformidade
da coisa com o contrato só tem a
validade de dois anos: o que quer
significar que se a não conformidade se manifestar só depois de esgotados
os dois primeiros anos, é ao consumidor que incumbe fazer a prova de
que tal [a desconformidade] já existia no momento da entrega do bem: prova dificílima
e perícia decerto excessivamente onerosa, na generalidade dos casos.
4.
O que a Lei Nova estabelece, em geral, no que tange ao remédio da “reparação” e é oportuno recordar neste
passo, é o que segue:
4.1.O consumidor
deve facultar os bens, a expensas do fornecedor, para efeitos de reparação
4.2.A reparação
concretizar-se-á:
4.2.1.
A título gratuito [frete do transporte,
mão-de-obra e material (peças, sobressalentes, acessórios)];
4.2.2.
Num prazo razoável [não deve exceder
os 30 dias…] a contar do momento em que o fornecedor seja notificado da não
conformidade;
4.2.3.
Sem grave inconveniente para o consumidor, tendo em conta a natureza dos bens e
o fim a que os destina.
4.3. O prazo para a reparação só excederá
os 30 dias nas situações em que a natureza e complexidade dos bens, a
gravidade da não conformidade e o esforço necessário para a conclusão da
reparação justificarem prazo superior.
4.4. O
prazo de garantia suspende-se do
momento da comunicação da não conformidade à sua reposição, o que quer
significar que tal lapso de tempo acresce também à garantia inicial.
4.5.
Em caso de reparação, o bem reparado beneficia de um prazo de garantia adicional de seis meses por cada uma das reparações
até ao limite de quatro intervenções, competindo ao fornecedor [ou ao
produtor se o consumidor se lhe dirigir directamente, nos termos da lei],
aquando da entrega do bem reparado, transmitir ao consumidor uma tal informação,
em suporte adequado.
5. Se a reparação
exigir a remoção do bem instalado de forma compatível com a sua natureza
e finalidade, a obrigação do fornecedor [ou do produtor] abrange a
remoção do bem não conforme e a instalação de bem reparado, a expensas
suas.
6. Por conseguinte,
se um bem for objecto de reparação, por cada uma das intervenções, limitadas a quatro, acrescerá a garantia
legal de seis meses, o que globalmente pode levar a que a garantia dos
bens móveis duradouros se situe nos cinco (5) anos.
EM
CONCLUSÃO
a.
Os bens móveis corpóreos ou com a incorporação de conteúdos e serviços
digitais [novos, recondicionados e usados] gozam desde 1 de Janeiro de 2022 de
uma garantia legal de três anos.
b.
Os bens usados podem, porém, por
acordo, ver reduzida a garantia até
aos 18 meses.
c.
O prazo de garantia suspende-se
durante o processo de reposição da conformidade, desde o momento da comunicação
ao da recolocação do bem à disposição do consumidor.
d.
Por cada uma das reparações, nos bens móveis, acresce ainda um
adicional de seis meses de garantia.
e.
A garantia adicional está limitada a quatro (4) intervenções, o
que pode permitir que nos móveis se eleve, no limite, a 5 (cinco) anos, para
além do que resultar dos períodos de suspensão.
Mário Frota
apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal