A ACÇÃO COLECTIVA
EUROPEIA
EM VIAS DE REFORMULAÇÃO
Mário Frota
Ancién Professeur à la Faculté de Droit
de l’ Université de Paris D’ Est
Fundador e primeiro presidente da AIDC /
IACL – Associação Internacional de
Direito do Consumo
Fundador e presidente emérito da
apDC – Direito do Consumo – Portugal
Fundador e presidente da Instituto
Luso-Brasileiro de Direito do Consumo
TÍTULO
I
DA ACÇÃO COLECTIVA
EUROPEIA EM GERAL
I
PRELIMINARES
A
Directiva (EU) n.º 2020/1828, de 25 de
Novembro, do Parlamento Europeu e do
Conselho, estabelece os novos alicerces
e os elementos construtivos não
estruturais da Acção Colectiva
Europeia.
Entende-se, com efeito, que o modelo das
acções inibitórias, que a Directiva
2009/22/CE, de 23 de Abril, introduzira
no Espaço Económico Europeu , não se
adequa ao perfil da conflitualidade
emergente de uma sociedade dominada por
processos muito próximos, em plena Era
Digital, nas sete partidas do Globo.
Os
moldes processuais conferidos pela
moldura da acção colectiva, tanto para
medidas inibitórias [i. é, susceptíveis
de, em termos provisórios quanto
definitivos, fazer cessar ou, se for
caso disso, proibir eventual prática,
quando tal se considere uma afronta ao
acervo normativo da União, tal como
conformado no anexo ao presente
trabalho] como reparatórias [i. é, que
facultem bases de ressarcimento, a
saber, indemnização, reparação,
substituição, redução do preço,
resolução do contrato ou reembolso do
valor pago, conforme adequado e segundo
o previsto tanto no direito da União
como nos ordenamentos jurídicos internos
dos Estados membros] variam no Espaço
Económico Europeu e proporcionam
diferentes níveis de tutela aos
consumidores.
Ademais, importa não ignorar que
Estados-membros há que ainda não dispõem
de meios processuais adequados para as
acções colectivas com finalidades
reparatórias.
Ora,
a decorrente situação mina a confiança
dos consumidores e das empresas no
Mercado Interno [ou seja, o espaço
delimitado pelas fronteiras exteriores
dos Estados-membros] e a sua capacidade
de nele operarem; distorce a
concorrência e constitui sério óbice à
concretização de uma efectiva política e
do subjacente direito da União no
domínio da tutela do direito dos
consumidores, tanto no plano individual
como no dimensão de massa.
Uma
tal acção colectiva tem de constituir
forçosamente um modo eficaz e eficiente
de proteger os interesses colectivos dos
consumidores quer se trate de interesses
individuais homogéneos, como colectivos
stricto sensu, como ainda
difusos.
A
categoria dos interesses
individuais homogéneos entrou na
Europa, na esteira dos processualistas
brasileiros, com realce para a sempre
lembrada Ada Pellegrini Grinover, pela
mão dos portugueses.
Fomos nós, com efeito, quem forçou a mão
ao legislador, passe a aparente quebra
de humildade, ao inserir no artigo 20,
na versão original da Lei-Quadro de
Defesa do Consumidor, em 1996, a figura,
no quadro da legitimatio ad causam
outorgada ao Ministério Público em
termos singulares:
“Incumbe também ao Ministério Público
a defesa dos consumidores no âmbito da
presente lei e no quadro das respectivas
competências, intervindo em acções
administrativas e cíveis
tendentes à tutela dos interesses
individuais homogéneos, bem como
de interesses colectivos
ou difusos dos
consumidores.”
E
nem sequer se distingue – no que aos
individuais homogéneos se refere - entre
interesses ou direitos disponíveis
e indisponíveis.
Entende a União Europeia, pelo seu órgão
legiferante prevalente, que “importa
assegurar o necessário equilíbrio entre
a melhoria do acesso dos consumidores à
justiça e a salvaguarda adequada da
situação dos fornecedores, a fim de
evitar a litigância de má-fé que
prejudique injustificadamente a
capacidade das empresas de operarem no
Mercado Interno”, riscos obviamente de
acautelar de molde a prevenir o [e a
obstar ao] recurso abusivo às acções
colectivas, a concessão de indemnizações
punitivas deverá ser evitada e deverão
ser estabelecidas regras para
determinados aspectos processuais,
nomeadamente a designação e o
financiamento das ‘entidades
qualificadas’.”
A
Directiva que ora se passa em revista
não alude a entidades legitimadas, antes
as cognomina como “qualificadas” para
proporem as acções colectivas e os
procedimentos administrativos versados
neste passo.
E
entende que deverá “permitir que as
entidades qualificadas actuem com o
propósito de garantir que os
fornecedores cumpram as disposições
aplicáveis do direito da União e ajudem
a superar os obstáculos que os
consumidores enfrentam no âmbito de
acções individuais, nomeadamente os que
se prendem com a incerteza sobre os seus
direitos e sobre quais os meios
processuais disponíveis, a relutância
psicológica em avançar com um processo e
o saldo negativo entre os custos
esperados relativamente aos benefícios
das acções individuais.”
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