(habitual
às sextas-feiras no diário ‘As Beiras’, de Coimbra, mas hoje, 21 de Abril, por
razões que se ignoram, não veio publicado)
Redondo
de Vitelão ou Redonda Especulação?
E
se acaso o vitelão
Tem
o preço armadilhado
É
CRIME de especulação…
Nem
lembrava ao “Zé do Telhado”!
“A TVI fez-se eco no
noticiário das 20, domingo último:
Uma promoção - Bife do Redondo de Vitela e Vitelão (de
11,49 € a 9,99 €).
A cliente comprou 534
gr. de carne.
O talão saiu sem descontos.
Instado o talhante, pronta resposta: o desconto é-o em caixa, no acto de pagamento.
Ao pagar, a
consumidora não se deu conta, mas verificou mais tarde, que em vez dos 534 gr.
a “caixa” registara 615 gr. o que, contas feitas, corresponderia a pagar a
carne, não a 9,99€, preço marcado para a ‘promoção’, mas a 11,49 €, preço
normal, ‘fora de promoção’.
E o busílis é que a
fraude reside no programa: não há, como se
defendeu o Pingo Doce, um qualquer
erro informático, O programa faz a conversão do peso (para mais) para o
equivalente ao preço da ‘promoção’, o que confere, no final, com o preço normal
sem desconto.
Artificioso o
programa, fraudulento o processo, prejuízo para o consumidor.
O PD desvaloriza o facto: o consumidor,
ao detectar o “erro”, deve denunciá-lo logo para “correcção”; só que
presumivelmente o programa não se altera e os consumidores que o não detectarem
continuarão a ser ludibriados…”
Cumpre apreciar:
1.
Louvor à TVI que, sendo alimentada
também pela nutrida publicidade do Pingo
Doce, mostrou total independência ao denunciar a fraude, numa peça
jornalística bem conseguida.
2.
Afigura-se-nos que, no caso, se está
perante um crime de falsidade
informática, previsto e punido pelo artigo 3.º da Lei do Cibercrime (Lei 109/2009, de 15 de Setembro):
1
- Quem, com intenção de provocar engano nas relações jurídicas, introduzir,
modificar, apagar ou suprimir dados informáticos ou por qualquer outra forma
interferir num tratamento informático de dados, produzindo dados ou documentos
não genuínos, com a intenção de que estes sejam considerados ou utilizados para
finalidades juridicamente relevantes como se o fossem, é punido com pena de
prisão até 5 anos ou multa de 120 a 600 dias.
2
- Quando as acções descritas no número anterior incidirem sobre os dados registados,
incorporados ou respeitantes a qualquer dispositivo que permita o acesso a
sistema de comunicações ou a serviço de acesso condicionado, a pena é de 1 a 5
anos de prisão.
3 - Quem, actuando com intenção de causar
prejuízo a outrem ou de obter um benefício ilegítimo, para si ou para terceiro,
usar documento produzido a partir de dados informáticos … , é punido com as
penas previstas num e noutro número, respectivamente.
…”
3.
Para além do mais, subsiste ainda um crime de especulação previsto e punido
pela Lei Penal do Consumo (DL 28/84, de 20 de Janeiro), cujo artigo 35
prescreve, no seu n.º 1:
“Será
punido com prisão de 6 meses a 3 anos e multa não inferior a 100 dias quem:
…
b)
Alterar, sob qualquer pretexto ou por qualquer meio e com intenção de obter
lucro ilegítimo, os preços que do regular exercício da actividade resultariam
para os bens ou serviços ou, independentemente daquela intenção, os que
resultariam da regulamentação legal em vigor;
c)
Vender bens ou prestar serviços por preço superior ao que conste de etiquetas,
rótulos, letreiros ou listas elaborados pela própria entidade vendedora ou
prestadora do serviço;
d)
Vender bens que, por unidade, devem ter certo peso ou medida, quando os mesmos
sejam inferiores a esse peso ou medida, ou contidos em embalagens ou
recipientes cujas quantidades forem inferiores às nestes mencionadas.
…”
4.
A denúncia deve ser efectuada no
Livro de Reclamações, disponível no próprio estabelecimento, ou, se for o caso,
chamar de imediato a autoridade com competência para o efeito – a ASAE – ou a
força de segurança estacionada no lugar do estabelecimento.
EM CONCLUSÃO
a. Quem
desvirtue registos de caixa para se locupletar injustamente, em sistema
informático, comete crime que, em princípio, é passível de prisão até 5 anos ou multa de 120 a 600 dias ou de prisão de 1 a 5 anos, consoante os
casos (Lei 109/91: art.º 3.º)
b. Há
um cúmulo de crimes porque a especulação
daí resultante também tem de ser considerada: pena de prisão de seis meses a
três anos e multa não inferior a 100 dias (DL 28/84: n.º 1 do art.º 35).
Mário
Frota
presidente emérito da apDC – Direito do Consumo - Portugal