sexta-feira, 26 de abril de 2024

ENTREVISTA CONCEDIDA POR MÁRIO FROTA AO ‘NOTÍCIAS AO MINUTO’


Como é que a Denária Portugal vê a rejeição do pagamento em dinheiro por parte de algumas empresas em Portugal?

 Em particular, como uma agressão

 §  à soberania nacional (conquanto a moeda com curso legal releve da Zona Euro, em que há como que uma soberania partilhada e, nessa medida, há declaradamente um ofensa a esse valor simbólico)

 §  a um serviço público essencial dada a universalidade da moeda e a sua inserção no lastro de aspectos inalienáveis da vida corrente de cada um e de todos (de par com os mais serviços do estilo)

 §  e a direitos fundamentais do cidadão-consumidor (no espectro de direitos como os da protecção dos seus interesses económicos, do de escolha, do da segurança e da não discriminação, com assento na Constituição da República e na Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia).

 - O que é que a associação defende perante estas situações? Como devem os consumidores agir?

. Que se dê notícia de tais situações no Canal Denúncia no Portal DENÁRIA.PT, a fim de que a instituição as possa carrear ao Banco de Portugal e ou

. Se lavre o correspondente protesto no Livro de Reclamações, disponível em cada um dos estabelecimento em suporte papel ou através do formato electrónico, ao alcance dos consumidores em geral

. De qualquer sorte, importante é que os consumidores ajam, no estrito cumprimento dos seus direitos e  jamais aceitem de modo passivo e complacente os desvios à legalidade que a recusa do numerário em si encerra.

. Por último, que o Banco Central use dos seus poderes para infligir as sanções ao seu alcance no actual quadro, conquanto

. a DENÁRIA PORTUGAL se proponha envidar esforços para que às violações correspondam medidas proporcionadas, adequadas e dissuasivas para que as situações de afronta ao ordenamento jurídico não caiam na impunidade como estímulo a novas agressões.

. No entanto, e em paralelo, o desencadeamento de acções pedagógicas tendentes à aceitação do dinheiro físico sem reacções drásticas e adversas nem sempre conducentes a resultados benéficos, em termos de equilíbrio interventivo.

 
- Considera que a trajetória crescente dos pagamentos digitais pode ser mesmo uma ameaça para o dinheiro físico?

. O dinheiro físico de 2022 a 2023 perdeu face aos mais sistemas de pagamento cerca de 18%: situava-se nos 70%, apresentando-se, de momento, nos 52%

. Países houve, como é o caso da Suécia, em que o dinheiro físico em circulação orça menos de 10%: e a situação é embaraçosa, a todos os títulos, já que em caso de disrupção dos sistemas virtuais, os cidadãos experimentarão acentuadas dificuldades até no acesso aos bens essenciais porque escassearão as notas e moedas para a compra do trivial… do “pão nosso de cada dia”!

. Daí que importe estar desperto para o processo em curso, salvaguardando a circulação das notas em papel e das moedas metálicas para que não haja nem rupturas nem discriminação no acesso aos meios de pagamento em particular para os cidadãos de menores recursos, que não são desafortunadamente uma franja residual….


- A Denária Portugal considera que o pagamento em dinheiro é mais inclusivo. Que acções irá desenvolver para consciencializar os consumidores e as empresas para este facto? Como?

. A inclusão financeira pressupõe a  diversidade de opções de meios de pagamento para que aos consumidores se não vede o acesso, segundo necessidades e conveniências, a distintos meios, mormente no que se refere à legião dos que se amalgamam entre os limiares da miséria e da pobreza, aos consumidores mais vulneráveis;

. Garantia da Universalidade do acesso ao dinheiro, às notas em papel e às moedas metálicas, através de distintos meios no seio do mercado e do Regulador – o BdP;

. Garantia de acesso em cada uma das freguesias a ATM’s (a pontos de dinheiro que tornem fácil o acesso ao papel-moeda) em concertação com as autarquias;

. Acções de formação e sensibilização no seio dos lares de terceira idade e das instituições de solidariedade social;

. Análogas acções em Universidades Seniores esparsas pelo País;

. Celebração de convénios de cooperação com as associações de interesse económico que relevem do comércio local para a consecução de tais objectivos;

. Afixação nos estabelecimentos comerciais de autocolantes com referência a que neles se aceita o dinheiro com curso legal sem outras restrições que não sejam as legais;

. Acções junto do tecido empresarial para dissuadir os estabelecimentos a não recusar o dinheiro físico, enquanto instrumentos pedagógicos preferíveis a actuações repressivas a cargo das entidades oficiais.


- Considera que o Banco de Portugal deveria ter um papel mais interventivo nesta matéria?

. As situações que ora vêm ocorrendo não são ainda alarmantes, podendo, porém, se houver uma qualquer inércia,  tornar-se em algo de irreversível;

. Como Regulador dos sistemas de pagamento, crê-se que o Banco de Portugal está desperto para o fenómeno, importando, no entanto, aperfeiçoar o regime em vigor para que as normas sejam assistidas da necessária coerção, de sanções ajustadas e dissuasivas de que o ordenamento jurídico ora não dispõe: esse papel cabe ao legislador, ao Parlamento;

. Mas será indispensável que ante a tendência para a absolutização do digital o BdP se muna dos contrapesos necessários para que os equilíbrios se restabeleçam e a carta de direitos dos cidadãos-consumidores não seja literalmente rasgada.

. O teor da intervenção de um alto responsável do Banco de Portugal, o Eng.º Pedro Soares Marques, na cerimónia de lançamento da Denária, em Fevereiro último, é sinal da crença de que o BdP cumprirá as suas obrigações neste particular.


- Como é que vê a criação do Euro Digital? Considera que tem vantagens? E desvantagens? Se sim, quais?

Conquanto o processo se ache ainda em fase de “experimentação”, sem tradução numa qualquer lei europeia, não se descortinam nem todas as vantagens nem o ror de desvantagens que a introdução do euro digital possa acarretar.

 Não se ignore: o euro digital não substituirá o euro físico, a moeda com curso legal.

 Nos instrumentos em perspectiva surge como mero complemento do euro físico. De modo expresso: mero complemento. Ponto é que não haja, depois, quaisquer subversões ao modelo.

 Será a única solução de pagamento digital em euros com aceitação universal em toda a área do euro.

 Será um meio de pagamento digital com as vantagens do numerário, permitindo realizar pagamentos em “moeda de banco central” quando o numerário não for opção (por exemplo, no comércio electrónico e nos pagamentos remotos ‘pessoa’ a ‘pessoa’), com elevado nível de privacidade, utilização gratuita para serviços básicos e disponibilidade offline.

 No que tange às desvantagens, assinalem-se a:

 ·         Dependência da tecnologia: se ocorrerem quaisquer quebras ou interrupções  no sistema, a disrupção prejudicará os consumidores, deixá-los-á à míngua de recursos para as necessidades correntes.

 ·         Exclusão financeira com forte pendor discriminatório: os cidadãos, em particular os que hipótese nenhuma de acesso têm a dispositivos móveis ou a serviços bancários, ficarão de todo excluídos do uso do euro digital.

 Eis, pois, o que se nos oferece dizer.

 

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