sexta-feira, 1 de outubro de 2021

Consultório do CONSUMIDOR

 


“A imprensa noticiou que a garantia dos "iphones", "smartphones" e aparelhos similares passaria de dois anos para cinco anos, de harmonia com uma lei que estaria em preparação. Há inúmeros equívocos a esse respeito, daí que houvesse todo o interesse em esclarecer convenientemente cada um e todos. Aliás, isso até teve eco numa televisão. Mas os esclarecimentos não são nem bastantes nem convenientes. O que se lhe oferece dizer a tal propósito?”

Há, com efeito, inúmeros equívocos no ar…

1. A “obsolescência prematura” é, na sua essência, a pré-determinação do ciclo de vida de um produto. Como se, ao nascer, se inscrevesse, na sua matriz, a concreta data do seu passamento, da sua morte. Como se o produto, no momento do seu lançamento no mercado, se fizesse acompanhar já de uma certidão com a data do óbito…”

2. A União Europeia de há muito que aposta na longevidade dos produtos, numa concertação adequada e em ajustado equilíbrio entre a inovação e o desenvolvimento tecnológicos e a garantia, a um tempo, de uma mais longa vida dos bens de consumo cuja desenho e produção visa incrementar.

3. Já a 4 de Julho de 2017 (com significativo reforço a 25 de Novembro de 2020), o Parlamento Europeu – o órgão legiferante por excelência da União Europeia -, por Resolução própria, elegeu um sem-número de objectivos, a saber:

3.1. Concepção de produtos sólidos, duradouros e de qualidade

3.2. Promoção da possibilidade de reparação e projecção da durabilidade

3.3. Aplicação de um modelo económico vocacionado para a utilização com suporte às PME e o incentivo ao emprego no Espaço Económico Europeu

3.4. Garantia de uma melhor informação dos consumidores

3.5. Adopção de medidas atinentes à obsolescência programada

3.6. Reforço do direito à garantia legal de conformidade

3.7. Protecção dos consumidores face à obsolescência de programas informáticos.

4. A Directiva Europeia de 20 de Maio de 2019, que se acha para transposição, estabelece o mínimo de 2 anos de garantia para as coisas móveis duradouras: não estabelece, porém, qualquer tecto.

5. Nos projectos de lei (PL) pendentes no Parlamento, há um - com data de 04 de Novembro de 2019 – da autoria do PCP (e o do PEV vai no mesmo sentido), que prescreve:

“As garantias dadas pelos fabricantes de grandes e pequenos electrodomésticos, viaturas e dispositivos electrónicos têm a duração mínima de dez anos. “

6. O Bloco de Esquerda, no seu PL, pretende que a garantia seja, para os móveis, de 5 anos.

7. O diploma que está para promulgação do Presidente da República confere, na esteira dos espanhóis (Real Decreto de 7 de Abril de 2021), uma garantia de 3 anos para as coisas móveis duradouras, diploma que entrará em vigor a 1 de Janeiro de 2022.

8. Por conseguinte, a previsão do diploma legal que, uma vez promulgado e referendado, se publicará, é a de que a garantia das coisas móveis seja de três anos e bem assim a dos recondicionados e das coisas usadas: no que toca, porém, às coisas usadas pode a garantia baixar, por acordo entre fornecedor e consumidor, mas nunca aquém dos 18 meses.

9. Por recondicionados se entende, de harmonia com a lei, os “bens objecto de utilização prévia ou de devolução e que, após inspecção, preparação, verificação e testagem por técnico qualificado, são novamente colocados, como tal, para venda no mercado”.

EM CONCLUSÃO

a. Não está na forja lei que garanta "iphones", "smartphones" e "andróides" por 5 anos.

b. O diploma legal que está para promulgação confere às coisas móveis novas, recondicionadas e usadas a garantia, não de 2, que é a actual, mas de 3 anos.

c. As coisas usadas, porém, podem, por acordo, ver reduzida a garantia, nunca aquém dos 18 meses (de 3 anos até 18 meses).

Eis o que se nos oferece dizer.

 

Mário Frota 

 apDC – DIREITO DO CONSUMO - Coimbra

 
 
(que deveria ter vindo a lume, hoje, 1.º de Outubro, no
DIÁRIO “As Beiras”, mas por razões que nos escapam não foi publicado)
(elaborado para a edição de 01 de Outubro de 2021)

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