A Economia Colaborativa corresponde, de harmonia com a noção desenhada pela União Europeia, a modelos empresariais no âmbito dos quais as actividades se decorrem através de plataformas colaborativas que criam um mercado aberto em que se oferece de modo temporário bens ou serviços, quiçá prestados, quantas vezes, por particulares.
Três as categorias de intervenientes se divisam na economia colaborativa:
(i) os prestadores de serviços que partilham os activos, os recursos, a disponibilidade e/ou as competências — podem ser particulares que oferecem serviços numa base esporádica («pares») ou prestadores de serviços que atuam no exercício da sua actividade profissional («prestadores de serviços profissionais»);
(ii) os utilizadores desses serviços; e
(iii) os intermediários que — através de uma plataforma em linha — conectam prestadores de serviços e utilizadores, facilitando as transacções recíprocas («plataformas colaborativas»).
Por via da regra, as transacções de economia colaborativa não implicam uma transferência de propriedade, podendo ser realizadas tanto com fins lucrativos como sem fins lucrativos.
2. Questões-chave suscitadas neste particular
2.1. Requisitos de acesso ao mercado
Além de criarem novos mercados e de permitirem a expansão dos mercados existentes, as empresas do sector da economia colaborativa acedem a mercados onde até aqui operavam prestadores de serviços tradicionais.
Questão fundamental, tanto para as autoridades como para os operadores de mercado, consiste em saber se, e em que medida, ao abrigo da legislação da UE em vigor, as plataformas colaborativas e os prestadores de serviços podem estar sujeitos a requisitos de acesso ao mercado.
Tais requisitos podem incluir autorizações para o exercício de actividades empresariais, obrigatoriedade de licenciamento, requisitos normativos mínimos de qualidade (relativos, por exemplo, à dimensão das instalações ou ao tipo de veículos, a obrigações de seguro ou depósito, etc.).
Por força da legislação da UE, esses requisitos devem ser justificados e proporcionados, tendo em conta as especificidades do modelo empresarial e dos serviços inovadores em causa, sem privilegiar um modelo económico em detrimento de outro.
Perfilam-se neste quadro considerações em torno de
2.1.1. Prestação de serviços profissionais
2.1.2. Prestação de serviços entre pares
2.1.3. Plataformas colaborativas
E ainda considerações outras em redor de
§ Preço: a plataforma colaborativa fixa o preço final a pagar pelo utilizador, enquanto beneficiário do serviço subjacente. Se a plataforma colaborativa apenas recomenda um preço ou se o prestador de serviços subjacentes é livre de adaptar o preço fixado por uma plataforma colaborativa - tal indicia que este critério poderá não ser satisfeito.
§ Outras condições contratuais essenciais: a plataforma colaborativa estabelece os termos e as condições, para além do preço, que determinam a relação contratual entre o prestador de serviços subjacentes e o utilizador (tais como, por exemplo, a definição de instruções obrigatórias para a prestação do serviço, incluindo a obrigação de prestar o serviço).
§ Propriedade dos principais activos: a plataforma colaborativa é proprietária dos principais activos utilizados para fornecer o serviço subjacente.
Se estes três critérios se encontrarem preenchidos, há fortes indícios de que a plataforma colaborativa exerce uma influência significativa sobre o prestador do serviço subjacente ou o seu controlo, do que pode aferir-se que deva ser igualmente considerada como o prestador do serviço subjacente (para além dos serviços da sociedade da informação).
Ao avaliar se os requisitos de acesso ao mercado aplicados à economia colaborativa são necessários, justificados e proporcionados a fim de satisfazer objectivos claros e legítimos de interesse público, os Estados-membros devem ter em conta as características específicas dos modelos empresariais da economia colaborativa.
Para efeitos de regulamentação das actividades em causa, os particulares que oferecem serviços entre pares e a título ocasional através de plataformas colaborativas não devem ser automaticamente considerados como prestadores de serviços profissionais.
A fixação de limiares (eventualmente por sectores específicos) em função dos quais uma actividade económica possa ser considerada como uma actividade não profissional entre pares poderá constituir a abordagem adequada.
A Comissão Europeia recomenda desde sempre que os Estados-membros aproveitem a oportunidade para rever, simplificar e modernizar os requisitos em matéria de acesso ao mercado geralmente aplicáveis aos operadores de mercado.
Tais requisitos devem ter como objectivo aliviar os operadores de encargos regulamentares desnecessários, independentemente do modelo empresarial adoptado, e evitar a fragmentação do mercado único.
2.2. Regimes de responsabilidade
Na sua maioria, as regras relevantes em matéria de responsabilidade contratual e extracontratual consagradas se acham nas legislações nacionais.
Porém, por força da legislação da UE, sob determinadas condições, as plataformas em linha, enquanto prestadores de serviços intermediários da sociedade da informação, encontram-se exoneradas de responsabilidade pelas informações que armazenam. Aspectos que se acham em vias de alteração, ao que se julga, face aos Novos Actos Regulamentares tanto dos Serviços Digitais quanto do Mercado Digital, ora na forja e com significativas modificações em perspectiva.
2.3. Protecção dos utilizadores
§ Frequência dos serviços: os prestadores que oferecem os seus serviços a título meramente ocasional (ou seja, numa base puramente marginal e acessória e não regularmente) são menos susceptíveis de ser considerados como empresariais. Quanto maior for a frequência da prestação de serviços, mais evidente se torna que o prestador pode ser considerado como um profissional, pois esta frequência pode indiciar que o mesmo actua com propósitos relacionados com a sua actividade comercial, industrial, artesanal ou profissional.
§ Fins lucrativos: uma acção realizada com fins lucrativos pode constituir uma indicação de que o prestador pode ser considerado como profissional em relação a uma dada transacção.
Em princípio, os prestadores que visam a troca de activos ou de competências (por exemplo, permutas de habitação ou bancos de horas) não serão considerados profissionais. Os prestadores que obtêm apenas uma compensação de custos em relação a uma dada transacção podem não visar lucros.
Em contrapartida, os que auferem uma remuneração superior à compensação dos custos têm provavelmente fins lucrativos.
§ Volume de negócios: quanto for maior o volume de negócios gerado pela prestação de serviços (a partir de uma ou de várias plataformas colaborativas), mais claro é o indício de que o prestador pode ser considerado profissional. A este respeito, importa avaliar se o volume de negócios do prestador resulta da mesma actividade (por exemplo, transporte partilhado) ou de vários tipos de actividades (transporte partilhado, jardinagem, etc.). No segundo caso, um volume de negócios mais elevado não implica necessariamente que o prestador deva ser considerado profissional, uma vez pode não ter sido gerado pela outra actividade (principal) do prestador.
2.4. Trabalhadores por conta própria e trabalhadores por conta de outrem na economia colaborativa
A questão de saber se existe ou não uma relação de trabalho tem de ser apreciada caso a caso, tendo em conta as circunstâncias de facto que caracterizam a relação entre a plataforma e o prestador de serviços subjacentes e o desempenho das funções em causa, com base, cumulativamente, em três critérios essenciais:
(i) a existência de um laço de subordinação;
(ii) a natureza do trabalho; e
(iii) a existência de uma remuneração.
2.5. Tributação
Adaptação a novos modelos empresariais
Redução do ónus administrativo
A melhor maneira de apoiar o crescimento económico consiste na adopção de medidas com vista a reduzir os encargos administrativos sobre os cidadãos e as empresas sem discriminação entre os modelos empresariais. Para esse efeito, um intercâmbio eficaz de informações fiscais entre plataformas, autoridades e prestadores de serviços pode contribuir para reduzir os encargos. A criação de balcões únicos (one-stop shops) e o desenvolvimento de mecanismos de troca de informação em linha podem também criar novas possibilidades de parcerias e de controlo do cumprimento das obrigações.
2.5.1. Imposto sobre o valor acrescentado
Os bens e os serviços disponibilizados pelas plataformas colaborativas e através delas pelos seus utilizadores são, em princípio, passíveis de IVA.
Podem surgir problemas no que diz respeito à classificação dos intervenientes enquanto sujeitos passivos, em especial no que se refere à avaliação das actividades económicas realizadas, ou à existência de um nexo directo entre os fornecimentos e a remuneração em espécie (por exemplo, no caso de modalidades de tipo «banco» em que os intervenientes contribuem com bens ou serviços para uma reserva comum, em troca do direito a beneficiar dessa reserva).
3. Monitorização
A economia colaborativa expande-se a vários sectores, num contexto de rápida evolução. Tendo em conta este carácter dinâmico e evolutivo, a Comissão tenciona estabelecer um quadro de acompanhamento que contemple a evolução do contexto regulamentar, da situação económica e da realidade empresarial. O objectivo deste exercício será acompanhar a evolução dos preços e da qualidade dos serviços e identificar eventuais entraves e problemas, em especial quando resultam de regulamentações nacionais divergentes ou de lacunas regulamentares.
As ferramentas de acompanhamento deverão incluir:
(i) Inquéritos periódicos aos consumidores e às empresas sobre a utilização da economia colaborativa .
(ii) Levantamento da evolução do quadro regulamentar nos Estados-Membros.
(iii) Diálogo entre as partes interessadas no quadro do Fórum do Mercado Único, com dois fóruns por ano para avaliar o desenvolvimento do sector e identificar boas práticas.
(iv) Os resultados do exercício de acompanhamento da economia colaborativa serão sintetizados no Painel de Avaliação do Mercado Único.
4. CONCLUSÃO
Tendo em conta as vantagens consideráveis que os novos modelos empresariais de economia colaborativa podem aduzir, a Europa deve estar aberta a estas novas oportunidades.
À UE cumpre apoiar a inovação, a competitividade e as oportunidades de crescimento oferecidas pela modernização da economia, de forma proactiva.
É importante assegurar, em simultaneidade, condições de trabalho equitativas e um nível adequado e sustentável de defesa do consumidor e de protecção social.
Para tal, os cidadãos e as empresas devem estar cientes das regras e obrigações que lhes são aplicáveis, tal como enunciado na Comunicação * de que ora se cura.
*(excertos da
Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões
Uma Agenda Europeia para a Economia Colaborativa
{SWD(2016) 184 final}, de 02 de Junho de 2016)