ANTECIPANDO AS SOLUÇÕES DA LEI NOVA
1. PERGUNTA
O
diploma legal que estabelece a nova disciplina da garantia dos bens de consumo,
a saber, das coisas móveis, das imóveis e dos conteúdos e serviços digitais
está para promulgação do Presidente da República.
Vai
haver novidades como num programa ou noutro, num ponto ou noutro, já se
assinalou no DIRETO AO CONSUMO.
A
Lei Nova terá de entrar em vigor no dia 1.º de Janeiro de 2022, tal como manda
a Directiva Europeia.
Ainda
no POLÍGRAFO, da SIC, domingo à noite, se perguntava se era verdadeiro ou falso
o que para aí corria, de que os telemóveis iam passar a ter uma garantia de 5
anos.
E
a SIC concluiu que era falsa a notícia que circulava.
Como
é que a coisa vai funcionar quanto ao PRAZO DE GARANTIA das coisas móveis
duráveis ou duradouras?
Qual
o período de garantia de um computador, de um telemóvel, de uma máquina de
cozinha, a partir da data de entrada em vigor da LEI NOVA?
1. RESPOSTA
O
prazo de garantia das coisas móveis duráveis, que é
ainda de 2 anos, nos termos da lei em vigor, passa a ter uma acréscimo, não tão
substancial quanto se previa, mas de apenas 1 ano, passando, portanto, para 3 anos. Três anos de garantia para as
coisas móveis duradouras.
E
os iphones, os andróides, os smartphones beneficiarão desse acréscimo de
garantia: passarão a ter uma garantia legal de 3 anos, que não de cinco.
A menos que o Parlamento, no uso das suas
atribuições, aprove, entretanto, um prazo mais amplo, coisa que, em nosso entender,
deveria acontecer.
E isto porque a Directiva europeia que obrigou
a esta mudança nas leis dos demais Estados membros e nas de Espanha e Portugal,
por conseguinte, não estabeleça um prazo máximo, mas o prazo mínimo de 2 anos,
que cada um dos Estados-membros poderá ultrapassar, se o entender.
Mas a Espanha não foi audaz. E Portugal
segui-lhe na esteira.
Crê-se que legislação portuguesa terá sido
influenciada pela espanhola, que estabeleceu tal prazo – o prazo de 3 anos - no
seu Real Decreto de 7 de Abril de 2021 (O Decreto Omnibus).
Havia já projectos de lei dos partidos com
assento no Parlamento a prever 5, 10 anos para as coisas móveis. Mas nada disso
terá sido considerado. Quando isso deveria ter sido tomado em conta dado o
programa que há que desencadear contra a “obsolescência programada”
2. PERGUNTA
O
que é isso da obsolescência programada, de que nem toda a gente ouviu falar.
2. RESPOSTA
“Obsolescência”, segundo os dicionários, é a qualidade de obsolescente ou obsoleto; qualidade do que está a cair em
desuso, a tornar-se antiquado.”
Do latim obsolescentĭa, particípio presente neutro plural substantivado de obsolescĕre, «cair em desuso».
Como a outro
propósito o significámos já, “a
obsolescência prematura é, na
sua essência, a pré-determinação do
ciclo de vida de um produto. Como se, ao nascer, se inscrevesse, na sua
matriz, a concreta data do seu passamento,
da sua morte. Como se o produto, no momento do seu lançamento no mercado, se fizesse acompanhar já de uma certidão com a data do óbito…”
Ao encetar-se
eventual plano, projecto ou programa tendente a
barrar a obsolescência, o objectivo
que aí se condensa é o de prolongar a
vida dos produtos de molde a reduzir o inestancável volume de resíduos,
protegendo do mesmo passo a bolsa do consumidor e, em geral, a economia.
A União Europeia de há muito que aposta na longevidade dos produtos,
numa concertação adequada e em ajustado equilíbrio entre a inovação e o
desenvolvimento tecnológicos e a
garantia, a um tempo, de uma mais longa vida dos bens de consumo cuja
desenho e produção visa incrementar.
Já a 4 de Julho de 2017, o Parlamento
Europeu – o órgão legiferante por excelência da União Europeia -, por um
consequente instrumento normativo de pendor resolutivo, entendeu eleger um
sem-número de objectivos, destarte enunciados:
a.
Concepção de produtos sólidos, duradouros e de qualidade
b.
Promoção da possibilidade de reparação e projecção da durabilidade
c.
Aplicação de um modelo económico vocacionado para a
utilização com suporte às PME e o incentivo ao emprego no Espaço Económico
Europeu
d.
Garantia de uma melhor informação dos consumidores
e.
Adopção de medidas atinentes à
obsolescência programada
f.
Reforço do direito à garantia legal de conformidade
g.
Protecção dos consumidores
face à obsolescência de programas informáticos.
O Parlamento Europeu, por uma outra Resolução, de 25 de Novembro pretérito,
sob o lema
“Rumo a um Mercado Único mais Sustentável para Empresas e Consumidores”,
confere particular relevo ao “Direito à Reparação dos Produtos”
(intentando uma estratégia fulcral em matéria de REPARAÇÃO de BENS DE CONSUMO).
Emitiu, nesse sentido, um sem-número de
recomendações que visam, com efeito, dar
forma a um MERCADO
INTERIOR SUSTENTÁVEL (delimitado pelas fronteiras exteriores do denominado
Espaço Económico Europeu), como convém e constitui, nos tempos que correm,
imperativo indeclinável de uma qualquer política europeia de consumidores com
reflexos no plano global.
E enumera um amplo leque de medidas que há que
trasladar para a lei e se compendiam como segue:
A outorga de um «direito de
reparação» aos consumidores
A promoção da reparação em vez da substituição
A normalização das peças
sobresselentes susceptível de promover a interoperabilidade e a inovação
O acesso gratuito às
informações necessárias para a reparação e a manutenção
Um cacharolete de
informações que aos produtores incumbe em matéria de disponibilidade de peças
sobresselentes, actualizações de «software» e a faculdade de reparação de um
produto, nomeadamente acerca de:
3. PERGUNTA
Na
Lei Antiga o consumidor não tinha de obedecer a uma hierarquia: primeiro,
repara, depois, se a reparação não for possível ou se for excessivamente cara,
substitui; depois, se for demasiado onerosa ou impossível, a troca; seria dada,
em seguida, ao consumidor o direito de exigir a adequada redução do preço e, só
por último, é que o contrato se rompia, o consumidor poderia pôr termo ao
contrato.
Nada
disso acontece na Lei Antiga. O consumidor, ao que parece, pode optar pelo
remédio que mais lhe convier, com proporcionalidade, com prudência, com
adequação.
Na
Lei Nova há novidades a este propósito ou fica tudo na mesma, como dantes?
3. RESPOSTA
Há inovações na Lei Nova face à Lei Antiga: na
LA não se estabelecia qualquer hierarquia de direitos em caso de
desconformidade dos bens, como muito bem assinalou o Miguel Rodrigues; reconhecia-se
ao consumidor um direito de escolha entre a reparação do bem, a sua
substituição, a redução do preço ou a extinção do contrato. O Consumidor só não
poderia era, na opção que era sua, que lhe pertencia, pelo remédio de que
lançaria mão, abusar do seu direito. Ou seja, como diz o Código Civil, no seu
artigo 334, “
“É
ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os
limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou
económico desse direito.”
A Lei Nova, prevendo embora iguais remédios,
submete-os a diferentes patamares de precedência.
Neste enquadramento, o consumidor tem o direito
«à reposição da conformidade», através da reparação ou da substituição do bem,
à redução do preço e a pôr termo ao contrato (por meio de resolução),
estabelecendo-se as condições e requisitos aplicáveis a cada um dos meios: prioridade
à reparação ou substituição.
4. PERGUNTA
Já
se falou de um direito novo e o Prof. até já escreveu sobre isso, Em que
consiste?
4.
RESPOSTA
É
o chamado direito de rejeição.
É consagrado na LN um novo direito, que
consiste na possibilidade de opção,
pelo consumidor, entre a substituição do
bem ou a extinção do contrato (por
meio de resolução) sem estar sujeito a qualquer condição específica, quando em
causa ocorrer uma desconformidade que se manifeste nos primeiros 30 dias após a
entrega da coisa.
5. PERGUNTA
Por
cada uma das reparações renova-se a garantia? Ou seja, levei um computador a
arranjar, se voltar a apresentar o mesmo “defeito”, a partir da entrega do
computador reparado, passa a haver uma nova garantia de 2 anos para aquela reparação?
5.RESPOSTA
Não. Não é essa a solução da Lei Nova. Porém, por
cada uma das reparações, se tal for o remédio de que o consumidor venha a
lançar mão, a coisa beneficia de um prazo de garantia adicional
de seis meses (até um limite de 4 intervenções, de 4 reparações): o que perfaz
uma garantia de 5 anos para coisas móveis desconformes (por exemplo, um
corta-unhas rombo… com quatro reparações, passa a ter uma garantia de 3 + 2
anos, ou seja, de 5 anos)
6. PERGUNTA
E
se, em vez da reparação, o remédio for o da substituição ou troca? Fica só com
a garantia que falta para completar os 3 anos. Por exemplo, comprei uma
cafeteira eléctrica, avariou-se no fim dos 2 anos. Exijo a substituição. A
marca dá-me uma nova, equivalente àquela que eu comprara. Esta nova cafeteira vai
ter só uma garantia de 1 ano, que é o que falta para completar os três anos?
6.
RESPOSTA
Havendo substituição da coisa, a sucedânea, a coisa que lhe sucede, goza também de um prazo de garantia de três
anos a contar da data da entrega.
De notar que em caso de substituição da coisa,
não pode ser cobrado ao consumidor qualquer custo inerente à normal utilização
da coisa substituída. Ou seja, o período em que o consumidor dispôs da coisa
substituída e dela beneficiou não tem de ser computado em ordem a eventual
compensação ao fornecedor, como tantas vezes se pretende.
7. PERGUNTA
E
quanto a provas? É o consumidor que – quando acciona a garantia – tem de fazer
prova da existência da desconformidade? A desconformidade que se manifeste em
dois anos, a contar da data de entrega da coisa, presume-se existir já no
momento da entrega. Salvo quando tal for incompatível com a natureza dos bens
ou com as características da própria desconformidade.
7.
RESPOSTA
Com efeito, na Lei Nova, havendo-se elevado a
garantia de dois para três anos, o consumidor só goza da presunção de
conformidade da coisa com o contrato nos dois primeiros anos, que não no
remanescente ano de garantia.
O que torna difícil ao consumidor, quantas
vezes, nos casos de vícios internos da coisa, de disfunções, de avarias, a
prova de que a desconformidade revelada após se haver vencido o segundo ano se
fica a dever a facto do produtor, de que a desconformidade é congénita, de que
existia já no momento da entrega. Até pelos custos de uma perícia, tantas vezes
superior ao preço de venda ao público do próprio bem,
8. PERGUNTA
Na
Lei actual, a desconformidade (o vício, a avaria, o defeito, o desacerto da
coisa com o contrato) tem de ser denunciada em sessenta dias depois de
detectada.
Mantém-se
essa exigência na Lei Nova? Isto e, se o consumidor deixar escapar os 60 dias
para denunciar o “defeito”, perde o direito, o direito caduca?
8.
RESPOSTA
Eliminou-se a obrigação que pendia sobre o
consumidor de denunciar a desconformidade dentro de determinado prazo após o
seu conhecimento (2 meses), restabelecendo-se o princípio de inexistência de
obstáculos ao exercício de direitos de que o consumidor dispõe durante o prazo
de garantia dos bens
O prazo para tal exercício, dentro dos três
anos de garantia, é de dois anos, contado da data da denuncia da
desconformidade.
Assim, se o bem for comprado em 1 de Fevereiro
de 2022 e a desconformidade se detectar em 10 de Janeiro de 2023, o consumidor
não terá de denunciar, de comunicar a desconformidade em sessenta dias. Pode
fazê-lo dentro do prazo de garantia que se estende por 3 anos e só se esgota em
31 de Janeiro de 2025.
Os direitos conferidos ao consumidor, porém,
caducam decorridos dois anos da data da comunicação da desconformidade ao fornecedor.
Assim, se o direito não for satisfeito pelo fornecedor, depois de denunciada a
desconformidade, dentro dos 3 anos da garantia, o consumidor tem, depois da
comunicação, dois anos para exercer o direito, instaurando a acção junto dos
tribunais competentes, tribunal judicial ou tribunal arbitral.
9. PERGUNTA
E
o prazo é suspenso em certas circunstâncias ou não?
9.
RESPOSTA
O prazo suspende-se, com efeito, em dadas
situações, a saber:
§ Desde
a colocação da coisa à disposição do fornecedor
com vista à realização das operações de reparação ou substituição até à
sua devolução ao consumidor;
§ Durante
o período em que durar a tentativa de resolução extrajudicial do conflito de
consumo mediante conciliação ou mediação.
10.
PERGUNTA
Terei
de pagar alguma coisa para exigir a garantia legal dentro dos 3 anos
estabelecidos para o efeito?
10.
RESPOSTA
Não! O exercício da garantia, como na LA, é-o
sem encargos: e não envolve o pagamento nem de deslocações do fornecedor, nem
de mão-de-obra nem de acessórios, entre outros.