“Comprei um frigorífico no Retail Park, em Taveiro. Menos de um mês e uma grossa avaria deixou-o inoperativo. Devolvi-o. Exigi um novo. Que não, primeiro a reparação: é de lei. Os meses passam e… nada! Sem frigorífico e sem dinheiro.
De justificação em justificação vão encanando a perna à rã. A desculpa esfarrapada é a de que está para decisão dos serviços técnicos. E já lá vão 3 meses. Vezes sem conta a caminho de Taveiro e sempre de mãos a abanar.”
O que se nos oferece dizer?
1. Em caso de avaria, vício, desconformidade entre as especificações do contrato e a coisa, o consumidor lançará mão de qualquer dos remédios que a Lei da Compra e Venda de Consumo (LCVC) lhe confere [reparação, substituição, redução proporcional do preço e o termo do contrato].
2. Com a Lei em vigor, há, porém, uma hierarquia nos remédios, em nome da sustentabilidade das coisas: primeiro, reparação ou substituição e, só por último, o termo ao contrato (LCVC: art.º 15):
“1 - …O consumidor tem direito:
a) À reposição da conformidade (reparação ou da substituição da coisa);
b) À redução proporcional do preço; ou
c) À resolução (à extinção) do contrato.
2 — O consumidor pode escolher entre a reparação ou a substituição, salvo se o meio escolhido para a reposição da conformidade for impossível ou, em comparação com outro meio, impuser ao fornecedor custos desproporcionados, tendo em conta todas as circunstâncias, incluindo:
a) O valor que os bens teriam se não se verificasse a [não] conformidade;
b) A relevância da [não] conformidade; e
c) A possibilidade de recurso ao meio de reposição da conformidade alternativo sem inconvenientes significativos para o consumidor.
…”
3. De harmonia com a LCVC (art.º 18):
“2 — A reparação ou a substituição do bem é… :
a) A título gratuito;
b) Num prazo razoável a contar do momento em que o fornecedor tenha sido informado pelo consumidor da [não] conformidade;
c) Sem grave inconveniente para o consumidor, tendo em conta a natureza dos bens e a finalidade a que … os destina.
3 — O prazo para a reparação ou substituição não deve exceder os 30 dias, salvo nas situações em que a natureza e complexidade dos bens, a gravidade da [não] conformidade e o esforço necessário para a conclusão da reparação ou substituição justifiquem prazo superior.”
4. No entanto, desde que a não conformidade (vício, avaria, divergência entre especificações…) ocorra nos 30 dias subsequentes à entrega da coisa, ao consumidor se reconhece o denominado direito de rejeição, que é fulminante:
“Nos casos em que a [não] conformidade se manifeste no prazo de 30 dias após a entrega do bem, o consumidor pode [impor] a imediata substituição do bem ou a resolução [o termo] do contrato.” (LCVC: art.º 16)
5. A escolha compete ao consumidor: não há cá lugar a uma eventual reparação; ou exige a substituição ou põe terminantemente fim ao contrato.
6. A substituição dever-se-ia ter processado, em princípio, no lapso de 30 dias (LCVC: n.º 3 do art.º 18).
7. A violação do disposto no artigo 16 da LCVC (a substituição oportuna da coisa) constitui contra-ordenação económica grave passível de coima e sanções acessórias (LCVC: al. c) do n.º 1 do art.º 48):
7.1. A coima varia segundo o talhe da empresa: se micro (menos de 10 trabalhadores), pequena (de 10 a 49), média (de 50 a 249) ou grande (250 ou mais trabalhadores):
7.2. Tratando-se de média empresa a sanção oscila entre os 8 000 € e os 16 000 €; se de grande empresa entre os 12 000 € e os 24 000 €.
8. Reclamação no Livro em papel ou electrónico para que a ASAE, de posse dos dados, instaure os correspondentes autos e inflija as sanções que no caso couberem.
CONCLUSÃO
a. Se o ‘vício’ ocorrer nos dias 30 a seguir à entrega, o consumidor tem o direito de exigir a imediata substituição ou a pôr desde logo termo ao contrato (LCVC: art.º 16).
b. Se optar pela substituição, há, em princípio, 30 dias para que tal efeito se produza (LCVC: n.º 3 do art.º 18).
c. A violação de tais normas constitui contra-ordenação económica grave (LCVC: als. c) e d) do n.º 1 do artigo 48).
d. Tratando-se de grande empresa, como parece, a coima atingirá, no limite, 24 000 € (mais que o preço do frigorífico em causa…).
Tal é, salvo melhor juízo, o nosso parecer.
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal

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