terça-feira, 3 de junho de 2025

RÁDIO VALOR LOCAL DIRE©TO AO CONSUMO


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PREVENIR PARA NÃO REMEDIAR



PROGRAMA

 03.Junho.2025

I

INTRÓITO

VL

A semana transacta, o Prof. teve uma intervenção numa das televisões da Grande Lisboa, a Kuriakos – TV.

E a entrevista concedida ao meu colega João Nuno Pinto foi, aliás, muito interessante.

Mas teve um encontro indesejado, ao que julgo saber, no Centro Comercial Vasco da Gama, nas imediações da Gare do Oriente.

Quer relatar-nos o facto?

 MF

Dei, com efeito, um pulo ao Centro Comercial enquanto aguardava o comboio.

E o que se me deparou?

 Na GLEBA

 Um cartaz com os seguintes dizeres:

 

 Ora, isto é ilegal.

E nós já o dissemos, sempre que questionados sobre o ponto:

 

A Recomendação 2010/191/UE, de 22 de Março de 2010, da Comissão Europeia, com caráter interpretativo do Regulamento que introduziu o euro na Zona Euro, define claramente que "os comerciantes não podem recusar pagamentos em numerário, a menos que as partes [os próprios e os consumidores] tenham acordado entre si a adoção de outros meios de pagamento". Define ainda que "A afixação de letreiros ou cartazes a indicar que o comerciante recusa pagamentos em numerário, ou pagamentos em certas denominações de notas, não é por si só suficiente nem vinculante para os consumidores. Para que colha, terá o comerciante de invocar fundadamente uma razão legítima para o efeito às entidades que superintendam nos sistemas de pagamento. Entidades públicas que prestem serviços essenciais aos cidadãos não poderão aplicar restrições ou recusar em absoluto pagamentos em numerário sem razão válida, devidamente fundada e sancionada por quem de direito…”

 VL

Há então uma violação da lei?

 MF

Uma clara violação da lei.

1.  No caso estamos perante condições gerais absolutamente proibidas que, trasladadas para os contratos singulares, se transformam em cláusulas feridas de nulidade…

 

2.  Eis o que prescreve A Lei das Condições Gerais dos Contratos em seu artigo 21:

Artigo 21.º

Cláusulas absolutamente proibidas

São em absoluto proibidas, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:

a) Limitem ou de qualquer modo alterem obrigações assumidas, na contratação, directamente por quem as predisponha ou pelo seu representante;

i) Se encontrem redigidas com um tamanho de letra inferior a 11 ou a 2,5 milímetros, e com um espaçamento entre linhas inferior a 1,15».

 

3.     Ora, na vertente situação não é de letras miudinhas, de letras microscópicas que se trata. Já que o cartaz está bem visível, e as condições gerais se acham grafadas em letras garrafais.

  

4.     O meio processual adequado para atacar as proibições tanto absoluta quanto relativamente proibidas é, no plano das condições gerais, o da acção inibitória, nos termos do art.º 25 da Lei das Condições Gerais dos Contratos:

 

“As cláusulas contratuais gerais, elaboradas para utilização futura, quando contrariem o disposto nos artigos 15.º, 16.º, 18.º, 19.º, 21.º e 22.º podem ser proibidas por decisão judicial, independentemente da sua inclusão efectiva em contratos singulares.”

 

5.     E, no que se refere aos contratos singulares, o efeito jurídico é o da sua nulidade quer se trate de cláusulas absoluta ou relativamente proibidas (não há, pois, no plano dos efeitos, a dualidade do regime das invalidades) o efeito é sempre o da nulidade que não o da nulidade para as absolutamente proibidas e da anulabilidade para as relativamente proibidas.

 

6.     Como inovação, porém, da Directiva Omnibus – 2019/2161, de 27 de Novembro –, do Parlamento Europeu e do Conselho, a cuja transposição procedeu parcialmente o DL 109 – G / 2021, de 10 de Dezembro, as condições gerais absolutamente proibidas passaram a ter também uma cominação específica: subsumem-se no regime das contra-ordenações económicas, com o grau mais elevado: o de ilícitos de mera ordenação social muito graves.

 

7.     Eis o que ora estabelece o artigo 34 – A da Lei das Condições Gerais dos Contratos

 

“Artigo 34.º-A

Contra-ordenações

 

1 - Constitui contra-ordenação muito grave, punível nos termos do Regime Jurídico das Contraordenações Económicas (RJCE), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 9/2021, de 29 de Janeiro, a utilização de cláusulas absolutamente proibidas nos contratos, incluindo as previstas nos artigos 18.º e 21.º

2 - Se as contra-ordenações previstas no presente decreto-lei corresponderem a infracções generalizadas ou a infrações generalizadas ao nível da União Europeia, na aceção dos n.os 3) e 4) do artigo 3.º do Regulamento (UE) 2017/2394, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2017, relativo à cooperação entre as autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da legislação de proteção dos consumidores e que revoga o Regulamento (CE) n.º 2006/2004, o limite máximo das coimas a aplicar no âmbito de ações coordenadas, conforme previsto no artigo 21.º do mesmo regulamento, corresponde a 4 /prct. do volume de negócios anual do infrator nos Estados-Membros em causa, sem prejuízo do número seguinte.

3 - Quando não esteja disponível informação sobre o volume de negócios anual do infrator, o limite máximo da coima a que se refere o número anterior é de 2 000 000 (euro).

4 - A negligência é punível nos termos do RJCE.

5 - Salvo disposição em contrário, o montante das coimas aplicadas é distribuído nos termos previstos no RJCE.

6 - O disposto no presente artigo não prejudica a aplicação do regime substantivo e processual específico do sector em causa, caso este exista.

 

8.     Em geral, o leque das contra-ordenações gradua-se como segue, por referência ao regime adoptado em 29 de Janeiro de 2021:

Micro-empresas - € 3 000 a € 11 500

Pequenas empresas – 8 000 a € 30 000

Médias empresas - € 16 000 a € 60 000

Grandes empresas - € 24 000 a 90 000

 

Referência a acções com projecção no EEE em que as coimas são susceptíveis de atingir ou 4% do volume de negócios anual ou, se não for possível apurar tais valores, com um limite até € 2 000 000.

 

9. Portanto, não se percebe, ante as reclamações apresentadas já ao Banco de Portugal, o que estará à espera o seu Departamento de Supervisão Comportamental para agir.

 

10. Teremos de participar o facto ao Ministério Público?

 

II

CONSULTÓRIOS

VL

Jacinta Canelas – Loures

Professor, há dia fui com o meu marido á loja normal de Loures, não levei saco, e com o avolumar das compras decidimos comprar um dos sacos normais da loja. Não tinha dos normais que normalmente custam um euro, tive de comprar um de pano que custou dois euros e meio. A minha pergunta é: Tendo em conta a chico-espertice dos lojistas, não deveriam estes providenciar stock razoável ou, a faltar, facultarem sacos grátis?

 

MF

Tem, na verdade, razão.

Se de uma correcta política comercial se tratasse, a não haver sacos dos usuais, dos padronizados, deveriam facultar os mais, de substituição, ao preço corrente.

Na desconfiança que vai reinando no comércio em geral, parece deliberado… porque em tudo há vantagens para o fornecedor e desvantagens para o consumidor.

A relação de confiança, de proximidade, personalizada, perdeu-se e, infelizmente, nem nas mercearias de bairro parece prevalecer um mínimo de respeito pela figura do consumidor.

Porque tudo serve para tirar vantagens em detrimento dos seus direitos.

Sempre supusemos que o preço seria mais em conta. Por via de regra, 20 ou 30 cêntimos que não um euro pelos sacos correntes

Pode haver aí especulação. Confira, no entanto, os preços na concorrência.

  

Susana Monteiro – Azambuja

Recentemente numa viagem que fiz ao norte, fiquei hospedada num alojamento local. Demos o sinal de entrada de 150 euros, e no final da estadia de 3 dias, pagamos os restantes 350 euros.

Até aqui tudo bem. No entanto na factura, apenas veio mencionado o valor dos 350 euros. O proprietário alegou que não tinha como passar os 150 euros, já que estes eram de caução. Então não nos deviam devolver? Coisa que não aconteceu. Foi apresentada queixa na GNR, e na ASAE, no livro de reclamações não foi possível, porque não existia. Como é possível haver ainda pessoas que não sabem cuidar dos clientes/consumidores?

 

MF

Situações destas mostram-se, na realidade, surpreendentes.

É facto que a não conformidade entre o pagamento efectuado e o constante da factura emitida constitui, ao que se nos afigura, uma contra-ordenação tributária.

A Autoridade tributária deveria ser chamada à intervenção no processo se quer a força de segurança quer a Autoridade de Regulação do Mercado lhe remeterem oficiosamente as reclamações, porque autoridade competente na matéria.

Com efeito, a caução constitui como que antecipação do preço, devendo ser escriturada na factura a importância global que não meramente parcial.

A justificação é de todo descabida e revela, à saciedade, como é que há gente com disposição para tudo e para tanto.

Fez bem em agir e em apresentar as reclamações às entidades assinaladas.

Além disso, as unidades de alojamento local devem dispor do Livro de Reclamações, como o obriga o art.º 2.º da Lei do Livro de Reclamações de 15 de Setembro de 2005 (al. b) do n.º 1 do Anexo Único) e alínea a) do n.º 1 do artigo 3.º.

A inobservância do que a lei obriga, neste particular, constitui contra-ordenação económica grave, nos termos do n.º 1 do art.º 9.º

Ora, tratando-se de pessoa singular, a coima para o efeito – a aplicar pela ASAE, precedendo autos de contra-ordenação - variará

. entre os 650 a 1 500 €.

. Se de micro-empresa se tratar - de 1 a 9 trabalhadores – a coima oscilará entre os 1 700 e os 3 000 €.

O importante é que a ASAE e a AT não deixem de agir.

Vai sair-lhe cara a gracinha… se as entidades entenderem agir, como lhes compete.

 

Rui Cintra – Alcochete

Um destes dias num restaurante cobraram-me 1.50€ para ter batatas fritas num prato que leva batatas fritas. Por acaso era um bitoque, que vinha só com o bife. Esta parece, professor, uma prática generalizada. Ainda tive para pedir um ovo, mas tivemos receio que fosse o preço da galinha. Está é uma prática, segundo ouvi dizer, mas será legal?

 

MF

Em geral, o acompanhamento integra o prato. A isso nos habituámos ao longo dos tempos.

E o costume valeria.

Porém, em determinados estabelecimentos passou-se, entre outras aspectos, a separar os preços do prato e dos acompanhamentos.

Será legal se houver PRÉVIA INFORMAÇÃO.

Assim como para o OVO.

O que as pessoas não podem é ser confrontadas nem com preços surpresa nem com surpresas na factura.

Mas a informação tem de estar disposta de MODO VISÍVEL, sob pena de não valer.

Ainda que esteja, mas de modo ilegível, é como se lá não estivesse.

E, consequentemente, não é exigível. Se o trasladarem para a factura, estaremos perante um crime de especulação, cuja moldura é a de prisão de 6 meses a três anos e de multa não inferior a 100 dias (DL 28/84: art.º 35).

A ASAE é o órgão de polícia criminal que receberá a denúncia.

 

 

 

Rui Rogério – Cartaxo

Professor, gostava de saber qual a sua opinião sobre a cobrança da “Taxa de Disponibilidade” na água?

Aqui na zona já ficamos sem água mais do que uma vez e por varias horas, mas a taxa é cobrada na mesma?

 MF

Já o escrevemos:

O princípio-regra da “protecção dos interesses económicos do consumidor” imporia se facturasse só “o que se consumsse e nessa exacta medida”…

Com a revisão da Lei-Quadro de Defesa do Consumidor de 1981, e porque os serviços públicos essenciais se apresentavam em relação de supra/infra-ordenação, curial seria se adoptasse uma regra de equilíbrio inter partes.

Donde, n.º 8 do seu artigo 9.º:

“Incumbe ao Governo adoptar medidas adequadas a assegurar o equilíbrio das relações jurídicas que tenham por objecto bens e serviços essenciais, designadamente água, energia eléctrica, gás, telecomunicações e transportes públicos.”

Daí a LPSPE, que no seu artigo 8.º definiu:

“São proibidas a imposição e a cobrança de consumos mínimos.”

 

Os operadores, porém, ancorados em seu poderio, aliás, sem grande imaginação, “recriaram” o conceito: introduziram “quotas de serviço”, “quotas de disponibilidade”… [fixas e variáveis] (Água), “assinatura” (Telecomunicações), “taxa de potência” (Energia eléctrica), “termo fixo natural” (Gás)… e outras denominações, fruto de imaginação fácil e produtiva.

E de nada valeu singular iniciativa processual da ACOP – Associação de Consumidores de Portugal – contra as Águas da Figueira, SA, como exemplo, que esbarrou na “incompetência” dos tribunais e na ignorância dos julgadores, fadada ao insucesso como foi!

 

Quando de nossa banda suscitámos o anacronismo dos alugueres dos instrumentos de medição, o legislador, receptivo, aditou, em 2008, ao artigo em epígrafe dois incisos:

“2 – É proibida a cobrança aos utentes de:

a) Qualquer importância a título de preço, aluguer, amortização ou inspecção periódica de contadores ou outros instrumentos de medição dos serviços utilizados;

b) Qualquer outra taxa de efeito equivalente à utilização das medidas referidas na alínea anterior, independentemente da designação utilizada;

c) Qualquer taxa que não tenha uma correspondência directa com um encargo em que a entidade prestadora do serviço efectivamente incorra, com excepção da contribuição para o audiovisual;

d) Qualquer outra taxa não subsumível às alíneas anteriores que seja contrapartida de alteração das condições de prestação do serviço ou dos equipamentos utilizados para esse fim, excepto quando expressamente solicitada pelo consumidor.

3 – Não constituem consumos mínimos, para efeitos do presente artigo, as taxas e tarifas devidas pela construção, conservação e manutenção dos sistemas públicos de água, de saneamento e resíduos sólidos, nos termos do regime legal aplicável.”

No entanto, consumos mínimos e alugueres persistem sob inúmeras “máscaras” na facturação que se vem emitindo regularmente.

E nem reguladores nem direcções-gerais (mormente a do “consumidor”) nem ‘instituições de consumidores’ emergentes da sociedade civil ousam afrontar o “statu quo”…

E curial seria se restituísse aos consumidores tantas das parcelas que constituem autênticas fortunas ilicitamente arrecadadas pelos operadores em prejuízo dos orçamentos domésticos.

Não se olvide que os ‘serviços não solicitados’ facturados pela Vodafone e, a esse título, alvo de condenação pelo Supremo Tribunal de Justiça, em 2022, ascendem, em 4 anos, ao que se diz, em 4 mil milhões de euros…

E outros entorses se registam, constituindo locupletamento ilícito dos operadores em detrimento da bolsa dos consumidores.

  

Luísa Tomé – Santarém

Save professor. Sou ouvinte do podcast há vários anos, e gostava de lhe perguntar sobre um novo fenómeno que tenho verificado. Estou a receber chamadas da Endesa para pagar uma conta que  nunca tive, nem sei porque carga de água o meu numero consta num processo em nome de não sei quem.

O que é facto é que da última vez que me ligaram, e ligam sempre de números diferentes, eu disse ao senhor que era engano e ele com uma arrogância sobranceira respondeu que “aqui não há enganos”.

Quem é que este senhor desta agência de cobranças pensa que é? Não me conhece, não sabe a minha vida e não tenho qualquer ligação à Endesa. Aqui há alguma coisa de errado, o que posso fazer?

 MF

Dos termos da consulta não se percebe bem se os telefonemas partem da ENDESA ou de uma qualquer empresa de cobranças.

E seria importante sabê-lo.

Tratando-se de SPAM, de comunicações não solicitados para o eventual cumprimento de dívida inexistente, deve do facto dar parte à Comissão Nacional de Protecção de Dados.

Se tiver hipóteses, deduza a reclamação no Livro de Reclamações  Electrónico, narrando todos os factos para que a ERSE – Entidade Reguladora do Sector Energético possa agir.

Se não, no livro de reclamações em suporte físico num qualquer ponto de venda da ENDESA ou na Loja do Cidadão, se for o caso.

O assédio constitui prática desleal na modalidade agressiva e constituirá contra-ordenação económica grave cuja moldura varia consoante a dimensão das empresas:

. Microempresa, de (euro) 1 700,00 a (euro) 3 000,00;

. Pequena empresa, de (euro) 4 000,00 a (euro) 8 000,00;

. Média empresa, de (euro) 8 000,00 a (euro) 16 000,00;

. Grande empresa, de (euro) 12 000,00 a (euro) 24 000,00;

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