“No último consultório, abordou a questão do estranhíssimo “termo fixo natural”, máscara de consumos mínimos nos serviços de fornecimento de gás que a lei não parece consentir. E que dá mesmo como proibido.
Mas não falou das quotas de disponibilidade ou das quotas de serviço ou de volumetria (fixas e variáveis) que enchem as facturas da água de norte a sul do País… sem que ninguém arremeta contra os municípios, as empresas municipais, os concessionários ou o Regulador.
Então, as tais “quotas” são admissíveis, são legais?”
Apreciada a questão, cumpre então dizer o que se nos oferece:
1. Com efeito, sempre que se trate de importâncias que se não encaixem nos montantes devidos pelo consumo efectivo de um qualquer serviço há clara violação do “direito à protecção dos interesses económicos dos consumidores”, constitucionalmente consagrado (Const.ão Rep.ª Port.ª : n.º 1 do art.º 60).
2. Como corolário de um tal princípio-regra, o de que “o consumidor deve pagar só o que consome na exacta medida do que e em que consome”.
3. Ora, no concreto caso da água, qualquer quota de disponibilidade, de serviço ou taxa de volumetria (segundo os escalões), quer seja fixa, quer fixa e variável, contraria o princípio-regra e ocupa a trincheira da mais ostensiva ilegalidade.
4. Com efeito, a Lei dos Serviços Públicos Essenciais proíbe, entre outros, desde 1996, “os consumos mínimos” (Lei 23/96: n.º1 do art.º 8.º).
5. E diz mais:
“ É proibida a cobrança… de:
…
c) Qualquer taxa que não tenha uma correspondência directa com um encargo em que a entidade prestadora do serviço efectivamente incorra, com excepção da contribuição para o audiovisual;
d) Qualquer outra taxa não subsumível [ao que antecede] que seja contrapartida de alteração das condições de prestação do serviço ou dos equipamentos utilizados para esse fim, excepto quando expressamente solicitada pelo consumidor.” (Leim23/96: n.º 2 do art.º 8.º)
6. Com uma excepção, porém:
“Não constituem consumos mínimos … as taxas e tarifas devidas pela construção, conservação e manutenção dos sistemas públicos de água, de saneamento e resíduos sólidos…” (Lei 23/96: n.º 3 do art.º 8.º)
7. Por conseguinte, qualquer importância, seja a que título for, que exorbite do quadro traçado, constitui violação das normas transcritas.
8. A cobrança de montantes que excedam as previsões legais constitui, a esse título, crime de especulação (DL 28/84: n.º 1 do art.º 35).
9. A moldura penal da especulação é a de prisão de 6 meses a 3 anos e multa não inferior a 100 dias (DL 28/84: idem).
EM CONCLUSÃO:
a. Nos serviços públicos essenciais, maxime no que tange à água, proíbe-se qualquer consumo mínimo (Lei 23/96: n.º 1 do art.º 8.º).
b. Quaisquer quotas de disponibilidade, de serviço ou de volumetria (fixa e variável) cabem na proibição, “independentemente da designação utilizada”, seja qual for a máscara que afivelem (Lei 23/96: als. c) e d) do n.º 2 do art.º 8.º)
c. Só se excluem “ as taxas e tarifas devidas pela construção, conservação e manutenção dos sistemas públicos de água, de saneamento e resíduos sólidos” (Lei 23/96: nº 3 do art.º 8.º)
d. A cobrança de quaisquer montantes que exorbitem o quadro traçado constitui crime de especulação: pena de prisão de 6 meses a 3 anos e de multa não inferior a 100 dias (DL 28/84: n.º 1 do art.º 35).
Esta é, salvo melhor juízo, a nossa opinião.
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal
Sem comentários:
Enviar um comentário