sexta-feira, 29 de julho de 2022

O que vale, Afinal?...


O que com alarde

vem na publicidade?

Ou de forma mais fria

No cupão da garantia?

 

“Quando na publicidade

Se promete mundos e fundos

No contrato, à claridade,

Há que cumpri-los… rotundos!”

 

“A KIA, marca automóvel acreditada no mercado, anuncia uma garantia de 7 anos para veículos novos e usados.

Tal publicidade aparece, sem rebuço, nas Redes Sociais. E não só! Sem mais.

A publicidade não estabelece eventuais restrições. O que é surpreendente, sobretudo tratando-se de veículos usados!

Claro que isso pode representar uma vantagem competitiva, sabendo-se, como se sabe, que é aí, exactamente na garantia, que muitas das marcas definem as diferenças face à concorrência.

No entanto, o que se teme é que, em concreto, depois desse anúncio redondo, comece a haver restrições em determinados órgãos sensíveis dos veículos, como é de regra em muitas das marcas estabelecidas no mercado.

É lícito às marcas proceder desse modo, isto é, publicitar uma coisa e, depois, reduzindo a oferta, em concreto, nos cupões de garantia ou no texto do próprio contrato?”

 

Apreciando e opinando:

1.    Na realidade, isso começa a ser cada vez mais usual: publicita-se uma coisa e oferece-se outra e bem diferente.

 

2.    Embora, tenha havido várias tentativas, na Europa, para permitir que a publicidade pudesse oferecer algo e, depois, na prática o produto não ter as qualidades apresentadas, o certo e que isso não vingou.

 

3.    Em Portugal, rege a Lei-Quadro de Defesa do Consumidor [LDC], em cujo n.º 5 do artigo 7.º, sob a epígrafe “da informação em geral”, se estabelece inequivocamente o que segue:

“As informações concretas e objectivas contidas nas mensagens publicitárias de determinado bem, serviço ou direito consideram-se integradas no conteúdo dos contratos que se venham a celebrar após a sua emissão, tendo-se por não escritas as cláusulas contratuais em contrário.”

4.    A Lei das Garantias dos Bens de Consumo [DL 84/2021, de 18 de Outubro] reforça, nos n.ºs 1, 2 e 3 do seu artigo 43, uma tal perspectiva, a saber:

“1 — A garantia comercial vincula o garante nos termos das condições previstas na declaração de garantia comercial e da publicidade disponibilizada antes ou no momento da celebração do contrato.

2 — São ainda vinculativas para o garante as condições anunciadas em publicidade anterior ou concomitante ao momento da celebração do contrato.

3 — Sempre que os termos e condições da declaração de garantia e da publicidade promovida nos termos dos números anteriores não sejam coincidentes, o consumidor beneficia das condições mais favoráveis, excepto nos casos em que antes da celebração do contrato a publicidade tenha sido corrigida de uma forma idêntica ou comparável àquela pela qual foi anteriormente efectuada.”

5.      Por conseguinte, o que vale é o que consta da publicidade. Que não o que, depois, aparece no contrato ou em qualquer acessório como no cupão da garantia com cortes de toda a ordem.

 6.      “Garantia é a garantia toda… de toda a coisa!”

 7.      Donde, as restrições e exclusões violarem flagrantemente a lei.

 

EM CONCLUSÃO:

1.      Se da publicidade a dada marca de veículos, consta que a garantia é de 7 anos, tanto para novos como para usados, o que marca é a publicidade, não o que, depois, em particular se estabeleça ou venha a estabelecer no contrato ou no cupão de garantia [LDC: n.º 5 do artigo 7.º].

2.      Como diz a lei, “têm-se por não escritas as cláusulas contratuais em contrário”!

3.      A Lei das Garantias dos Bens de Consumo [LGBC - DL 84/2021, de 18 de Outubro] reforça uma tal perspectiva, no seu artigo 43 [n.ºs 1 a 3].

4.      Só assim não será se “antes da celebração do contrato a publicidade tenha sido corrigida de uma forma idêntica ou comparável àquela pela qual foi anteriormente efectuada.” [LGBC: última parte do n.º 3 do art.º 43]

Tal é, salvo melhor juízo, a nossa opinião.

 

Mário Frota

presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal

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