A 25 de Outubro de 1985
veio a lume a Lei das Condições Gerais dos Contratos (impropriamente denominada,
das “Cláusulas Contratuais Gerais”).
E foi um passo
importante, no acerto do ordenamento português com o que a vida ia produzindo:
cada vez mais contratos de adesão, expressão do poder de mercado dos
monopólios, oligopólios e de empresas outras com assinaláveis posições de senhorio económico no seu seio.
Primeiro a Alemanha em
1976, depois a Inglaterra em 1977, a França em 1978, mais tarde a então
Comunidade Económica Europeia em 1984, que só surgiria à luz do dia com um
diploma em 1993…
Portugal, na esteira da
Lei alemã das Condições Gerais Negociais, deu à estampa a lei em 1985, que teve
de ser afeiçoada à directiva europeia mais tarde.
Não se nos afigura que se
haja colhido logo frutos dessa “nova disciplina” (de repressão das cláusulas
leoninas) que a 22 de Fevereiro de 1986 entrou em vigor. Por razões facilmente
explicáveis: a Universidade só tarde introduziu (onde introduziu) a matéria na
disciplina das Obrigações, os Centros de Formação das Magistraturas e da Ordem
dos Advogados negligenciaram fazê-lo. Só em 1989/90, por iniciativa do saudoso
Neves Ribeiro, docente no Centro de Estudos Judiciários, se iniciou um
sem-número de seminários que nós mesmos animámos.
E as espécies discutidas
nos tribunais, em razão de um tal défice lectivo, espelhavam isso mesmo: raros
eram os que invocavam as cláusulas absoluta ou relativamente proibidas
constantes de contratos pré-elaborados,
em particular dos pré-redigidos, a desfigurar os equilíbrios contratuais e a
merecer a mão pesada da justiça.
Ainda há dias um
catedrático de direito privado recriminava o facto de, nestes cursos breves de
Bolonha, não caber, nas matérias preleccionadas, temas destes que são de uma
extraordinária importância no dia-a-dia. Logo, a ignorância a projectar-se na
formação de sucessivas fornadas de licenciados lançadas na vida corrente.
Há uma obra prática
relevante da autoria de José Manuel de
Araújo Correia que bem mereceria ser actualizada.
A colectânea que o
Supremo Tribunal de Justiça entendeu editar com a corte de decisões sobre a
matéria remonta a 2012 e bem mereceria também um complemento até aos nossos
dias.
Há um Registo Nacional,
criado por portaria, na esteira da Lei das Condições Gerais dos Contratos:
deveria constituir um repositório das
decisões passadas em julgado. Nem sequer sabemos se se acha actualizado porque,
tempos houve, em que era uma autêntica
miséria no desarranjo em que se transformam as coisas à guarda do Estado, dos
edifícios ao mais.
A lei foi actualizada em
2021, com dispositivos sobre tamanho da letra, eventualmente sobre a eficácia
do caso julgado, com a criação da Comissão das Cláusulas Abusivas que, ao que se
julga saber, ainda não está de pé, mais de 3 anos após a sua criação.
E com um distinto quadro
sancionatório, com coimas à mistura sempre que os reguladores (incluindo o do
mercado, a ASAE) e ou a Direcção-Geral do Consumidor as detectem
seja em que suporte for (visual, auditivo, pepel ou qualquer outro, duradouro),
a marcar desde logo uma posição… até como forma de evitar as delongas do
procedimento judicial que ocorrem com a tramitação da acção inibitória que,
segundo estatísticas fiáveis, levam em média 8 anos, da instauração ao trânsito
em julgado da decisão.
E, pelos vistos, a
Direcção-Geral do Consumidor já está em campo:
Em recente acção de
fiscalização, 20 tipos de contratos de adesão e 241 condições gerais objecto de
análise de cadeias de ginásios esparsos pelo país.
Uma das condições gerais
proibidas é a de “o ginásio não se responsabilizar se alguém se magoar ou
sofrer algum dano moral ou à sua saúde”.
Outra, a que limita a
utilização de parte ou da totalidade das instalações dos ginásios, para
efeitos, por exemplo, de realização de obras, sem que os clientes possam
suspender o pagamento das respectivas mensalidades/quotas”.
Condições gerais
ilícitas, no mercado, é mato!
O que é preciso é soltar
as feras para acabar com estas misérias, para pôr termo a estas vergonhas.
40 anos é muito para se
estar ainda bem longe do objectivo original!
Venha a Comissão das
Cláusulas Abusivas, venha acção que o consumidor continua “a ferros” por toda a
parte!
Mário Frota
presidente
emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO
– de Portugal