NOVA AGENDA EUROPEIA DO CONSUMIDOR
(Plano de Acção 2021/25)
A TRANSFORMAÇÃO DIGITAL
A transformação
digital está a mudar radicalmente a
vida dos consumidores, proporcionando-lhes mais oportunidades e uma escolha
mais ampla de bens e serviços.
Ao mesmo tempo, pode dificultar a escolha informada e a
salvaguarda dos seus interesses. A recolha e o tratamento de dados subjacentes,
combinados com a análise do comportamento dos consumidores e dos seus
preconceitos cognitivos, podem ser utilizados para influenciar os consumidores
no sentido de tomarem decisões que podem contrariar o seu interesse superior.
Tal pode limitar a eficácia das atuais regras de protecção
dos consumidores no ambiente digital, nomeadamente contra as práticas
comerciais desleais.
A Directiva relativa
à melhor aplicação e à modernização da legislação em matéria de defesa dos
consumidores e a Directiva Conteúdos
Digitais constituem passos importantes para dar resposta a alguns destes
desafios.
Tendo em conta o ritmo acelerado do progresso tecnológico e
o seu impacto na experiência dos consumidores, é necessário tomar medidas
adicionais. É necessário combater as práticas
comerciais que não respeitam o direito dos consumidores a fazer uma escolha
informada, que abusam dos seus preconceitos comportamentais ou distorcem os
seus processos de tomada de decisão. Estas práticas incluem a utilização de padrões
«obscuros», determinadas práticas de personalização frequentemente
baseadas na definição de perfis, a publicidade oculta, as fraudes, a informação
falsa ou enganosa e a manipulação das avaliações dos consumidores.
São necessárias orientações adicionais sobre a
aplicabilidade de instrumentos de direito do consumidor como a Directiva Práticas Comerciais Desleais
e a Directiva Direitos dos Consumidores a
estas práticas.
Em última análise, os consumidores devem beneficiar de um nível comparável de protecção e justiça em
linha ou fora dela. A fim de assegurar que os consumidores beneficiem
plenamente do potencial significativo da transformação digital, os seus
interesses devem ser tidos em conta na concepção ou na adaptação das regras que
regem a economia digital.
O objectivo é duplo:
criar um espaço digital mais seguro para os consumidores, onde os seus direitos
sejam protegidos, e garantir condições de concorrência equitativas que permitam
inovar e prestar serviços novos e de melhor qualidade a todos os europeus. Em primeiro lugar, a futura proposta da
Comissão de um novo ato relativo aos serviços digitais terá por objectivo definir
novas responsabilidades e reforçar a responsabilização dos intermediários e
plataformas em linha.
O novo Acto
assegurará a protecção efectiva dos consumidores contra os produtos, conteúdos
e actividades ilegais nas plataformas em linha, tal como já sucede fora de
linha.
Em segundo lugar, para resolver os problemas decorrentes
das deficiências dos mercados digitais, tais como o poder de guardião de acesso
detido por determinadas plataformas digitais, a Comissão tenciona apresentar
também um acto relativo aos mercados
digitais. Este combinaria a regulamentação ex ante das plataformas
digitais que actuam como guardiães de acesso com um quadro dinâmico de
investigação do mercado para examinar as deficiências dos mercados digitais.
Os consumidores serão os beneficiários finais de mercados digitais mais justos e
contestáveis, incluindo preços mais baixos, serviços novos e melhores e uma
maior escolha. Embora a inteligência
artificial (IA) possa trazer benefícios, algumas utilizações da IA podem
violar os direitos dos consumidores e causar-lhes danos. Na sequência do seu Livro Branco sobre a IA e do Relatório de acompanhamento sobre a
responsabilidade e a segurança das novas tecnologias, a Comissão Europeia está
a trabalhar:
§ numa proposta destinada a garantir um
elevado nível de protecção dos interesses dos consumidores e dos direitos
fundamentais, e a criar, por seu turno, a confiança necessária para a aceitação
da IA pela sociedade;
§ no que respeita à responsabilidade
civil, em medidas que visam garantir que as vítimas de danos causados pelas
aplicações da IA têm, na prática, o mesmo nível de protecção que as vítimas de
danos causados por outros produtos ou serviços.
O avanço das novas tecnologias e a globalização da produção
e do comércio retalhista, nomeadamente através de canais em linha, levantam a
questão de saber se as actuais regras de segurança dos produtos são suficientes
para lidar com a evolução actual e proteger adequadamente os consumidores.
A Comissão Europeia está actualmente a trabalhar numa série
de iniciativas relativas à segurança das
novas tecnologias, tais como:
§ a revisão da Directiva Máquinas;
§ a adopção de actos delegados ao abrigo
da Directiva Equipamentos de Rádio;
e
§ a revisão da Directiva Segurança Geral dos Produtos.
A Directiva Segurança
Geral dos Produtos, que estabelece o quadro jurídico para a segurança dos
produtos de consumo não alimentares, foi aprovada quando os produtos com IA e
os dispositivos conectados eram raros, situação que se alterou. Esta evolução
põe em causa a actual definição de produtos e introduz novos riscos ou altera a
forma como os riscos existentes se podem concretizar, o que deve ser analisado
e tido em devida conta.
O crescimento das vendas em linha também coloca novos
desafios, uma vez que as autoridades nem sempre dispõem de instrumentos
suficientemente eficazes para a fiscalização dos mercados em linha. Além disso,
o comércio electrónico permite que os consumidores comprem directamente aos
operadores estabelecidos fora da UE, o que dificulta a verificação da segurança
dos produtos que entram no mercado único.
A futura proposta de revisão da Directiva Segurança Geral dos Produtos, que se previu para 2021,
deverá dar uma resposta consistente a estes desafios crescentes. Além disso,
uma identidade electrónica pública
universalmente aceite – com base numa escolha dos consumidores, com seu
consentimento e a garantia de que a sua privacidade é plenamente respeitada em
conformidade com o Regulamento Geral
sobre a Protecção de Dados (RGPD) – pode dar aos consumidores a
possibilidade de gerirem o acesso e a utilização dos seus dados de forma
totalmente controlada e segura.
A Comissão Europeia está actualmente a rever esse sistema,
tendo em conta o interesse e a protecção dos consumidores. Para fazer face ao bloqueio geográfico injustificado, que discrimina
os consumidores da UE em segmentos de mercado ao longo das fronteiras
nacionais, a Comissão está actualmente a realizar a sua primeira
revisão a curto prazo do Regulamento
Bloqueio Geográfico.
A Estratégia Europeia
para os Dados visa facilitar o direito efectivo dos indivíduos à
portabilidade dos dados ao abrigo do RGPD.
Este direito tem claramente potencial para colocar os indivíduos no centro da
economia dos dados, permitindo-lhes mudar de prestador de serviços, combinar
serviços, utilizar outros serviços inovadores e escolher os serviços que
oferecem a melhor protecção de dados. A estratégia promoverá também a criação
de um verdadeiro mercado único dos dados e a criação de espaços comuns europeus
de dados.
Além disso, o sector
dos serviços financeiros de retalho foi profundamente transformado pela
transição digital, tendo introduzido novas tendências e soluções, e
diversificado a oferta de produtos e serviços financeiros. Prestadores não
tradicionais desses serviços – como as empresas de tecnologia financeira e os
mutuantes de empréstimos entre particulares – juntaram-se aos fornecedores
tradicionais, que também recorrem cada vez mais a canais de venda em linha. Novos
produtos, como os empréstimos de curto prazo/custo elevado, que são concluídos
por um curto período, mas que podem implicar custos significativos para o
mutuário, são cada vez mais comercializados e vendidos por via digital.
As novas tecnologias, como as soluções de pagamento imediato, podem trazer
benefícios tangíveis para os consumidores, mas podem exigir medidas específicas
para os proteger.
A Comissão Europeia anunciou recentemente iniciativas que
irão melhorar a protecção dos consumidores em matéria de pagamentos. Estas
questões serão analisadas no quadro da recentemente adoptada Estratégia para os Pagamentos de Pequeno
Montante na UE. A utilização de categorias alternativas de dados em
combinação com a tomada de decisões automatizadas para a classificação de
crédito levanta questões quanto aos dados que devem ser utilizados na avaliação
da solvabilidade dos consumidores e destaca os riscos de discriminação
decorrentes de decisões baseadas em algoritmos opacos, um tipo de risco
susceptível de ser abordado também através do acto jurídico sobre os requisitos
para a inteligência artificial acima referido. Além disso, a legislação em
vigor [como a Directiva Crédito ao
Consumo, a Directiva Crédito Hipotecário, a Directiva Contas de Pagamento e a
Directiva Comercialização à Distância de Serviços Financeiros] deve ser
revista, a fim de reflectir a crescente utilização de meios digitais e dar
resposta aos desafios supramencionados.
Esta legislação deve permitir aos consumidores compreender
os produtos e comparar e aceitar ofertas em linha, estimulando assim a inovação
e a confiança dos consumidores. O novo pacote de financiamento digital da
Comissão, que inclui as estratégias de financiamento digital e de pagamentos de
pequeno montante e as propostas legislativas relativas aos cripto-activos e à
resiliência operacional digital do sector financeiro, visa garantir que os
consumidores e as empresas colhem os benefícios da inovação, mas mantêm-se
protegidos. Os atuais progressos em matéria de transformação digital serão
igualmente reflectidos na estratégia
para o investimento de retalho, que deverá centrar-se nos interesses dos
investidores individuais e está prevista para o primeiro semestre de 2022. Além
disso, a transformação digital pode também trazer novos desafios como, por
exemplo, as soluções digitais que não são igualmente acessíveis às pessoas com
deficiência.
A Comissão apoia os Estados-membros na transposição do Acto Europeu da Acessibilidade.
A sua aplicação até 2025 ajudará a eliminar os desafios da
digitalização para as pessoas com deficiência e aumentará a disponibilidade de
produtos e serviços que lhes são acessíveis.
Por último, a transformação digital exige que os
consumidores tenham uma forte literacia digital e competências digitais que
devem ser promovidas através da educação e da formação numa perspectiva de
aprendizagem ao longo da vida, como salientado no Plano de Acção para a Educação Digital 2021-2027 e nas suas
prioridades estratégicas.