(edição de 23 de Abril de 2024)
(deveria ter sido publicado hoje, 23 de Fevereiro de 2024, mas naturalmente por falta de espaço não o foi)
“Se um elefante incomoda muita gente…”
“Gostava de saber se há alguma forma de impedir que a Cofidis e as Agências de Seguros de Saúde me telefonem insistentemente para me vender um crédito, a primeira, um seguro ou um plano de saúde, as segundas.
Já bloqueei o meu número de telefone e agora ligam insistentemente para o meu marido. É que nunca fomos clientes… mas serrazinam-nos o juízo, a qualquer hora do dia ou da noite.”
Apreciada a factualidade, cumpre responder:
1. A privacidade nas comunicações electrónicas inibe as empresas de contactar os consumidores no seu domicílio, a menos que nisso consintam.
Eis o que reza a Lei 41/2004, no n.º 1 do seu art.º 13-A:
“Está sujeito a consentimento prévio e expresso do assinante que seja pessoa singular, ou do utilizador, o envio de comunicações não solicitadas para fins de marketing directo, designadamente através da utilização de sistemas automatizados de chamada e comunicação que não dependam da intervenção humana (aparelhos de chamada automática)…”
2. A denúncia deve ser efectuada directamente à Comissão Nacional de Protecção de Dados (confira o respectivo Portal).
3. A coima para a contra-ordenação daí resultante oscila entre os € 5 000 e os € 5 000 000 (Lei 41/2004: art.º 14).
4. A Lei das Práticas Comerciais de 2008 proíbe o assédio: a insistência impertinente, a perseguição, a sugestão ou pretensão constantes em relação a algo ou a alguém.
5. Tal lei considera como agressivas, entre outras, em qualquer circunstância, as práticas como:
§ “contactar o consumidor através de visitas ao seu domicílio, ignorando o pedido daquele para que o profissional parta ou não volte…”;
§ “fazer solicitações persistentes e não solicitadas, por telefone, telecópia, correio electrónico ou qualquer outro meio de comunicação à distância…” (DL 57/2008: alíneas b) e c) do art.º 12).
6. Tais práticas constituem ilícitos de mera ordenação social (contra-ordenações económicas graves) passíveis de coima, consoante o talhe da empresa (entre 10 e 49 trabalhadores; entre 50 a 249; e de 250 ou mais) (DL 57/2008: n.º 1 do art.º 21: DL 9/2021: art.ºs 18 e 19).
pequena – de 4 000€ a 8 000 €
média - de 8 000€ a 16 000 €
grande - de 12 000 € a 24 000 €
7. A denúncia deve ser efectuada ao Banco de Portugal, no caso da Cofidis, e à Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, no das seguradoras.
8. No limite, o assédio é crime e a moldura penal é de prisão até 3 anos ou multa:
“1 - Quem, de modo reiterado, perseguir ou assediar outra pessoa, por qualquer meio, directa ou indirectamente, de forma adequada a provocar-lhe medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, é punido com pena de prisão até 3 anos ou pena de multa, se pena mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal.
2 - A tentativa é punível.
3 - Nos casos previstos no n.º 1, podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de contacto com a vítima pelo período de 6 meses a 3 anos e de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção de condutas típicas da perseguição.
4 - A pena acessória de proibição de contacto com a vítima deve incluir o afastamento da residência ou do local de trabalho desta e o seu cumprimento deve ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância. …” (Código Penal: n.º 1 do art.º 154-A).
9. O procedimento criminal depende de queixa ao Ministério Público.
EM CONCLUSÃO
a. A privacidade nas comunicações electrónicas inibe as empresas de contactar os consumidores no seu domicílio, a menos que haja prévio e expresso consentimento, sob pena de coima de 5 000 € a 5 000 000 € (Lei 41/2004: n.º 1 do art.º 13-A; n.º 1 do art.º 14)
b. O assédio (solicitações persistentes por telefone) constitui prática comercial desleal, na modalidade de “agressiva”, passível de coima (DL 57/2008: alínea c) do art.º 12)
c. A coima, consoante a dimensão da empresa, varia entre um mínimo e um máximo: se de média empresa se tratar, de 8 000 € a 16 000€ (DL 57/2008: n.º 1 do art.º 21).
d. No limite, pode constituir um crime passível de prisão até 3 anos ou multa (Código Penal: n.º 1 do art.º 154-A).
Tal é, salvo melhor juízo, o nosso parecer.
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITODO CONSUMO - Portugal
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