quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

CONSULTÓRIO DO CONSUMIDOR




 (‘As Beiras’)

(edição de 23 de Abril de 2024)

(deveria ter sido publicado hoje, 23 de Fevereiro de 2024, mas naturalmente por falta de espaço não o foi)

 

“Se um elefante incomoda muita gente…”

 

“Gostava de saber se há alguma forma de impedir que a Cofidis e as Agências de Seguros de Saúde me telefonem insistentemente para me vender um crédito, a primeira, um seguro ou um plano de saúde, as segundas.

Já bloqueei o meu número de telefone e agora ligam insistentemente para o meu marido. É que nunca fomos clientes… mas serrazinam-nos o juízo, a qualquer hora do dia ou da noite.”

Apreciada a factualidade, cumpre responder:

1.    A privacidade nas comunicações electrónicas inibe as empresas de contactar os consumidores no seu domicílio, a menos que nisso consintam.

 

Eis o que reza a Lei 41/2004, no n.º 1 do seu art.º 13-A:

 

“Está sujeito a consentimento prévio e expresso do assinante que seja pessoa singular, ou do utilizador, o envio de comunicações não solicitadas para fins de marketing directo, designadamente através da utilização de sistemas automatizados de chamada e comunicação que não dependam da intervenção humana (aparelhos de chamada automática)…”

 

2.    A denúncia deve ser efectuada directamente à Comissão Nacional de Protecção de Dados (confira o respectivo Portal).

 

3.    A coima para a contra-ordenação daí resultante oscila entre os € 5 000 e os € 5 000 000 (Lei 41/2004: art.º 14).

 

4.    A Lei das Práticas Comerciais de 2008 proíbe o assédio: a insistência impertinente, a perseguição, a sugestão ou pretensão constantes em relação a algo ou a alguém.

 

5.    Tal lei considera como agressivas, entre outras, em qualquer circunstância, as práticas como:

 

§  “contactar o consumidor através de visitas ao seu domicílio, ignorando o pedido daquele para que o profissional parta ou não volte…”;

 

§  “fazer solicitações persistentes e não solicitadas, por telefone, telecópia, correio electrónico ou qualquer outro meio de comunicação à distância…” (DL 57/2008: alíneas b) e c) do art.º 12).

 

6.    Tais práticas constituem ilícitos de mera ordenação social (contra-ordenações económicas graves) passíveis de coima, consoante o talhe da empresa (entre 10 e 49 trabalhadores; entre 50 a 249; e de 250 ou mais) (DL 57/2008: n.º 1 do art.º 21: DL 9/2021: art.ºs 18 e 19).

          pequena – de   4 000€ a   8 000 €

          média     -  de   8 000€ a 16 000 €

          grande    -  de 12 000 € a 24 000 €

7.    A denúncia deve ser efectuada ao Banco de Portugal, no caso da Cofidis, e à Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, no das seguradoras.

 

8.    No limite, o assédio é crime e a moldura penal é de prisão até 3 anos ou multa:

“1 - Quem, de modo reiterado, perseguir ou assediar outra pessoa, por qualquer meio, directa ou indirectamente, de forma adequada a provocar-lhe medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, é punido com pena de prisão até 3 anos ou pena de multa, se pena mais grave não lhe couber por força de outra disposição legal.

2 - A tentativa é punível.

3 - Nos casos previstos no n.º 1, podem ser aplicadas ao arguido as penas acessórias de proibição de contacto com a vítima pelo período de 6 meses a 3 anos e de obrigação de frequência de programas específicos de prevenção de condutas típicas da perseguição.

4 - A pena acessória de proibição de contacto com a vítima deve incluir o afastamento da residência ou do local de trabalho desta e o seu cumprimento deve ser fiscalizado por meios técnicos de controlo à distância. …” (Código Penal: n.º 1 do art.º 154-A).

9.    O procedimento criminal depende de queixa ao Ministério Público.

 

EM CONCLUSÃO

a.         A privacidade nas comunicações electrónicas inibe as empresas de contactar os consumidores no seu domicílio, a menos que haja prévio e expresso consentimento, sob pena de coima de 5 000 € a 5 000 000 € (Lei 41/2004: n.º 1 do art.º 13-A; n.º 1 do art.º 14)

b.         O assédio (solicitações persistentes por telefone) constitui prática comercial desleal,  na modalidade de “agressiva”,  passível de coima (DL 57/2008: alínea c) do art.º 12)

c.         A coima, consoante a dimensão da empresa, varia entre um mínimo e um máximo: se de média empresa se tratar, de 8 000 € a 16 000€ (DL 57/2008: n.º 1 do art.º 21).

d.         No limite, pode constituir um crime passível de prisão até 3 anos ou multa (Código Penal: n.º 1 do art.º 154-A).

 

Tal é, salvo melhor juízo, o nosso parecer.

 

Mário Frota

presidente emérito da apDC – DIREITODO CONSUMO - Portugal

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