A apresentação
das embalagens [da imagem física da embalagem] ilude os
consumidores porque é em tudo igual à anterior: há que precaver, pois,
os consumidores contra eventuais “ilusões de óptica”, independentemente
da conformidade do produto"
|07 Dez 2022 11:34
Rima com imaginação, mas também com especulação: “reduflação”
é o processo mediante o qual os produtos diminuem de tamanho ou
quantidade, enquanto o preço se mantém inalterado ou sofre um qualquer
acréscimo, mantendo eventualmente a aparência do original.
Perante a redução da quantidade e, quiçá, da qualidade dos alimentos processados, fenómeno a que se dá o nome de reduflação [que resulta da aglutinação de duas palavras: 'reduzir' e '(in) flação'], parece que há quem, entre nós, considere que não há, no facto, qualquer ilícito.
Um exemplo recente: uma margarina com nome feito na praça apresentava-se anteriormente numa embalagem com 500 gr: a marca reduziu a quantidade de produto, primeiro para 450 e, depois, para 400 gr., mas manteve o continente com as mesmas características e a aparência de antanho. E o preço disparou de 3 para 5,54€… Ainda que se mantivesse!
Na base da embalagem, de forma dissimulada, rotulagem com indicação da quantidade actual. Não haverá qualquer ilícito só porque a quantidade alterada consta da base, do fundo da rotulagem?
Se não houver inteira conformidade entre o produto e a rotulagem, a moldura típica em que se enquadra tal factualidade é a da “fraude sobre mercadorias” que o n.º 1 do artigo 23 da Lei Penal do Consumo de 20 de Janeiro de 1984 contempla como segue:
“Quem, com intenção de enganar outrem nas relações negociais, fabricar…, tiver em depósito ou em exposição para venda, vender ou puser em circulação por qualquer outro modo mercadorias:
…
b) De natureza diferente ou de qualidade e quantidade inferiores às que afirmar possuírem ou aparentarem,
será punido com prisão até 1 ano e multa até 100 dias…”
Aliás, ainda que haja, após a redução do produto, conformidade entre a quantidade alterada e o constante da rotulagem, é possível entrever a aplicação de um tal dispositivo porque, sem alteração da embalagem e dos mais elementos, a aparência é a do produto original, com 500 gr., que não a de 400 gr. em que por fim se ‘converteu’, com a manutenção do preço original ou o que é mais, na circunstância, com a sua quase duplicação [de 3 € para 5,54 €].
Se a factualidade, porém, não assentar no quadro do crime de fraude sobre mercadorias, há que excogitar se não cabe no enquadramento dos ilícitos de mera ordenação social (nas contra-ordenações económicas), tal como o configura a Lei das Práticas Comerciais Desleais de 26 de Março de 2008, no seu artigo 7.º, sob a epígrafe “acções enganosas”:
“é enganosa [uma qualquer] prática comercial que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos elementos… e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que de outro modo não tomaria…”
A apresentação das embalagens [da imagem física da embalagem] ilude os consumidores porque é em tudo igual à anterior: há que precaver, pois, os consumidores contra eventuais “ilusões de óptica”, independentemente da conformidade do produto [composição, qualidade e quantidade…] com a rotulagem.
A aparência é também elemento decisivo na modelação da fraude… e na decisão negocial que o consumidor vier a tomar.
A transparência é, por tal modo, preterida, afastada, comprometida…
E isso conta.
Fenómeno dos tempos que correm, só se enraíza, só se generaliza se os Governos se mostrarem desatentos e permissivos, como parece suceder em Portugal…
O Governo francês, por exemplo, acaba de anunciar medidas de combate à reduflação.
O Brasil já o fizera!
(presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO, Portugal)
Perante a redução da quantidade e, quiçá, da qualidade dos alimentos processados, fenómeno a que se dá o nome de reduflação [que resulta da aglutinação de duas palavras: 'reduzir' e '(in) flação'], parece que há quem, entre nós, considere que não há, no facto, qualquer ilícito.
Um exemplo recente: uma margarina com nome feito na praça apresentava-se anteriormente numa embalagem com 500 gr: a marca reduziu a quantidade de produto, primeiro para 450 e, depois, para 400 gr., mas manteve o continente com as mesmas características e a aparência de antanho. E o preço disparou de 3 para 5,54€… Ainda que se mantivesse!
Na base da embalagem, de forma dissimulada, rotulagem com indicação da quantidade actual. Não haverá qualquer ilícito só porque a quantidade alterada consta da base, do fundo da rotulagem?
Se não houver inteira conformidade entre o produto e a rotulagem, a moldura típica em que se enquadra tal factualidade é a da “fraude sobre mercadorias” que o n.º 1 do artigo 23 da Lei Penal do Consumo de 20 de Janeiro de 1984 contempla como segue:
“Quem, com intenção de enganar outrem nas relações negociais, fabricar…, tiver em depósito ou em exposição para venda, vender ou puser em circulação por qualquer outro modo mercadorias:
…
b) De natureza diferente ou de qualidade e quantidade inferiores às que afirmar possuírem ou aparentarem,
será punido com prisão até 1 ano e multa até 100 dias…”
Aliás, ainda que haja, após a redução do produto, conformidade entre a quantidade alterada e o constante da rotulagem, é possível entrever a aplicação de um tal dispositivo porque, sem alteração da embalagem e dos mais elementos, a aparência é a do produto original, com 500 gr., que não a de 400 gr. em que por fim se ‘converteu’, com a manutenção do preço original ou o que é mais, na circunstância, com a sua quase duplicação [de 3 € para 5,54 €].
Se a factualidade, porém, não assentar no quadro do crime de fraude sobre mercadorias, há que excogitar se não cabe no enquadramento dos ilícitos de mera ordenação social (nas contra-ordenações económicas), tal como o configura a Lei das Práticas Comerciais Desleais de 26 de Março de 2008, no seu artigo 7.º, sob a epígrafe “acções enganosas”:
“é enganosa [uma qualquer] prática comercial que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos elementos… e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que de outro modo não tomaria…”
A apresentação das embalagens [da imagem física da embalagem] ilude os consumidores porque é em tudo igual à anterior: há que precaver, pois, os consumidores contra eventuais “ilusões de óptica”, independentemente da conformidade do produto [composição, qualidade e quantidade…] com a rotulagem.
A aparência é também elemento decisivo na modelação da fraude… e na decisão negocial que o consumidor vier a tomar.
A transparência é, por tal modo, preterida, afastada, comprometida…
E isso conta.
Fenómeno dos tempos que correm, só se enraíza, só se generaliza se os Governos se mostrarem desatentos e permissivos, como parece suceder em Portugal…
O Governo francês, por exemplo, acaba de anunciar medidas de combate à reduflação.
O Brasil já o fizera!
(presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO, Portugal)
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