segunda-feira, 25 de julho de 2022

Jorge Pegado Liz: deixou-nos o melhor de todos nós!


De Nogueira do Cravo (Oliveira do Hospital)  para o Mundo! Para uma projecção de vulto em distintos areópagos internacionais!
Jorge Liz foi uma singular figura que cumpre, a justo título, homenagear, em momento em que há notícia do seu infausto passamento, que, aliás,  aconteceu já há dias, em Lisboa.
Jorge Liz deixou-nos pouco depois de completar, a 28 de Dezembro pretérito, 81 anos. E passeou o seu talento por um sem-número de palcos em que “o interesse geral” era susceptível de se afirmar, em tudo pugnando pela consecução de tão nobres objectivos que lhe eram superlativamente caros. Com uma presença actuante tanto no Parlamento Nacional como no Europeu, como em instituições de nomeada no firmamento geral, em que imprimiu de forma decisiva o cunho do seu carácter de Homem Universal!
Finou-se o melhor de todos nós: e, ao afirmá-lo, não o fazemos nem por displicente condescendência póstuma, nem como fria hipocrisia de quem é já “saudade” porque  insusceptível de interferir directamente no quotidiano;  não se trata, pois,  de mera figura de retórica, antes de uma asserção que se funda num perfil e num curriculum invejáveis, insuperáveis! E pela influência que daí emerge para os tempos vindouros!
Jorge Liz, como apreciava que o tratassem, foi figura de primeiro plano – intra como extra muros – no domínio da promoção dos interesses e da política de consumidores.
Cedo se interessou pelos magnos problemas dos direitos dos cidadãos-consumidores e a eles consagrou uma parte apreciável da sua vida.
Formou-se na Universidade Clássica de Lisboa e de imediato se votou à advocacia, mantendo em aberto a sua inscrição na Ordem dos Advogados por quatro décadas, de início de meados dos anos 90 do século passado a 2016.
E desempenhou um ror  de missões de subido interesse público, no País e fora dele, pelo País e em favor do interesse de todos nós.
Foi Representante de Portugal na OCDE e no GATT.
E deputado da Nação por largo tempo e, como independente, em certo período. Deputado ao Parlamento Europeu em duas legislaturas, havendo presidido a uma das suas Comissões.
Consultor Principal no ITC (UNCTAD/GATT). Conselheiro no Comité Economico e Social Europeu, em representação da sensibilidade dos consumidores, ao longo de anos, com notáveis peças em delicados temas de sumo interesse em que interveio, de que se destaca o da Publicidade Infanto-Juvenil, em que se notabilizara como arauto de uma assepsia dos ordenamentos contra a exploração das camadas mais jovens, por inconfessáveis interesses do mercado que entenderam desde sempre envolvê-las para as fidelizar para as marcas e produtos . Mas também no que tange aos meios de resolução alternativa de conflitos, como na resolução em linha e em tantos outros temas como o do candente acesso ao crédito pelos consumidores.
Desempenhou ainda revelantes funções na administração de empresas públicas, como presidente da Companhia de Seguro de Créditos e ainda da Empresa Pública do Século e do Diário Popular.
Foi destacado membro da Administração da Alta Autoridade para a Comunicação Social, ao tempo, entidade reguladora da comunicação social, em Portugal.
Pertenceu aos quadros da Associação Portuguesa de Defesa do Consumidor e notabilizou-se pelas acções colectivas (inibitórias) sob o tema das condições gerais dos contratos / cláusulas abusivas, cujo patrocínio assegurara, rompendo quando lhe coarctaram a possibilidade de mover, como o pretendera,  dezenas de acções contra as seguradoras por mor dos interesses então supervenientes e em que de todo se não revia.
Homem de um rosto só, de firmes convicções, de recto agir, de valores que não dos interesses míseros e mesquinhos em redor dos quis outros gravitam ou em que vicejam…
A partir de então passou a colaborar intensamente com a apDC – DIREITO DO CONSUMO -, sediada em Coimbra, tendo desempenhado relevante papel ainda quando, em vésperas da constituição da AIDC – Associação Internacional de Direito do Consumo / IACL – International Association for Consumer Law, se associou ao I Congresso Europeu sobre Condições Gerais dos Contratos que, sob a égide da então Comunidade Económica  Europeia e do presidenteda sua Comissão, Jacques Delors, e de Mário Soares, presidente de Portugal, houve lugar em Coimbra, por iniciativa nossa, em Maio de 1988.
E, no plano da docência no ensino superior, desempenhou funções, como convidado, na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa e na Universidade Autónoma.
Desempenhou funções, ultimamente, como juiz-árbitro no Centro de Informação, Mediação, Provedoria e Arbitragem de Seguros, em Lisboa, após haver deixado o Comité Económico e Social Europeu, em que fora figura de proa e nele se destacara.
Foi ainda prelector em variadíssimos cursos de formação em Direito do Consumo, alguns dos quais promovidos pela apDC – Direito do Consumo, de Portugal.
Participou, como conferencista, em inúmeras manifestações científicas para que o convidáramos, sempre com uma visão diferente, crítica e recentrada das coisas em homenagem ao bem comum e, como primacial preocupação, a dos homens, mulheres e crianças do nosso tempo. Tanto em Portugal como no Brasil. A última das quais – XIII Jornadas Nacionais de Direito do Consumo, promovidas pela Delegação de Trás-os-Montes da apDC  (Prof.ª Rute Couto), em Junho do ano transacto,– sob o tema ‘Consumo Sustentável’ ( com uma notável intervenção acerca da “Transição Ecológica e Consumidores: algumas noções fundamentais”),  em que nos surpreendeu com uma crítica visão sobre as políticas de consumidores da União Europeia acantonadas na Nova Agenda Europeia do Consumidor (2021/25).
Colaborador permanente da RPDC – Revista Portuguesa de Direito do Consumo, editada em Coimbra, e da Revista Luso-Brasileira de Direito do Consumo, editada em Curitiba, concorrendo com os seus originais para o prestígio internacional de que gozam ambos os títulos.
Com uma obra original sobre conflitualidade de consumo, foi agraciado em 1998 com o Prémio Jacques Delors[“Conflitos de consumo : uma perspectiva comunitária de defesa dos consumidores / Jorge Pegado Liz.- [Lisboa] : Centro de Informação Jacques Delors, [1998] (Prémio Jacques Delors para o melhor estudo académico sobre temas comunitários)].
Autor de uma mancheia de obras  e de largas centenas de artigos em jornais e revistas nacionais e estrangeiras, é senhor de um enorme prestígio pelas teses originais que desenvolveu ao longos dos inúmeros anos que se consagrou a uma tal temática.
A apDC – DIREITO DO CONSUMO – Portugal, preparara um Livro de Homenagem a  Jorge Liz, há já tempo, para o que recolhera a colaboração de um sem-número de figuras públicas nacionais e internacionais. Com a crise que se declarara e tivera uma decisiva influência na subsistência da própria instituição, um tal preito de homenagem, com a merecida exteriozação pública, não se concretizou, afinal: seria uma surpresa, mas disso nos fizemos eco, a título de mero conforto, numa das derradeiras conversas que com ele mantivémos.
Não mais teremos a nosso lado quem tanto sabia estimular quantos – distraídos do mais – se votam a estas coisas a que poucos, muito poucos, conferem alguma importância!
Estamos, é facto, mais pobres:  no que isto, com efeito, representa para quem o tinha como oráculo no seu enciclopédico saber sobre estas coisas, como luzeiro, como norte!
Pretendeu, por último, transferir a sua preciosa biblioteca para a apDC, mas circunstâncias extraordinárias não permitiram o fizesse tempestivamente, relacionadas já com o seu precário estado de saúde.
Fica, pois, o nosso eterno reconhecimento!
Que repouse, enfim, o tribuno, o incansável arauto dos direitos dos consumidores por que pugnava incessantemente em Portugal, na Europa e no Mundo!
Jorge Liz, “requiescat in pace”!
Até à eternidade!

*Presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO – Portugal

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