quarta-feira, 13 de julho de 2022

A NOVA AGENDA EUROPEIA DO CONSUMIDOR A TRANSFORMAÇÃO DIGITAL


A transformação digital está a mudar radicalmente a vida dos consumidores, proporcionando-lhes mais oportunidades e uma escolha mais ampla de bens e serviços.

Ao mesmo tempo, pode dificultar a escolha informada e a salvaguarda dos seus interesses. A recolha e o tratamento de dados subjacentes, combinados com a análise do comportamento dos consumidores e dos seus preconceitos cognitivos, podem ser utilizados para influenciar os consumidores no sentido de tomarem decisões que podem contrariar o seu interesse superior.

Tal pode limitar a eficácia das actuais regras de protecção dos consumidores no ambiente digital, nomeadamente contra as práticas comerciais desleais.

A Directiva relativa à melhor aplicação e à modernização da legislação em matéria de defesa dos consumidores e a Directiva Conteúdos Digitais constituem passos importantes para dar resposta a alguns destes desafios.

Tendo em conta o ritmo acelerado do progresso tecnológico e o seu impacto na experiência dos consumidores, é necessário tomar medidas adicionais.

É necessário combater as práticas comerciais que não respeitam o direito dos consumidores a fazer uma escolha informada, que abusam dos seus preconceitos comportamentais ou distorcem os seus processos de tomada de decisão. Estas práticas incluem a utilização de padrões «obscuros», determinadas práticas de personalização frequentemente baseadas na definição de perfis, a publicidade oculta, as fraudes, a informação falsa ou enganosa e a manipulação das avaliações dos consumidores.

São necessárias orientações adicionais sobre a aplicabilidade de instrumentos de direito do consumidor como a Directiva Práticas Comerciais Desleais e a Directiva Direitos dos Consumidores a estas práticas. Em última análise, os consumidores devem beneficiar de um nível comparável de protecção e justiça em linha ou fora.

A fim de assegurar que os consumidores beneficiem plenamente do potencial significativo da transformação digital, os seus interesses devem ser tidos em conta na concepção ou na adaptação das regras que regem a economia digital.

O objectivo é duplo: criar um espaço digital mais seguro para os consumidores, onde os seus direitos sejam protegidos, e garantir condições de concorrência equitativas que permitam inovar e prestar serviços novos e de melhor qualidade a todos os europeus.

Em primeiro lugar, a futura proposta da Comissão Europeia de um novo acto relativo aos serviços digitais terá por objectivo definir novas responsabilidades e reforçar a responsabilização dos intermediários e plataformas em linha.

O novo acto assegurará a protecção efectiva dos consumidores contra os produtos, conteúdos e actividades ilegais nas plataformas em linha, tal como já sucede fora de linha.

Em segundo lugar, para resolver os problemas decorrentes das deficiências dos mercados digitais, tais como o poder de guardião de acesso detido por determinadas plataformas digitais, a Comissão tenciona apresentar também um acto relativo aos mercados digitais. Este combinaria a regulamentação ex ante das plataformas digitais que actuam como guardiães de acesso com um quadro dinâmico de investigação do mercado para examinar as deficiências dos mercados digitais.

Os consumidores serão os beneficiários finais de mercados digitais mais justos e contestáveis, incluindo preços mais baixos, serviços novos e melhores e uma maior escolha.

Embora a inteligência artificial (IA) possa trazer benefícios, algumas utilizações da IA podem violar os direitos dos consumidores e causar-lhes danos. Na sequência do seu Livro Branco sobre a IA e do relatório de acompanhamento sobre a responsabilidade e a segurança das novas tecnologias, a Comissão está a trabalhar:

§  numa proposta destinada a garantir um elevado nível de protecção dos interesses dos consumidores e dos direitos fundamentais, e a criar, por seu turno, a confiança necessária para a aceitação da IA pela sociedade;

 

§  no que respeita à responsabilidade civil, em medidas que visam garantir que as vítimas de danos causados pelas aplicações da IA têm, na prática, o mesmo nível de protecção que as vítimas de danos causados por outros produtos ou serviços.

O avanço das novas tecnologias e a globalização da produção e do comércio retalhista, nomeadamente através de canais em linha, levantam a questão de saber se as actuais regras de segurança dos produtos são suficientes para lidar com a evolução actual e proteger adequadamente os consumidores.

A Comissão está actualmente a trabalhar numa série de iniciativas relativas à segurança das novas tecnologias, tais como:

§  a revisão da Directiva Máquinas;

§  a adopção de actos delegados ao abrigo da Directiva Equipamentos de Rádio; e

§  a revisão da Directiva Segurança Geral dos Produtos.

A Directiva Segurança Geral dos Produtos, que estabelece o quadro jurídico para a segurança dos produtos de consumo não alimentares, foi aprovada quando os produtos com IA e os dispositivos conectados eram raros, situação que se alterou. Esta evolução põe em causa a actual definição de produtos e introduz novos riscos ou altera a forma como os riscos existentes se podem concretizar, o que deve ser analisado e tido em devida conta.

O crescimento das vendas em linha também coloca novos desafios, uma vez que as autoridades nem sempre dispõem de instrumentos suficientemente eficazes para a fiscalização dos mercados em linha. Além disso, o comércio electrónico permite que os consumidores comprem directamente aos operadores estabelecidos fora da UE, o que dificulta a verificação da segurança dos produtos que entram no mercado único.

A futura proposta de revisão da Directiva Segurança Geral dos Produtos, prevista ainda para 2021, deverá dar uma resposta consistente a estes desafios crescentes.

Além disso, uma identidade electrónica pública universalmente aceite – com base numa escolha dos consumidores, com seu consentimento e a garantia de que a sua privacidade é plenamente respeitada em conformidade com o Regulamento Geral sobre a Protecção de Dados (RGPD) – pode dar aos consumidores a possibilidade de gerirem o acesso e a utilização dos seus dados de forma totalmente controlada e segura. A Comissão está actualmente a rever esse sistema, tendo em conta o interesse e a protecção dos consumidores.

Para fazer face ao bloqueio geográfico injustificado, que discrimina os consumidores da UE em segmentos de mercado ao longo das fronteiras nacionais, a Comissão Europeia está actualmente a realizar a sua primeira revisão a curto prazo do Regulamento Bloqueio Geográfico.

A Estratégia Europeia para os Dados visa facilitar o direito efectivo dos indivíduos à portabilidade dos dados ao abrigo do RGPD. Este direito tem claramente potencial para colocar os indivíduos no centro da economia dos dados, permitindo-lhes mudar de prestador de serviços, combinar serviços, utilizar outros serviços inovadores e escolher os serviços que oferecem a melhor protecção de dados. A estratégia promoverá também a criação de um verdadeiro mercado único dos dados e a criação de espaços comuns europeus de dados.

Além disso, o sector dos serviços financeiros de retalho foi profundamente transformado pela transição digital, tendo introduzido novas tendências e soluções, e diversificado a oferta de produtos e serviços financeiros. Prestadores não tradicionais desses serviços – como as empresas de tecnologia financeira e os mutuantes de empréstimos entre particulares – juntaram-se aos fornecedores tradicionais, que também recorrem cada vez mais a canais de venda em linha. Novos produtos, como os empréstimos de curto prazo/custo elevado, que são concluídos por um curto período, mas que podem implicar custos significativos para o mutuário, são cada vez mais comercializados e vendidos por via digital.

As novas tecnologias, como as soluções de pagamento imediato, podem trazer benefícios tangíveis para os consumidores, mas podem exigir medidas específicas para os proteger. A Comissão anunciou recentemente iniciativas que irão melhorar a protecção dos consumidores em matéria de pagamentos. Estas questões serão analisadas no quadro da recentemente adoptada Estratégia para os Pagamentos de Pequeno Montante na UE.

A utilização de categorias alternativas de dados em combinação com a tomada de decisões automatizadas para a classificação de crédito levanta questões quanto aos dados que devem ser utilizados na avaliação da solvabilidade dos consumidores e destaca os riscos de discriminação decorrentes de decisões baseadas em algoritmos opacos, um tipo de risco susceptível de ser abordado também através do acto jurídico sobre os requisitos para a inteligência artificial acima referido.

Além disso, a legislação em vigor, como a Directiva Crédito ao Consumo, a Directiva Crédito Hipotecário, a Directiva Contas de Pagamento e a Directiva Comercialização à Distância de Serviços Financeiros, deve ser revista, a fim de reflectir a crescente utilização de meios digitais e dar resposta aos desafios supramencionados. Esta legislação deve permitir aos consumidores compreender os produtos e comparar e aceitar ofertas em linha, estimulando assim a inovação e a confiança dos consumidores.

 O novo pacote de financiamento digital da Comissão, que inclui as estratégias de financiamento digital e de pagamentos de pequeno montante e as propostas legislativas relativas aos cripto-activos e à resiliência operacional digital do sector financeiro, visa garantir que os consumidores e as empresas colhem os benefícios da inovação, mas mantêm-se protegidos.

Os actuais progressos em matéria de transformação digital serão igualmente reflectidos na estratégia para o investimento de retalho, que deverá centrar-se nos interesses dos investidores individuais e está prevista para o primeiro semestre de 2022.

Além disso, a transformação digital pode também trazer novos desafios como, por exemplo, as soluções digitais que não são igualmente acessíveis às pessoas com deficiência.

A Comissão apoia os Estados-Membros na transposição do Acto Europeu da Acessibilidade. A sua aplicação até 2025 ajudará a eliminar os desafios da digitalização para as pessoas com deficiência e aumentará a disponibilidade de produtos e serviços que lhes são acessíveis.

Por último, a transformação digital exige que os consumidores tenham uma forte literacia digital e competências digitais que devem ser promovidas através da educação e da formação numa perspectiva de aprendizagem ao longo da vida, como salientado no Plano de Acção para a Educação Digital 2021-2027 e nas suas prioridades estratégicas.

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