sexta-feira, 16 de abril de 2021

SE PRESCREVEU, ESTÁ PRESCRITO – é o dito, é o rito, é o que se ouve em grito!

 

A Águas do Alto Minho, S.A., que se substituiu aos municípios da região na gestão das águas, está apresentar aos consumidores facturas de anos recuados, cuja cobrança as câmaras terão negligenciado, o que está a gerar ali uma forte onda de protestos.

Será normal que facturas de há vários anos, que os consumidores nem sequer sabem já se terão pago ou não, se apresentem a pagamento?”

 

1.         A prescrição, nos serviços públicos essenciais, é de seis meses (Lei 23/96: artigo 10.º).

1.1.     prazo de prescrição conta-se da data do fornecimento, que corresponde ao da emissão regular da factura (de periodicidade mensal).

1.2.     Para que a prescrição possa valer, impõe-se que o consumidor a invoque, judicial ou extrajudicialmente. Sob pena de, em princípio, tal lhe não aproveitar (Código Civil: art.º 303).

2.         A prescrição de curto prazo, como é o caso, livra o consumidor do cumprimento judicial da dívida. A dívida extingue-se. Fica residualmente uma obrigação natural.

2.1.     E obrigação natural é a que se “funda”, como diz a lei, “num mero dever de ordem moral ou social, cujo cumprimento não é judicialmente exigível...”

2.2.     A prescrição libera, liberta o consumidor, por isso se diz que é liberatória. Extingue a dívida, que não poderá ser judicialmente exigível.

2.3.     É direito do consumidor. Não se trata de aproveitamento ilícito. É ditada por razões de segurança jurídica. Que se prendem, no caso, com o equilíbrio dos orçamentos domésticos. E para punir a inacção do fornecedor. Que dispõe de seis meses para cobrar voluntariamente ou propor a respectiva acção de dívida ou requerer a respectiva injunção.

3.         Para além da prescrição, importa referir ainda a figura da caducidade do direito do recebimento da diferença do preço (caso se facture menos que o consumido e se entenda recuperar, mais tarde, a diferença) que é também de 6 meses (Lei 23/96: n.º 2 do artigo 10.º)

4.         Independentemente destas duas figuras, a lei prevê inteligentemente que “ o prazo para a propositura da acção ou da injunção é de seis meses”.  Ou seja, institui aqui a figura da “caducidade do direito de acção”.

5.         Ora, a acção (ou a injunção) caduca, cai se proposta (requerida) para além dos seis meses do fornecimento do produto.

6.         E a caducidade é, neste passo, de conhecimento oficioso, isto é, deve o tribunal conhecê-la sem necessidade de invocação pelo interessado, pela conjugação de dois dispositivos da lei (Lei 23/96: art.ºs 10.º e 13.º).

7.         Se, proposta a acção (ou requerido o procedimento de injunção) mais de 6 meses após a prestação do serviço, o tribunal considera que a acção caiu, não pode naturalmente prosseguir, o que faz com que a prescrição deixe de ser invocada (porque só o seria na contestação ou oposição – a peça do processo ou procedimento em que o demandado deduz a sua defesa).

8.         A caducidade do direito de acção como que desconsidera a prescrição que, a não ser invocada, nem mesmo assim deixará de produzir os seus efeitos (ou seja, os da inexigibilidade judicial da dívida, limpando-a de todo, com o que se disse acerca da tal “obrigação natural”).

EM CONCLUSÃO:

1.         Decorridos seis meses sobre a regular remessa das facturas que correspondem ao período dentro do qual o fornecimento se processa, prescrevem as dívidas da água como dos demais serviços públicos essenciais, em que se conta a água.

2.         Subsiste uma residual obrigação natural, por não poder ser judicialmente exigível a dívida prescrita.

3.         A remessa de facturas com dívidas prescritas, sem mais, como se as dívidas fossem judicialmente exigíveis,  constitui acto em patente  má-fé, proibido por lei e susceptível de impor uma indemnização ao consumidores pelos danos daí decorrentes.

 

Mário Frota

apDC – DIREITO DO CONSUMO - Coimbra

 


Projecto com o apoio do Fundo do Consumidor

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