Para que o
domínio do DIREITO
Seja Deveras
Compensador
E não se
ludibrie de qualquer JEITO!
(Adaptação
parcial do escrito hoje publicado, no Brasil. no Portal do PROCON RS, de Porto
Alegre)
A informação
constitui direito fundamental do consumidor com expressão em múltiplos
preceitos das leis ordinárias.
A
preocupação pelo domínio pelos consumidores dos seus direitos sobressai de
inúmeros instrumentos normativos, seja com a chancela do Parlamento Europeu
seja com a do Parlamento português e do seu Governo, no quadro da sua
competência legislativa regular.
Direito que
se não conhece não se actua.
Direito que
se domina permite se evite uma conflitualidade doentia, mórbida, que a ninguém
aproveita.
Não vale, na
circunstância, a máxima - feita norma – de que “a ignorância da lei a ninguém
aproveita nem isenta das sanções nela cominada”!
Não isenta
das sanções nem propicia os benefícios que nela se atribuam.
E o drama
põe-se exactamente aí.
E, no entanto,
de tão complexo é o ordenamento jurídico do consumidor que o legislador europeu
insiste, em ensejos distintos, de que os Estados-membros devem pelos meios ao
seu alcance proporcionar ao consumidor um efectivo conhecimento do acervo de
direitos que se lhe reconhecem.
Vem isto a
propósito da ignorância revelada pelos empresários com carta para comerciar que
continuam a oferecer, como garantia legal dos bens móveis de consumo dois anos,
que não os três da lei que entrou em vigor no dia 1.º de Janeiro do ano em
curso.
No plano das
garantias dos bens de consumo, a Directiva 1999/44, de 25 de Maio, do
Parlamento Europeu e do Conselho de Ministros, que vigorou até 31 de Dezembro
de 2021, impunha no seu artigo 9.º, aos Estados-membros que
“[tomassem]
as medidas necessárias para informar o consumidor sobre as disposições
nacionais de transposição da presente directiva, e [incentivassem],
eventualmente, as organizações profissionais a informarem os consumidores dos
seus direitos.”
Ora comete,
em certa medida também, às associações de interesse económico, representativas
dos comerciantes, um tal poder-dever:
que as
instituições de empresários assumam a obrigação de informar o consumidor do seu
direito.
A lei de
transposição de uma tal Directiva para o ordenamento jurídico pátrio (DL
67/2003, de 08 de Abril), sob a epígrafe “acções de informação”, define
expressamente, no seu art.º 12, que
“A
Direcção-Geral do Consumidor deve promover acções destinadas a informar e deve
incentivar as organizações profissionais a informarem os consumidores dos
direitos que para eles resultam do presente decreto-lei.”
E, com
efeito, ao tempo (com uma versão actualizada em Janeiro de 2009), veio a lume,
sob os auspícios do Instituto do Consumidor, mais tarde, Direcção-Geral do
Consumidor, um opúsculo com 65 páginas, que em pormenor contempla o regime
adoptado.
Mas não nos
démos conta de acções, tanto quanto a memória no-lo consente, de acções no
terreno, a não ser as que em inúmeras ocasiões a apDC – DIREITO DO CONSUMO -,
de Portugal, em particular, a seu modo e com recursos próprios, levou a cabo
através dos seus especialistas, de Norte a Sul do País, para além da divulgação
extra muros.
Ou então em
projectos de informação, mal apoiados pelo Fundo do Consumidor (com dotações
mais que insuficientes a tal consignadas), pela apDC desenvolvidos, mas em
conjunção de matérias que corriam em paralelo com as que das garantias dos bens
relevavam.
A Directiva
(2019/771/UE), de 20 de Maio de 2019, que revoga, no acervo da União Europeia,
o precedente instrumento normativo de 25 de Maio de 1999, reitera, no seu
artigo 20, um tal comando, a saber:
“Informação
do Consumidor"
“Os
Estados-membros tomam medidas adequadas para assegurar que a informação sobre
os direitos dos consumidores ao abrigo da presente directiva e sobre os meios
para a aplicação desses direitos esteja à disposição dos consumidores.”
Claro que se
parte do pressuposto que os empresários se acham despertos para as inovações
legislativas, ao invés do que ocorre, em geral, com os consumidores. E se
centra a tarefa na dilucidação dos consumidores. Sem se ignorar que os
empresários o são, ou seja, também se revêem na condição e no estatuto do
consumidor.
Mas, pelos
vistos, aos comerciantes terá escapado a mudança e, de forma acrítica,
socorrem-se de ‘sites’ oficiais, a seu modo, sem referências temporais e, nessa
medida, borregam, incumprem a lei, a lei nova, no que os seus preceitos
inovadores, passe a redundância, se apartam dos velhos cânones.
O que é, a
todos os títulos, uma lástima!
O preceito
de que se trata (o artigo 20 da Directiva que contempla alguns aspectos da
compra e venda dos bens de consumo e dispõe sobre a garantia de tais bens) tem
a sua correspondência na Lei Nova (DL 84/2021, de 18 de Outubro, que entrou em vigor
no dia 1.º de Janeiro de 2022), que procede à transposição para ordem jurídica
interna do aludido acervo normativo mais o que se prende com os contratos de
fornecimento de conteúdos e serviços digitais
Com efeito,
no seu artigo 50 e sob a epígrafe “Capacitação dos consumidores”, se dispõe:
“A
Direcção-Geral do Consumidor promove acções destinadas a informar os
consumidores sobre os direitos resultantes do presente decreto-lei e os meios
adequados ao seu exercício, em articulação com as demais entidades
competentes.”
Com efeito,
a “longa manus” do Governo para a política de consumidores – a Direcção-Geral
do Consumidor – até promoveu algumas acções de divulgação no período
imediatamente anterior ao da entrada em vigor da lei.
Mas nem
todos terão assistido a tais sessões, em número limitado e, provavelmente, sem
adequada divulgação.
E difundiu
uma página com perguntas e respostas que se acham no seu “site”.
É natural
que seja insuficiente.
Mal se
percebe, no entanto, a razão por que empresas - que ora se socorrem das vias do
comércio electrónico para a venda de aparelhos electrónicos - continuem, após o
1.º de Janeiro em curso, a ofertar como garantia legal os dois (2) anos quando
a Lei Nova estabelece algo de distinto, a saber,
§ para as coisas móveis duradouras
(novas) três (3) anos;
§ para as coisas móveis
recondicionadas três (3) anos;
§ para as coisas móveis usadas três
(3) anos, conquanto, por acordo, tal possa descer, nunca abaixo, porém, dos 18
meses.
Tamanha
distracção de uma mancheia de empresas, tal como pessoalmente o detectámos, é
algo de profundamente reverberável e parece não merecer qualquer
condescendência.
E quando
lhes pretendemos apontar o lapso, o erro crasso em que laboram, tais empresas
levam a sua ousadia ao ponto de tenderem a corrigir-nos, remetendo-nos para
“sites” desactualizados (e que, entretanto, se não actualizaram) que, com
efeito, contêm disciplina só aplicável às aquisições feitas até 31 de Dezembro…
A Lei Nova,
que alarga o quadro dos ilícitos de mera ordenação social a situações lesivas
dos direitos e interesses dos consumidores, não contempla, ao que parece, esta
violação como credora de uma qualquer coima (sanção em dinheiro) e
eventualmente das inerentes sanções acessórias.
Mas há que
alertar os consumidores para a afectação da garantia abaixo da legal, o que
leva uma tal cláusula contratual à nulidade, invocável a todo o tempo e por
qualquer interessado e a ser conhecida ex officio (por dever de ofício) pelos
tribunais.
A quem
aproveita, pois, a ignorância da lei? Neste passo nem sequer se fala de má
interpretação… É questão de um prazo de duração, que fora de dois (2) e passou
a três (3) anos.
A quem
aproveita, então, a ignorância da lei?
"Garantia
coxa deixa, no caso, toda a gente roxa"… Roxa de cólera!
A quem
aproveita, pois, a ignorância da lei?
Os mais
distraídos ficarão com uma garantia menor, se acaso comprarem e, por
ignorância, nada reivindicarem.
Nestas
situações, beneficiam os fornecedores relapsos e contumazes que lucram na
exacta medida em que os consumidores perdem. E lucram mais que
proporcionalmente, como se compreenderá!
Urge que a
Autoridade de Regulação do Mercado “varra” de alto a baixo as redes e actue
contra tais empresas.
Em boa
verdade…
Mário Frota
Presidente
emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal