apDC - associação portuguesa de Direito do Consumo esteve em direto.
Direito do Consumo
Garantias legais: coisas móveis
Prof. Mário Frota responde (...)
Direito do Consumo
Garantias legais: coisas móveis
Prof. Mário Frota responde (...)
“Levei um equipamento, no período da garantia, à empresa em que o adquiri: funcionamento sumamente deficiente, a não proporcionar temperaturas de conforto, contra o que seria normal.
Surpreendeu-me o facto de me dizerem com toda a convicção que não poderia pretender a troca do aparelho, que teria de ir para a fábrica para reparação. Só se a reparação fosse inviável é que se pensaria na troca. Será assim?”
Cumpre apreciar a situação descrita para, de seguida, nos pronunciarmos sobre a justeza dos seus termos.
Em caso de não conformidade da coisa com o contrato, os remédios que a lei prevê são os da:
. reparação
. substituição
. redução adequada do preço
. extinção do contrato (com a devolução da coisa e a restituição do preço).
A opção pelo remédio é direito do consumidor. Não do fornecedor.
Com um limite, porém: “salvo se tal for impossível ou constituir abuso de direito”.
E o que é, afinal, o abuso de direito?
Diz a lei que “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito.”
Se a o “defeito” for de pouca monta, susceptível de reparação, excede o seu direito quem pretenda intolerantemente a troca ou a extinção do contrato.
Se o carro novo tiver uma escova do pára-brisas deficiente, não se afigura lícito exija o consumidor a substituição do veículo. Menos ainda que ponha termo ao contrato.
Se se tiver partido uma das rodas do aspirador, a simples substituição poderá ser abusiva: basta que se substitua a peça avariada. E, assim, sucessivamente...
E não há que obedecer a nenhuma graduação ou hierarquização dos remédios. Ou seja, não se começa por uma tentativa de reparação que, a não ser bem sucedida, obrigue à substituição e, só no limite, vencida toda a escala, é que se porá termo ao contrato.
Ao contrário do que entendeu já o Supremo Tribunal de Justiça pelo punho do Conselheiro Fonseca Ramos (13 de Dezembro de 2007), menos adequadamente, porém:
“O comprador de coisa defeituosa pode, por esta ordem, exigir do fornecedor / vendedor:
1.º - a reparação da coisa;
2.º - a sua substituição;
3.º - a redução do preço ou a resolução do contrato, conquanto exerça esse direito, respeitando o prazo de caducidade - art.º 12.º da LDC.”
Recentemente, da Relação de Guimarães, por acórdão de 20 de Fevereiro de 2020, votado por unanimidade, pela pena do desembargador Jorge Teixeira decretou, à revelia de uma fidedigna interpretação das regras e da doutrina, considerada, a todas as luzes, consentânea com o sentido e alcance da lei, algo de estranho:
I – “Os direitos à reparação ou à substituição previstos no artigo 914 do Código Civil – e também no artigo 12, n.º 1 da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho, que veio estabelecer «o regime legal aplicável à defesa dos consumidores» – não constituem pura alternativa ou opção oferecida ao comprador, antes se encontrando subordinados a uma sequência lógica.
II – Assim, o consumidor tem o poder-dever de seguir primeiramente e, preferencialmente, a via da reposição da conformidade devida, pela reparação ou substituição da coisa, sempre que possível e proporcionada, em nome da conservação do negócio jurídico, tão importante numa economia de contratação em cadeia, e só subsidiariamente o caminho da redução do preço ou resolução do contrato.
III – Isto porque, embora a lei (art.º 5.º do DL n.º 67/2003 ) não hierarquize os direitos conferidos ao consumidor, numa interpretação conforme a Directiva (Directiva nº 1999/44/CE, de 25/05 ), há prevalência da “reparação/substituição” sobre o par “redução/resolução”, pois a concorrência electiva dos diversos direitos do consumidor não é absoluta, por não prescindir de uma “aticização da escolha” através do princípio da boa-fé, sendo que o art.º 4º nº 5 do diploma citado recorre à cláusula do abuso de direito.”
("Aticização" ou "eticização"? É que "aticização" se prende com a "elegância e delicadeza (de estilo)", distinta decerto da "eticização", conduta regida por princípios éticos aparelhados, isso sim, pela cláusula geral da boa-fé.)
["Aticismo", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2021, https://dicionario.priberam.org/aticismo (consultado em 02-12-2021)].
[Esqueceu-se o ilustre Magistrado (mais os seus pares) que a directiva é minimalista, consentindo uma tutela mais protectiva dos consumidores e que os direitos anteriormente consignados na LDC o eram já, nesse particular, mais vantajosos que os que a directiva europeia veio a consagrar]* .
Ao invés, Gaito das Neves, da Relação de Évora, pôs os pontos nos ii, ao dizer:
“Resulta do artigo 12 n.º 1 da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho, que perante a venda de uma coisa defeituosa, o consumidor pode escolher o remédio que mais lhe convém, sem qualquer ordem sucessória: a reparação da coisa, a sua substituição, a redução do preço, a resolução do contrato.”
Aliás, o Conselheiro João Camilo, por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05 de Maio de 2015, numa sucessão de reparações sem êxito, admitiu – e bem - que o consumidor podia desde logo fazer cessar o contrato sem roçar o “abuso do direito”:
“ Tratando-se de compra e venda de um automóvel novo de gama média / alta que após várias substituições de embraiagem, de software e de volante do motor, continuava a apresentar defeitos na embraiagem, pode o consumidor recusar nova proposta de substituição de embraiagem – a terceira – e requerer a resolução (extinção) do contrato, sem incorrer em abuso de direito.”
Abusa do direito, isso sim, o fornecedor que esgrime com o consumidor os remédios, impondo uma reparação quando o consumidor pretende fundadamente a substituição ou o fim do contrato com as consequências daí resultantes.
Quer-se crêr que por ignorância dos gestores e deficiente preparação dos trabalhadores, vêm sendo denegados direitos com consequências sumamente gravosas para os consumidores.
Seria conveniente se preparassem adequadamente para bem poderem servir os clientes.
(Agora à Luz da Lei Nova)
As coisas mudarão, porém, em relação aos novos contratos, no dia 1.º de Janeiro de 2022.
A Lei Nova (DL 84/2021, de 18 de Outubro) estabelece, com efeito, que
"O consumidor pode escolher entre a reparação ou a substituição do bem, salvo se o meio escolhido para a reposição da conformidade for impossível ou, em comparação com o outro meio, impuser ao [fornecedor] custos desproporcionados, tendo em conta todas as circunstâncias, incluindo:
a) O valor que os bens teriam se não se verificasse a falta de conformidade;
b) A relevância da falta de conformidade; e
c) A possibilidade de recurso ao meio de reposição da conformidade alternativo sem inconvenientes significativos para o consumidor” (n.º 2 do art.º 15).
O [fornecedor] pode recusar repor a conformidade dos bens se a reparação ou a substituição forem impossíveis ou impuserem custos que sejam desproporcionados, tendo em conta todas as circunstâncias, incluindo as que são mencionadas nas alíneas a) e b) do número anterior (n.º 3 do art.º 15).
Já do preâmbulo da Lei Nova ressalta exactamente a noção de que se operou uma inversão na não hierarquização dos remédios:
"Ao contrário do previsto no Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, na sua redacção actual, que não estabelecia qualquer hierarquia de direitos em caso de não conformidade dos bens — reconhecendo ao consumidor um direito de escolha entre a reparação do bem, a substituição do bem, a redução do preço ou a resolução do contrato — o presente decreto-lei incorpora a solução da Directiva que aqui se transpõe, a qual prevê os mesmos direitos, embora submetendo-os a diferentes patamares de precedência. Trata-se, pois, de matéria sujeita ao princípio da harmonização máxima, que impede o legislador nacional de divergir da norma europeia.
Neste enquadramento, em caso de não conformidade do bem, o consumidor tem o direito à «reposição da conformidade», através da reparação ou da substituição do bem, à redução do preço e à resolução do contrato, estabelecendo-se as condições e requisitos aplicáveis para cada um destes meios."
Por conseguinte, o espírito do acórdão, em rigor desajustado no momento em que o ilustre magistrado o lavrara, acaba por transluzir o que da Lei Nova emerge (sem que eventualmente o suspeitasse e, menos ainda, o lobrigasse no corpo e no regime da directiva de que procede a lei que vigorará a partir de Janeiro p.º f.º).
Que se registe o facto.
Mário Frota
apDC – DIREITO DO CONSUMO - Coimbra
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* Do preâmbulo do DL 67/2003, que transpôs a Directiva 1999/44/CE, consta, designadamente, e tal parece escapar aos julgadores:
"Preocupação central que se procurou ter sempre em vista foi a de evitar que a transposição da directiva pudesse ter como consequência a diminuição do nível de protecção já hoje reconhecido entre nós ao consumidor. Assim, as soluções actualmente previstas na Lei n.º 24/96, de 31 de Julho, mantêm-se, designadamente o conjunto de direitos reconhecidos ao comprador em caso de existência de defeitos na coisa."
Instantâneo colhido por Pedro Gomes, advogado e antigo aluno.
Esta cara de espanto só pode ter origem na Garantia dos Imóveis, tal como o legislador a configura! Não pode ser outra coisa!
Apreciada a factualidade, cumpre emitir opinião:
1. Contrato de locação financeira é o contrato pelo qual uma das partes se obriga, mediante retribuição, a ceder à outra o gozo temporário de uma coisa, móvel ou imóvel, adquirida ou construída por indicação desta, e que o locatário poderá comprar, decorrido o período acordado, por um preço nele determinado ou determinável mediante simples aplicação dos critérios nele fixados.”
2. A Lei da Locação Financeira (LLF) diz, porém, no seu artigo 14 (sob a epígrafe “despesas”) que “salvo estipulação em contrário, as despesas de reparação do bem locado… ficam a cargo do locatário”: no silêncio do contrato (a não houver cláusula em contrário) as despesas de reparação, por exemplo, ficariam, pois, a cargo do locatário-consumidor.
3. Tal disposição da LLF esbarra na Lei das Garantias dos Bens de Consumo (LGBC), aplicável também à locação: “[A lei] é, ainda, aplicável, com as necessárias adaptações, aos bens de consumo fornecidos no âmbito de um contrato de empreitada ou de outra prestação de serviços, bem como à locação de bens de consumo” (DL 67/2003: n.º 2 do art.º 1.º - A).
4. No entanto, a haver eventual colisão de normas prevalecem sempre as da LGBC de 2003 sobre as da LLF que remonta a 1995.
5. A LGBC prevalece, designadamente, no silêncio do contrato quanto a despesas de reparação do bem enquanto a relação contratual durar, tanto mais que, em contraponto com a LLF, a Lei das Garantias reveste natureza imperativa [contra a natureza supletiva (que só se aplica se os contraentes não pactuarem outra coisa) da LLF].
6. Sob a epígrafe “imperatividade” estabelece o art.º 10.º da LGBC que “sem prejuízo do regime das [condições gerais dos contratos], é nulo o acordo ou cláusula contratual pelo qual antes da denúncia da falta de conformidade ao vendedor se excluam ou limitem os direitos do consumidor...”
7. Operando-se a transmissão da propriedade da coisa para o locatário-consumidor, as regras que conformam a LGBC aplicar-se-ão sem excepção: tratando-se de coisa móvel usada “o prazo de dois anos de garantia” pode ser reduzido a um ano por acordo das partes (DL 67/2003: n.º 2 do art.º 5.º).
8. E, ainda no quadro da lei actual, a não conformidade terá de ser denunciada ao locador-vendedor no lapso de sessenta dias e o prazo para o exercício de qualquer dos direitos conferidos (reparação, substituição, redução adequada do preço ou extinção do contrato com justa causa, com a devolução da coisa e a restituição do preço) é de dois anos.
9. Nos termos da lei ainda em vigor, não há qualquer hierarquia rígida na adopção dos (ou no recurso aos) enunciados remédios (primeiro a reparação, depois a substituição se, entretanto, a reparação for excessivamente onerosa ou se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, e por aí em diante…).
10. Por conseguinte, não há, na circunstância, qualquer objecção, pelo contrário, a que se aplique a LGBC (em vigor à data em que houver de recorrer aos seus termos) numa locação-venda, tão logo a transmissão da propriedade da coisa, por meio do contrato de compra e venda, venha a ocorrer: donde, ter de ser assegurada a garantia de dois (2) anos, como se de bem usado se tratasse (como é o caso), podendo por acordo fixar-se tal garantia até 1 ano.
EM CONCLUSÃO:
a. A LGBC aplica-se também à Locação Financeira.
b. Mesmo no silêncio do contrato, i. é, se não houver cláusula em contrário, é ao locador que compete assegurar a conformidade do bem, não sendo lícito transfira tal responsabilidade, nos termos da garantia legal, para o locatário-consumidor
c. Em caso de venda do bem locado, o locador-vendedor tem de assegurar a garantia legal, sem mais, ou negociá-la com o locatário-comprador até 1 ano.
Mário Frota
Presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal
O Centro Hospitalar de Leiria (CHL) tem um novo angiógrafo digital já em funcionamento no Serviço de Imagiologia no Hospital de Santo André (HSA), em Leiria, um investimento no valor de cerca de 800 mil euros.
De acordo com o diretor do Serviço de Imagiologia, Vítor Pardal, “a mais recente aquisição, um angiógrafo de última geração, que substituiu o equipamento já descontinuado, vai não só permitir a realização de estudos de patologia hepato-bilio-pancreática com elevada qualidade, assim como a realização de todos os estudos vasculares, quer na área da Radiologia quer na Neurorradiologia”.
Este investimento permitirá também implementar alguns atos de radiologia de intervenção como, por exemplo, “alguns tipos de biópsias, embolizações vasculares e outras, assim como a manutenção da atividade da gastroenterologia, nomeadamente no que refere à Colangiopancreatografia Retrógrada Endoscópica (CPRE), exame que envolve parte do sistema digestivo que inclui a vesícula biliar, o pâncreas e os canais que drenam estes órgãos, bem como o fígado”, afirma ainda o responsável.
Após 18 meses a viver uma situação de pandemia COVID-19, justifica-se uma reflexão sobre aquelas que foram as implicações nas infraestruturas e tecnologias da saúde, muito especificamente no que se refere à área de projecto de instalações de aquecimento, ventilação e ar condicionado (AVAC), resultado da experiência adquirida com base nas que foram as principais solicitações no desenvolvimento de projectos nesta área, ao longo destes meses.
Em qualquer epidemia o conhecimento das
vias de transmissão do agente infeccioso é essencial no combate à sua
transmissão. Especificamente no caso do SARS-CoV-2, por se tratar de um
vírus novo, houve e continua a haver muitas incertezas, não só sobre as
vias de transmissão, mas também sobre os riscos de dispersão que lhes
estão associados e sobre quais as medidas que mais eficazmente podem
mitigar esses riscos. Pode dizer-se que foram inicialmente identificadas
duas vias de transmissão principais: (1) transmissão directa através de
gotículas grosseiras produzidas quando se fala, tosse ou espirra, entre
pessoas próximas, a 1 ou 2 metros de distância; (2) transmissão
indirecta também através de gotículas grosseiras produzidas quando se
fala, tosse ou espirra, que se depositam em superfícies e objectos
próximos. Ler mais
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