António da Costa Neves Ribeiro, Procurador-Geral Adjunto da República, mais tarde Conselheiro e Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, quando professor da Escola Superior de Polícia, hoje, Instituto Superior de Ciências Policiais e de Segurança Interna, entendia que os candidatos a oficiais de Polícia teriam de ter fortes noções de Direitos Humanos e de a praticar no seu quotidiano, quando em funções.
Parece-nos elementar. E a disciplina foi introduzida e toda uma vertente cívica se incutiu na formação dos jovens que iriam constituir um novo Corpo de Polícia.
Parece básico, mas os professores devem ter também noções consolidadas de Direitos Humanos, de Direitos Fundamentais, de Direitos de Cidadania, de Direitos Cívicos.
Para que possam tratar os alunos, os estudantes, consoante os ramos e graus de ensino, de harmonia com todo esse precipitado de normas, que é questão de postura cívica perante cada um e todos.
Quando uma Universidade (ou algo de equiparado) se furta a conceder aos seus estudantes o direito de impugnação das classificações e age despótica e autocraticamente, é patente o desvio das garantias mais elementares que assistem naturalmente aos estudantes.
E o facto correu recentemente no Instituto Superior Egas Moniz, do Monte da Caparica, a saber, o da recusa da entrega de uma prova por parte de uma professora e da Direcção da Escola e da Reitoria, já que o aluno contemplado com um zero pretendia ter acesso à prova para impugnar a classificação, uma vez que precisava, ao que se dizia, de apenas quatro valores para se fazer aprovar na cadeira e concluir a licenciatura e tinha a consciência de que fizera algo a merecer uma classificação superior.
O caso até teve de ir ao Tribunal de Almada, tal a resistência das “autoridades” académicas que se expuseram à devassa pública de um simples acto de gestão escolar e de afronta a elementares garantias que há que reconhecer aos discentes.
O facto, ainda que noutro quadrante, permite recordar um professor de uma das faculdades, em Coimbra, que enchia a boca com o direito de personalidade, arvorava-se em defensor dos direitos humanos, anuiu expressa e publicamente à pena de morte decretada contra mercenários em Angola, mas massacrava os estudantes com a tortura das provas orais, marcava as provas para as nove da manhã, mas deixava-os derreter perante tremenda ansiedade, iniciando as orais às dez da noite e prolongando-as noite dentro, numa hipocrisia e num despotismo sem limites…
É como se não tivéssemos abandonado um qualquer regime ditatorial: o do “posso, quero e mando”… à mercê de uma qualquer “autoridade” académica!
50 anos após Abril não se pode admitir este tipo de comportamentos.
Quando, no ensino secundário, no termo de uma prova em que os alunos foram deslocados dos seus lugares, como garantia para a docente de que não copiariam uns pelos outros e uma aluna, finda a prova, deixa o ponto na carteira e se dirige à carteira de origem para recuperar os seus pertences, é advertida em altos berros que esteve a copiar e se lhe exige que mostre as cábulas, é algo de deixar o mais pintado “encabulado”, vexado, exposto ao opróbrio
A aluna, inocente, protestava que não tinha cábulas, foi revistada na presença de todos. Atingida na sua dignidade. As crianças têm dignidade. Talvez nem todos saibam. Mas é algo que não pode escapar a um docente, seja de que ramo ou grau de ensino se trate.
Não se trata de exacerbar direitos.
Trata-se de exigir urbanidade aos professores, que têm de primar pelo exemplo.
Trata-se de exigir que respeitem a dignidade dos alunos, os seus direitos de personalidade, que os não belisquem, que os não deixem em situação de vergonha pública, de vexame, de aviltamento.
A honestidade começa aí.
É como se se afivelasse um rótulo de desonra, se grudasse à criança, à jovem uma nota de desonestidade, de falha de carácter, expondo-a à exprobação da turma.
E depois do acto, que engenho e arte para se repor a coisa no são!
O estigma permanece, a dúvida instila-se, o aguilhão continua a ferir…
É como as revistas por suspeitas nos super e hipermercados, com alarido, a inocentes (e ainda que de não inocentes se trate…) em que as pessoas vêem a sua honorabilidade manchada por gestos menos reflectidos e expostas à reverberação das que circunstancialmente se acham em derredor do lugar em que tal ocorre.
Os professores têm de ter cuidados redobrados na educação dos que se lhes confiam, não se podem permitir desvios de tamanha magnitude, não podem vexar, degradar, diminuir, estigmatizar.
Perante a turma ficou demonstrada a inocência da criança, da jovem, mas as marcas permanecem, as dúvidas assaltam, os dichotes soltam-se…
E, no entanto, manchou-se a reputação de um inocente! Por quem deveria formar, mas deforma com atitudes ínvias, desenquadradas, aviltantes.
Ao Ministério da Educação e às escolas onde se formam professores, encham-nas de disciplinas de direitos de personalidade, de direitos das crianças, de direitos dos escolares, de direitos humanos, a ver se se tira o ranço da impreparação de que dão mostras alguns e se se reconduzem aos são propósitos de convivência com os alunos, com os estudantes, numa sociedade de iguais em que o respeito recíproco se tem de cultivar incessantemente, à exaustão!
Que fique o registo para que a impunidade não subsista.
Tão reprováveis são atitudes do jaez destas como as dos pais que, sem justificação aparente ou real, invadem as escolas desabridamente e tiram desforço de professores inocentes, vítimas também de escolares menos probos, menos honestos nos comentários que provocam o azedume de pessoas naturalmente perturbadas, mas que descarregam as suas iras sobre os professores.
Reflexão é o que se exige a todos e a cada um!
E respeito! Que não o convencional “respeitinho”, sinal de subserviência e de sujeição!
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal
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