quarta-feira, 10 de julho de 2024

TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA Acórdão de 29 de Março de 2007


Relator: Des. Granja da Fonseca

 SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS

FACTURAÇÃO POR ESTIMATIVA

Sumário:            

1 - Tratando-se de um serviço público essencial, como é a água, incumbe ao prestador do serviço o dever de informação das condições em que o serviço de fornecimento desse bem é realizado e a prestação de todos os esclarecimentos que se justifiquem de acordo com as circunstâncias, sendo que esse dever contempla, sobretudo, a disponibilização de uma facturação detalhada, pois que apenas assim é possível que o utente verifique a aplicação concreta do tarifário por parte do prestador do serviço.

2 - Por conseguinte, impende sobre o prestador de serviços o ónus de demonstrar o cumprimento de todas as obrigações decorrentes da celebração de um contrato de um bem essencial, designadamente, a obrigação de apurar os consumos reais de água gasta pelo utente e a obrigação de o informar do valor do consumo real por ele efectuado.

3 - Logo, não obstante se tenha tornado prática corrente a facturação baseada em meras estimativas de consumo, continua a impender sobre o prestador de serviços a obrigação de disponibilizar aos seus utentes uma facturação detalhada do consumo real efectuado e do preço devido por aquele mesmo consumo.

4 - Donde, no caso concreto, cabia à autora, na qualidade de prestadora de serviços de bens essenciais, demonstrar que cumpriu todas as obrigações decorrentes do contrato celebrado com o apelado, entre as quais a obrigação de proceder à leitura do consumo efectivo de água na sua residência, cabendo ainda à apelante demonstrar, atentas as regras do ónus da prova e os mecanismos legais de protecção dos consumidores, que o não cumprimento de tal obrigação não resultou de culpa sua.

5 - Não existe um dever do consumidor comunicar a leitura à fornecedora, nem de se certificar que tal leitura é efectuada periodicamente, não obstante a prestadora colocar à disposição do consumidor variados meios para facilmente efectuar a comunicação, pois a obrigação de apurar os consumos reais é do prestador do serviço e não do utente; a modalidade de cobrança do consumo por mera estimativa reverte em benefício da entidade cobradora, e não o inverso.

6 - Donde, a ausência para a realização de leituras por parte da EPAL consubstancia uma verdadeira falha do prestador do serviço.

7 - A impossibilidade de se fazer a rigorosa correspondência temporal entre as diferenças de consumo apuradas e os pagamentos (por estimativa) inferiores que foram sendo feitos pelo réu resulta da metodologia – a estimativa – adoptada pela autora durante mais de três anos, pelo que não recai sobre o réu o ónus de demonstrar quais as datas em que havia efectuado pagamentos inferiores aos consumos realmente efectuados até essas mesmas datas.

8 - Logo, a caducidade do direito da autora ocorreu por erro seu uma vez que não procedeu à leitura do contador da água existente na residência do réu senão decorridos cerca de quarenta meses após a última leitura, sendo certo que a realização atempada das leituras teria permitido não só apurar o consumo real de água, mas também a sua liquidação em prazo razoável para o efeito.

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