Nem as cláusulas leoninas têm
que ver com Alvalade nem as draconianas com os ares que sopram do Complexo
Desportivo do Dragão.
Cláusulas leoninas são as que,
predispostas em regra unilateralmente por um dos contraentes em posição
dominante no mercado sem que possam ser objecto de negociação ou modificação, geram
profundos desequilíbrios em detrimento do contraente economicamente mais débil,
mais vulnerável, em princípio, o consumidor. Mas vale também nas relações
empresariais em que um dos contraentes dispõe de “argumentos” que os mais nem
sequer lhes “chegam aos calcanhares”.
A sua origem se acha numa fábula
de Esopo: um cavalo, uma cabra e uma ovelha celebraram um acordo com um leão
para apanharem um veado. Caçada finda, partiram-no em quatro para
equitativamente cada um se prevalecer de uma das partes. Pura ilusão! O leão
adiantou-se e sentenciou: a primeira parte é minha, pois é meu direito como
leão; a segunda me pertence porque sou mais forte que vós; a terceira também me
cabe porque trabalhei mais que qualquer um; e quem tocar a quarta me terá como
inimigo! De tal sorte que tomou todo o veado para si e os mais “ficaram a ver
navios”!
Drácon, legislador ateniense,
recebeu em 621 a.C. poderes extraordinários para pôr fim a um conflito social
provocado por um golpe de estado de que resultou o exílio do vencido.
Incumbido pelos atenienses de
preparar um código de leis escritas (até então orais), Drácon elaborou um rígido
código de leis baseadas em normas costumeiras arbitradas por juízes.
A severidade do código fez com
que o adjectivo draconiano (do francês draconien) chegasse à posteridade como
sinónimo de desumano, excessivamente rígido ou drástico.
Ora, as cláusulas leoninas,
draconianas, exorbitantes (como as denominam os italianos) ou abusivas (como se
exprimem os franceses) continuam a povoar, entre nós, os contratos de adesão.
E nem os contratos submetidos
pela banca e pelos seguros, nem os das instituições financeiras para aquisições
a crédito, nem os das empresas de locação de veículos, nem os dos ginásios nem
de outros operadores económicos se vêm livres de tais empecilhos que constrangem
o quotidiano dos consumidores que a tais fornecedores recorrem.
E não há sinais nem da
Comissão das Cláusulas Abusivas (abreviando) nem dos Reguladores a que
incumbiria, em princípio, a análise prévia ou sucessiva dos formulários de
adesão submetidos pelos regulados, fora da órbita da Comissão (que estupidez!).
O que menoriza o papel da
própria Comissão que fica com funções residuais…
O saneamento desses contratos
é imperativo de cidadania.
Mas poucos parecem preocupados
com o ”statu quo”!
Para quando a Comissão das
Cláusulas Abusivas a funcionar deveras?
Ou é algo só para “inglês
ver”?
O secretariado da Comissão é
assegurado pela Direcção-Geral do Consumidor.
Será que uma tal entidade, na
órbita da administração directa do Estado, dependente do Ministério da Economia
e da Coesão Territorial”, terá algo a dizer?
Em tempos, limitou-se a dizer
que só faltava nomear as personalidades de reconhecido mérito, normalmente
recrutadas no seio das Universidades.
Será que nada evoluiu desde
então?
Apesar da opção por uma
solução restritiva, com os reguladores de fora, afigura-se-nos que há que
repensar o modelo e dar-lhe uma utilidade adequada, já que com o quadro actual…
“a montanha pariu um rato”!
Haja coragem, haja inovação,
haja ousadia para dar a volta à coisa!
A manutenção do actual estado
de coisas é um péssimo serviço prestado à Cidadania!
Esperemos que algo se altere
para que nada fique, com efeito, na mesma.
Mário Frota
presidente da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal