A pergunta surge com
inusitada frequência: podem as empresas de comunicações electrónicas pelos
contactos estabelecidos pelos consumidores cobrar por chamada telefónica um
qualquer valor acrescentado? E o mesmo se passa, com efeito, com os mais
serviços públicos essenciais.
É que essa forma de
proceder desencoraja as pessoas a
estabelecer contactos, de resto indispensáveis, para tratar de assuntos
inerentes aos seus contratos, sobretudo se as chamadas forem propositadamente
demoradas e os valores facturados muito elevados.
O facto é que, ainda
que contra lei expressa, os serviços públicos em geral e, em
particular, os essenciais, os do catálogo, socorriam-se de linhas com o prefixo 707 para esportular os
cidadãos, numa ausência efectiva de sentido de missão.
“É
fartar, vilanagem”!
Perante abusos
tamanhos, de há muito que a Provedora de Justiça, como se destaca de um dos
seus comunicados, se pronunciara ao detectar que havia significativos desvios
por parte de diversos serviços públicos
— a saber, de forma meramente exemplificativa, Autoridade Tributária e Aduaneira, ADSE, Direcção-Geral do
Consumidor, Instituto da Segurança
Social, “Linha de Atendimento
Sexualidade em Linha”, “Linha da
Juventude” e Lojas do Cidadão —
que usavam linhas telefónicas com o prefixo
707, implicando custos elevados para os cidadãos que recorriam a contactos
com a administração pública por essa
via”.
A Lei 7/2020, mais
recentemente, no seu artigo 9.º, proíbe que os serviços públicos, em geral, usem quaisquer linhas de valor
acrescentado:
“As entidades públicas e empresas que
prestam serviços públicos estão impossibilitadas de disponibilizar:
a)
Números especiais de valor acrescentado com o prefixo «7», para contacto
telefónico dos consumidores;
b)
Apenas números especiais, números nómadas com o prefixo «30», ou números azuis
com o prefixo «808», para contacto telefónico dos consumidores.”
O que a lei – o DL
59/2021, de 14 de Julho - hoje estabelece, em geral, é um especial dever de informação segundo o qual “qualquer entidade que
torne disponíveis linhas telefónicas para contacto do consumidor deve divulgar,
de forma clara e visível, nas suas comunicações comerciais, na página principal
do seu sítio na Internet, nas facturas, nas comunicações escritas com o
consumidor e nos contratos com este celebrados, quando os mesmos assumam a
forma escrita, o número ou números telefónicos de contacto, aos quais deve ser
associada, de forma igualmente clara e visível, informação actualizada relativa
ao preço das chamadas”: “principiando
pelas linhas gratuitas e pelas linhas geográficas ou móveis,
apresentando de seguida, se for o caso, em ordem crescente de preço, o número e
o preço das chamadas para as demais linhas.”
O custo, para o
consumidor, das chamadas, no âmbito de uma relação jurídica de consumo, não pode ser superior ao valor da sua tarifa de base.
Por «tarifa de base» se entende o custo de uma comunicação telefónica comum
que o consumidor espera suportar de acordo com o respectivo tarifário de
telecomunicações.
O fornecedor, no
entanto, está obrigado a facultar ao consumidor o acesso a uma linha telefónica
gratuita ou, em alternativa, a uma linha telefónica a que corresponda uma gama
de numeração geográfica ou móvel.
Os fornecedores de serviços públicos essenciais são obrigados a facultar ao consumidor o
acesso gratuito a uma linha para contacto telefónico no quadro das relações
entre ambos estabelecidas. E, nesse particular, estão naturalmente as
empresas de comunicações electrónicas.
Constituem, entre
outras, contra-ordenação económica grave,
a violação do dever especial de
informação a que se alude supra; muito
grave, a violação da obrigação de
disponibilização de uma linha telefónica
gratuita no que tange aos serviços públicos essenciais.
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO
, Portugal