(Da Nova Agenda
Europeia do Consumidor de 13 de Novembro de 2020)
Dar
resposta às necessidades específicas dos consumidores
A
propósito do Estatuto do Consumidor Vulnerável, que consta do Programa de
Governo, cumpre transcrever o que consta da Nova Agenda Europeia do Consumidor
que a lume veio a 13 de Novembro de 2020:
| Exemplo: em 2018, 10 % dos agregados familiares
da UE tinham pagamentos em atraso relativos a créditos imobiliários, rendas, facturas
de serviços públicos ou empréstimos, e estavam em risco de sobre-endividamento.
A actual pandemia está a agravar a situação de muitos consumidores endividados.
A Comissão trabalhou com os Estados-Membros e as partes interessadas para
identificar e promover as melhores práticas para ajudar os consumidores em
dificuldades 81, incluindo um melhor acesso ao aconselhamento em
matéria de dívida. Os estudos mostram que um euro gasto no aconselhamento em
matéria de dívida pode poupar mais de dois euros em prestações sociais. |
Os instrumentos de
política dos consumidores protegem todos os consumidores nas suas relações com
os comerciantes profissionais. Parte-se do princípio de que os consumidores são geralmente a parte mais
fraca numa transacção e que, por conseguinte, a sua saúde, segurança
e interesses
económicos necessitam de protecção.
No entanto, certos
grupos de consumidores podem, em determinadas situações, ser particularmente
vulneráveis e necessitar de salvaguardas específicas.
A vulnerabilidade
dos consumidores pode ser determinada em
função de circunstâncias sociais ou de características
específicas de consumidores individuais ou de grupos de consumidores, tais
como a idade, o género, a saúde,
a literacia
digital, a numeracia ou a situação financeira 82. A
falta de acessibilidade pode colocar os idosos
ou as pessoas com deficiência em
situações de exclusão ou limitar as suas interacções. Estas formas de
vulnerabilidade podem ter sido exacerbadas pela actual pandemia, mas existem independentemente
da mesma.
Actualmente, a
crescente vulnerabilidade financeira
de muitos agregados familiares da UE é especialmente preocupante. Um inquérito
recente realizado em 21 Estados-membros mostrou que, desde o início da crise da
COVID-19, 6 em cada 10 consumidores enfrentaram dificuldades financeiras83
que podem conduzir ao sobre-endividamento. O aconselhamento em matéria de
dívida provou ser uma forma eficaz de ajudar os consumidores sobre-endividados
a regressarem à sustentabilidade financeira, assegurando, ao mesmo tempo, que
os credores são reembolsados.
A Comissão está a
compilar as melhores práticas nos Estados-Membros, a examinar o seu potencial
de replicação e a identificar as necessidades e as oportunidades de
financiamento no âmbito do novo QFP.
Em Junho de 2020, a
Comissão publicou também uma versão actualizada do Código Europeu de Boa Conduta para a Concessão de Microcrédito84.
A revisão da Directiva Crédito ao
Consumo85 incluirá uma avaliação da forma de melhorar as regras que
garantem que o crédito só é concedido em conjugação com uma avaliação rigorosa
da solvabilidade do consumidor.
Os consumidores
devem também receber todas as informações e conselhos pré-contratuais necessários
e adequados para que possam fazer escolhas informadas na celebração de contratos
de crédito.
Estas medidas são
fundamentais para alinhar as necessidades de financiamento dos consumidores com
a sua capacidade de reembolso, reduzindo assim o risco de incumprimento e
sobre-endividamento. No entanto, os consumidores podem, por vezes, ser incapazes
de reembolsar as dívidas na data de vencimento. Por conseguinte, pode ser necessário
avaliar os meios mais adequados para lidar com o sobre-endividamento dos consumidores,
incluindo o perdão de dívidas86.
A acessibilidade dos preços é crucial
para garantir o acesso a produtos e serviços pelos consumidores de baixos
rendimentos, como sublinhado pela Rede Europeia de Política Social87.
Alguns Estados-Membros recorrem a medidas de protecção dos consumidores, juntamente
com medidas de protecção social, para ajudar as pessoas com baixos rendimentos.
A Recomendação da Comissão sobre a Pobreza Energética
88 proporciona aos Estados-membros orientações sobre as formas de
combater a pobreza energética, a fim de capacitar os consumidores de energia
vulneráveis.
Os idosos e as pessoas com deficiência têm necessidades específicas em matéria de consumo.
É importante assegurar a disponibilidade de informações claras, simples e acessíveis
em linha e fora de linha, em conformidade com os requisitos da UE em matéria de
acessibilidade dos produtos e serviços89. Os consumidores mais velhos e os consumidores com deficiência também
necessitam de produtos acessíveis e de tecnologias de assistência que sejam
compatíveis com as tecnologias mais comuns. Uma abordagem justa e não discriminatória
da transformação digital deve responder às necessidades dos consumidores mais
idosos, dos consumidores com deficiência e, de um modo mais geral, dos info-excluídos,
que podem estar menos familiarizados ou ter mais dificuldades com as
ferramentas digitais, ficando mais propensos a serem vítimas de fraude. A
experiência de alguns Estados-membros mostra que as iniciativas locais que
prestam aconselhamento aos consumidores em zonas rurais ou urbanas90
são das mais eficazes. As organizações da economia social estão particularmente
bem colocadas para responder a estas necessidades graças à sua proximidade das
comunidades locais e rurais. Iniciativas semelhantes poderiam ser promovidas
através de uma acção comum a nível da UE no âmbito do futuro QFP.
As crianças e os menores estão
particularmente expostos em linha a práticas comerciais enganosas ou
agressivas. É importante investir mais na educação e na sensibilização dos consumidores
ao longo da vida, para as pessoas em todas as fases da vida após a escolaridade.
Tal deve incluir também a promoção da literacia financeira como competência essencial
para capacitar os consumidores para tomarem boas decisões sobre as suas
finanças pessoais91. Uma melhor coordenação das acções entre os principais
intervenientes a nível nacional e da UE, abrangendo questões como o acesso a
materiais didácticos em linha e o reforço das capacidades, poderá ajudar a
alcançar sinergias, a inovar continuamente, a adaptar e adoptar novas
abordagens pedagógicas e em linha, nomeadamente através da criação de
plataformas em linha e de outros instrumentos.
As crianças estão também particularmente
expostas aos riscos relacionados com os produtos92. De todos os
produtos notificados como perigosos no sistema de alerta rápido «Safety Gate/RAPEX» em 2019, 32 % eram
brinquedos ou produtos para crianças. Para além da revisão da Directiva
Segurança Geral dos Produtos e do reforço do quadro geral, a Comissão irá
estabelecer requisitos de segurança actualizados para as normas relativas aos
produtos para crianças. A Comissão prevê igualmente apoiar a amostragem e
análise dos produtos para crianças93 através de actividades coordenadas
de fiscalização do mercado pelos Estados-Membros94. Além disso,
incluirá a protecção da segurança das crianças e de outros grupos vulneráveis
na edição de 2021 do Prémio da UE para a Segurança dos Produtos, a fim de
promover as melhores práticas comerciais neste domínio.
A Directiva
2004/113/CE95 garante a igualdade
de tratamento entre homens e mulheres no acesso a bens e serviços e seu
fornecimento. Tal garante a protecção contra, por exemplo, a recusa de acesso a serviços de crédito para
mulheres grávidas, com base numa potencial perda de rendimento esperada, ou
a exclusão de mães solteiras de
determinados serviços financeiros com base numa percepção de risco de
incumprimento mais elevada. A Directiva 2000/43/CE96 também
estabelece um quadro jurídico para o combate à discriminação com base na origem racial ou étnica, com vista a pôr
em prática nos Estados-Membros o princípio da igualdade de tratamento.
O risco de discriminação é por vezes agravado
pelos algoritmos utilizados por
certos fornecedores de bens e serviços e que podem ser formulados com base em
preconceitos muitas vezes resultantes de expectativas culturais ou sociais
preexistentes. Embora esta situação possa conduzir a discriminações entre os
consumidores em geral, afecta mais frequentemente determinados grupos, em
especial as pessoas oriundas de minorias
étnicas ou raciais97. A futura proposta de um quadro legislativo
horizontal em matéria de inteligência artificial terá como objectivo abordar
especificamente a forma de limitar os riscos de parcialidade e discriminação
nos sistemas algorítmicos.
Por último, os dados
da economia comportamental98 mostram que os comportamentos dos consumidores
são frequentemente afectados por preconceitos
cognitivos, especialmente em linha, que podem ser explorados pelos
operadores para fins comerciais. Estas novas formas de riscos podem afectar
praticamente todos os consumidores. As obrigações de transparência são
certamente importantes para combater as assimetrias de informação (tal como
referido acima no contexto da transformação digital), mas é necessária uma
avaliação mais aprofundada para determinar a necessidade de medidas adicionais
para fazer face a esta forma dinâmica de vulnerabilidade.
Acção 15: A partir de 2021, a Comissão
tenciona aumentar o financiamento para acções que reforcem a disponibilidade e
a qualidade dos serviços de aconselhamento em matéria de dívida nos
Estados-Membros.
Acção 16: A Comissão pretende apoiar, a
partir de 2021, iniciativas que proporcionem
aconselhamento local
aos consumidores que, por razões estruturais ou pessoais, não têm acesso ao
apoio e informações prestadas em linha ou nos serviços centrais de informação.
Acção 17: Em 2021, a Comissão prevê
preparar uma decisão sobre os requisitos de segurança a cumprir pelas normas
relativas aos produtos para crianças, para além de reforçar o quadro de
segurança dos produtos através de uma proposta de revisão da Directiva Segurança
Geral dos Produtos.
Acção 18: Até 2023, a Comissão
desenvolverá uma abordagem estratégica para melhorar a sensibilização e a
educação dos consumidores, tendo também em conta as necessidades dos diferentes
grupos, nomeadamente com base em abordagens baseadas na igualdade e não discriminação.
81 Em Maio e Junho de
2020, a Comissão organizou mesas-redondas de diálogo com as partes interessadas
para debater as medidas de alívio oferecidas pelos bancos e pelos mutuantes não
bancários, na sequência das quais foi publicado um documento de boas práticas
em Julho de 2020.
82 O relatório do Behavioural
Insights Team sobre os danos e a manipulação em linha descreve várias
opções interessantes, incluindo propostas sobre a utilização de dados para
identificar os consumidores vulneráveis (p. 52) e outras medidas (por exemplo,
a auto-exclusão).
83
https://www.europarl.europa.eu/news/pt/press-room/20200525IPR79717/eu-citizens-want-more-competencesfor-the-eu-to-deal-with-crises-like-covid-19.
84 O código visa servir
de selo de qualidade para um conjunto unificado de boas práticas para as
instituições de microfinanciamento europeias que concedem empréstimos
comerciais até 25 000 EUR a microempresários ou trabalhadores independentes.
Ver: https://ec.europa.eu/social/main.jsp?catId=1482&langId=pt.
85 Ver a acção 10 acima
mencionada.
86 Ver Directiva (UE)
2019/1023 relativa à reestruturação, à insolvência e ao perdão de dívidas.
87 Baptista, I., Marlier,
E. (2020), Access to essential services
for people on low incomes in Europe. An analysis of policies in 35
countries, Rede Europeia de Política Social (ESPN), Bruxelas, Comissão
Europeia.
88 Recomendação da
Comissão sobre a Pobreza Energética, de 14 de Outubro de 2020, C(2020) 9600
final.
89 Directiva (UE)
2019/882 relativa aos requisitos de acessibilidade dos produtos e serviços,
https://eurlex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX%3A32019L0882 (JO L 151
de 7.6.2019, p. 70).
90 Ver, por exemplo, «Empowering consumers in the neighbourhood»,
Projecto conjunto da Federação Alemã de Associações de Consumidores (VZBV) e
dos centros dos consumidores.
https://www.vzbv.de/pressemitteilung/verbraucher-staerken-im-quartier.
91 Ver Comunicação da
Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social
Europeu e ao Comité das Regiões intitulada «Uma União dos Mercados de Capitais
ao serviço dos cidadãos e das empresas - novo plano de acção», COM(2020) 590
final, acção 7: capacitação dos cidadãos através da literacia financeira.
92 Os dados relativos a
acidentes mostram que as crianças e os idosos são os grupos de consumidores
mais vulneráveis em termos de segurança dos produtos. Em conjunto, representam
54 % de todas as lesões relacionadas com produtos, mas apenas 35 % da população
da UE.
93 Verificação da
segurança dos produtos vendidos em linha e fora, por exemplo, berços, baloiços
e andarilhos para bebés.
94 Actividades
coordenadas no âmbito da segurança dos produtos (artigo 10.º da Directiva
2001/95/CE relativa à segurança geral dos produtos).
95 Directiva 2004/113/CE
do Conselho, de 13 de Dezembro de 2004, que aplica o princípio de igualdade de tratamento
entre homens e mulheres no acesso a bens e serviços e seu fornecimento (JO L
373 de 21.12.2004, p. 37).
96 Directiva 2000/43/CE
do Conselho, de 29 de Junho de 2000, que aplica o princípio da igualdade de
tratamento entre as pessoas, sem distinção de origem racial ou étnica (JO L 180
de 19.7.2000, p. 22).
97
https://fra.europa.eu/sites/default/files/fra_uploads/fra-2018-focus-big-data_en.pdf.
98
https://ec.europa.eu/info/policies/consumers/consumer-protection/evidence-based-consumer-policy_pt.