(Artigo
destinado aos Jornais Regionais: semana com começo a 15 de Novembro de 2021)
Segundo o
quotidiano parisiense “Le Figaro”, entre 200 000 e 300 000 fogos sofrem,
anualmente, com o ‘corte’ da energia eléctrica em razão do não pagamento, no
tempo e no lugar próprios, das facturas regularmente emitidas.
Segundo o
“Médiateur de l’ Énergie” (entidade equivalente ao Provedor da Justiça, em
Portugal, só que votada especificamente ao Sector Energético), 5,6 milhões de
lares, em França, engrossam a legião dos que figuram na pauta da precariedade
energética.
20% dos
franceses passam frio durante a invernia
De harmonia
com o último Barométre Annuel, publicado o mês transacto, 20% dos franceses (a
população francesa é da ordem dos 66 000 000 habitantes) teriam declarado
passar frio em suas próprias casas no decurso do inverno, 36% dos quais por
razões eminentemente financeiras.
O “Mediador
da Energia”, em audiência perante a Assembleia Nacional francesa, a 10 de
Novembro em curso, declarou convictamente que é favorável se dê expressão a um
“direito a um abastecimento mínimo de electricidade” (“droit à une alimentation
minimale en électricité”) para os lares.
De há muito
que o vimos afirmando, na esteira, de resto, de Catherine Spaak, parlamentar
belga, filha do secretário-geral da OTAN, Paul-Henri Spaak (1957/60), primeiro
presidente do Parlamento Europeu (1952-54) e primeiro-ministro belga (1946 –
1947/49)] que entendia, nos anos 70 do século passado, que os cidadãos deveriam
ter direito a um Minilec, mínimo de electricidade compaginável com os índices
civilizacionais propiciado pelas sociedades pós-modernas.
Em França, o
Código da Energia define a electricidade “como um produto de ‘primeira necessidade’”,
o que o Mediador elementarmente recordou, ao declarar que “sem electricidade,
não há luz, não há aquecimento, não há acesso nem à internet nem ao telefone”.
“As medidas
tomadas pelo Governo para prevenir uma precarização energética das famílias – a
atribuição de um cheque de energia suplementar de 100€ e o bloqueio das tarifas
regulamentadas do gás e da electricidade para 2022 – são soluções de emergência
e a curto prazo, mas que não resolvem a questão do acesso a um quantum mínimo
de electricidade”, como o adverte o Mediador.
O antigo
monopólio francês da electricidade – a EDF -, em vez de proceder ao “corte” da
energia por incumprimento dos consumidores, entre o 1.º de Abril e 31 de
Outubro, adopta conduta diferente: passa a aplicar uma redução da potência
contratada.
A EDF, a
principal empresa de distribuição de energia em França, anunciou a 12 de
Novembro em curso, que deixaria de suspender o fornecimento de electricidade
aos consumidores que se achassem em situação de incumprimento, não somente
durante as tréguas invernais (do 1.º de Novembro a 31 de Março, como o impõe,
por razões de humanidade, um decreto presidencial de antanho), mas durante todo
o ano.
De há muito
que uma tal medida fora reclamada pela Fondation Abbé Pierre ante a situação de
penúria de muitas famílias e as privações de que padecem, com a agravante das
deprimentes situações criadas pela pandemia da SARS Cov 2.
A partir do
1.º de Abril do próximo ano, a EDF procederá à diminuição da potência
contratada a 1 KVA, o que permitirá às famílias e aos cidadãos singulares ter
acesso a coisas tão basilares como o funcionamento do frigorífico ou o
recarregamento dos equipamentos eléctricos, para além da luz de iluminação.
Tal medida,
anuncia a EDF, “aplicar-se-á a todas as situações, salvo se houver uma qualquer
impossibilidade física ou técnica de limitação da potência de alimentação
eléctrica da habitação”.
No
comunicado emitido sexta-feira última, a EDF sublinha que privilegia, há já
alguns anos, a limitação da potência ao corte da electricidade. A EDF tem uma
massa de clientes que ultrapassa os 22, 3 milhões. Uma tal prática, assegura,
permitiu reduzir em 1/3, em cinco anos, o número de “cortes”.
Exemplos
destes não vemos, infelizmente, seguirem-se em Portugal.
Mário Frota
Fundador da
apDC –DIREITO DO CONSUMO - Coimbra