sexta-feira, 25 de abril de 2025

CONSULTÓRIO DO CONSUMIDOR


À “PESTE GRISALHA” QUE MAL SE AMORTALHA…

NEM DIGNIDADE, NEM URBANIDADE NEM PRIORIDADE!


 Como brasileiro, sinto que há qualquer coisa que falha nos aeroportos e noutros lugares públicos em Portugal: não há consideração pelos idosos a quem se não reconhece prioridade no atendimento.

No Brasil, os de 80 e mais anos têm prioridade sobre os de 70 e mais e, estes, sobre os de 60 e mais anos. E as regras cumprem-se religiosamente.

Não haverá lei em Portugal?”

 

Apreciada a questão, cumpre responder de modo adequado

1.    A lei define inequivocamente:

• Todas as pessoas, públicas e privadas, singulares e colectivas, no âmbito do atendimento presencial ao público, devem atender com prioridade sobre as demais pessoas:

– Pessoas com deficiência ou incapacidade;

– Pessoas idosas;

– Grávidas; e

– Pessoas acompanhadas de crianças de colo (DL 58/2016: n.º 1 do  art.º 3.º)

2.    Entende-se por:

– «Pessoa com deficiência ou incapacidade», aquela que, por motivo de perda ou anomalia, congénita ou adquirida, de funções ou de estruturas do corpo, incluindo as funções psicológicas, apresente dificuldades específicas susceptíveis de, em conjugação com os factores do meio, lhe limitar ou dificultar a actividade e a participação em condições de igualdade com as demais pessoas e que possua um grau de incapacidade igual ou superior a 60 %. reconhecido em Atestado Multiusos;

– «Pessoa idosa», a que tenha idade igual ou superior a 65 anos e apresente evidente alteração ou limitação das funções físicas ou mentais;

– «Pessoa acompanhada de criança de colo», aquela que se faça acompanhar de criança até aos dois anos de idade. (DL 58/2016: n.º 2 do art.º 3.º)

3.    “A pessoa a quem for recusado atendimento prioritário, em violação do que precedentemente se dispõe, pode requerer a presença de autoridade policial a fim de remover a recusa e para que tal autoridade tome nota da ocorrência e a faça chegar à entidade competente para o efeito” (DL 58/2016: n.º 3 do art.º 3.º).

 4.    É facto que a lei conceitua (e mal…) pessoa idosa como a que é susceptível de apresentar evidentes alterações ou limitações de funções físicas ou mentais, numa estranha formulação que deixa ao intérprete as mais absurdas atitudes: e o intérprete é, quantas vezes, o titular de um qualquer diploma das ‘novas oportunidades’… sem qualificação nem adequada preparação!

 5.    Quando o avanço da idade, as mais das vezes, pressupõe uma natural quebra de resistência física, para não dizer o mais… sem que o facto se detecte à “vista desarmada”.

 6.    Colocar, num aeroporto, pessoas com notórias quebras físicas, em razão da idade, em condições de “igualdade” com as mais jovens, em intermináveis filhas de ‘controlo’ de identidade, é, no mínimo, uma barbaridade: quando as leis se querem iluminadas pela dignidade da pessoa humana, como se inscreve no pórtico do Texto Fundamental: “Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária” (Constituição da República: art.º 1.º).

 7.    E nem vale, como sucede noutras circunstâncias, exigir dos idosos, como no Metro do Porto, “um certificado multiusos” para aferir da quebra física do idoso (!!!)… É que, parafraseando um determinado dito popular, “de jurista e de louco todos temos um pouco…”

 8.    Daí que haja de se interpretar a norma supra no seu efectivo enquadramento: a idade é pressuposto de quebra física e, por conseguinte, é por si só suficiente para a outorga da prioridade no atendimento em lugares públicos e privados.

 9.    Deixar o facto ao livre alvedrio de pessoas menos qualificadas é “matar a norma e seu substrato” na avidez com que tudo se distorce…

 

EM CONCLUSÃO

a.    Em Portugal há norma a conferir prioridade aos idosos (DL 58/2016: n.º 1 do art.3.º)

b.    Norma que há-de ser interpretada de acordo com o espírito adequado, algo que não está, bem entendido,  ao alcance de quem quer…

c.    Norma que só se não actua por ausência de respeito pela dignidade da pessoa humana, pilar em que assenta a concepção de vida em Portugal (CRP: art.º 1)

d.    Cumpre aos cidadãos, sempre que preteridos nas prioridades que as leis lhes concedem, recorrer à exaustão ao Livro de Reclamações e bem assim à “autoridade pública” para remover um tal obstáculo… (DL 156/2005: art.º 4.º; DL 58/2016: art.ºs 5.º e 6.º)

 Tal é, salvo melhor juízo, o nosso parecer.

 

Mário Frota

presidente emérito da apDC – Direito do Consumo, Portugal

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