sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Consultório do CONSUMIDOR

 


E OS ‘RECONDICIONADOS’

NÃO SERÃO REABILITADOS?

 

“A EUROCUPON, empresa radicada no Porto, que é hábil em mensagens atractivas para ludibriar o consumidor, anda a propagandear  computadores marca HP (?) por € 49, cujo preço original é de € 249,  já que se trata de equipamentos recondicionados.

Mas, como garantia, para que as pessoas saibam da “seriedade de propósitos”, oferece, nada mais nada menos, que 1 (um) ano: um ano de garantia!

Pergunta-se: a garantia não devia ser a dos usados, que agora é, ao menos, de ano e meio (de dezoito meses)? Porque, afinal, é de um usado que se trata…”

 

E os ‘recondicionados’

Co’ uma coxa garantia

Andam pr’ aí encalhados

Sem préstimo nem valia…

 Apreciada a concreta hipótese de facto (e as imagens suporte da publicidade), eis que cumpre emitir opinião:

 1.    Entendamo-nos: conceitualmente, bem recondicionado não é o mesmo que usado; recondicionados são, segundo a lei, os bens previamente utilizados ou que hajam sido objecto de devolução e, após inspecção, preparação, verificação e testagem por um “expert”, de novo são colocados, nessa qualidade,  no mercado para venda”.

 2.    A LCVBC - Lei da Compra e Venda de Bens de Consumo de 2021, que entrou em vigor a 1 de Janeiro de 2022, ampliou a garantia legal dos bens novos de consumo, que era anteriormente de dois [2]  anos (Lei de 2003), para três [3] anos.

 3.    A disposição em que tal radica é o n.º 1 do seu artigo 12, que estatui:

“O profissional é responsável por qualquer [não] conformidade que se manifeste no prazo de três [3] anos a contar da entrega do bem.”

4.    Há, porém, regra distinta no que toca aos bens usados, que do antecedente poderiam beneficiar, por acordo, de uma garantia não inferior a um (1) ano.

 5.    Com efeito, na primeira parte do n.º 3 do artigo 12 se estabelece:

 “Nos contratos de compra e venda de bens móveis usados e por acordo entre as partes, o prazo de três anos previsto no n.º 1 pode ser reduzido a 18 meses…”

 6.    Logo, no domínio da lei vigente, a garantia de usados pode ser negociada, sendo que há um limite legal: nunca poderá ser fixada aquém (abaixo) dos 18 meses.

 7.    No que toca, porém,  aos recondicionados, a segunda parte do n.º 3 do artigo 12 da Lei em apreciação define:

 “salvo se o bem for anunciado como um bem recondicionado, sendo obrigatória a menção dessa qualidade na respectiva factura, caso em que é aplicável o prazo previsto nos números anteriores.”

 8.    Ora, o prazo assinado será então de 3 (três) anos para os bens recondicionados, sem tirar nem pôr, sem qualquer hipótese de negociação: o prazo legal é imperativo, é para valer sejam quais forem as circunstâncias.

 9.    Por conseguinte, a pretensa garantia de um (1) ano para o HP… ter-se-á de reconduzir aos 3 (três) anos.

 10. Havendo sanções para a violação de um sem-número de preceitos da lei, no concreto caso objecto de apreciação, só haverá contra-ordenação económica (grave) se a empresa não apuser na factura a menção “recondicionado”, nos termos alínea b) do n.º 1 do artigo 48 da LCVBC. No mais, a única sanção perspectivável é de natureza cível, a saber, a nulidade da garantia em razão da violação de disposições legais de natureza imperativa (DL 446/85: al. d) do art.º 21) e sua recondução à garantia legal de 3 (três) anos.

 

11.  A grelha das contra-ordenações económicas graves é a que segue:

 

§  Pessoa singular, de € 650,00 a € 1 500,00;

 

§  Micro-empresa, de € 1 700,00 a € 3 000,00;

 

§  Pequena empresa, de € 4 000,00 a € 8 000,00;

 

§  Média empresa, de € 8 000,00 a € 16 000,00;

 

§  Grande empresa, de € 12 000,00 a € 24 000,00;

 

 

EM CONCLUSÃO:

a.    Recondicionados são bens  com utilização anterior ou objecto de devolução que, após inspecção, preparação, verificação e testagem por um “expert”, são de novo colocados, como tal, no mercado para venda” [DL 84/2021: al. e) do art.º 2.º].

b.    A outorga de um ano de garantia a um bem recondicionado leva à nulidade da cláusula e à sua recondução à garantia de 3 anos que é a legal [DL 446/85: al. d) do art.º 21; DL 84/2021: II parte do n.º 3 do art.º 12 e n.º 1 do art.º 12].

c.    A outorga contra legem (contra a lei) de garantia inferior não constitui, porém, qualquer ilícito de mera ordenação social por tal não haver sido previsto na LCVBC de 2021.

d.    Só a não menção de “recondicionado” na factura é que constitui contra-ordenação económica grave [DL 84/2021: al. b) do n.º 1 do artigo 48].

e.    As contra-ordenações económicas graves serão graduadas em função da natureza do infractor ou da dimensão da empresa (cfr. 11 supra)

Tal é, salvo melhor juízo, o nosso parecer.

 

Mário Frota

presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO -Portugal

Sem comentários:

Enviar um comentário

Air France, Lufthansa Group airlines part of EU greenwashing probe

  Air France, its Dutch arm KLM, Norwegian and several Lufthansa Group airlines are among 20 carriers being investigated by the European U...