ESTA É DE ‘CABO-DE-ESQUADRA’!
Eis o teor de uma mensagem, emanada da TAP e dirigida a um passageiro brasileiro que viu o seu voo TAP Milão / Rio cancelado, e lhe exigira, de harmonia com a legislação europeia, que apropriadamente invocou, a devida reparação no valor de 600 €:
“Temos conhecimento do Regulamento da Comissão Europeia 261/2004. No entanto, a política interna adoptada pela TAP Air Portugal refere-se exclusivamente à compensações através de milhas ou vouchers de viagens. Uma vez que, a Regulamentação 261 da União Europeia não foi ratificada pelo nosso Congresso Nacional."
Apetece, antes do mais, indagar:
Mas o que disse, desculpe?
Torpes dislates da TAP?
Nada há que os oculte
Não há vergonha que os tape!
As insubsistentes justificações dadas pela TAP ao cidadão brasileiro não têm qualquer fundamento legal.
Trata-se de uma inqualificável falácia engendrada pela TAP para se eximir às obrigações decorrentes do Regulamento que regra a indemnização aos passageiros lesados pelos cancelamentos de voos e vicissitudes outras decorrentes do transporte aéreo.
Com efeito, o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (art.º 288) define “Regulamentos” como ‘actos jurídicos de aplicação geral, obrigatórios em todos os seus elementos e directamente aplicáveis nos Estados-membros da UE.’
O regulamento adoptado na sequência de um processo legislativo ordinário ou especial pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho da União é um acto legislativo.
Às Directivas exige-se a transposição para o direito de cada um dos Estados-membros (no caso português, por lei ou decreto-lei); os Regulamentos aplicam-se directa e imediatamente em cada um deles, sem necessidade de transposição nem publicação no jornais oficiais: em casos contados, impõe-se legislação complementar, como a moldura sancionatória por incumprimento, etc., da lavra dos Estados.
O Regulamento - de aplicação geral e abstracta -, uniforme nas regras que institui, é:
· Directamente aplicável após a sua entrada em vigor nos Estados-membros, não carecendo, pois, de transposição para o direito interno;
· Susceptível de estabelecer direitos e obrigações para os particulares, a quem é lícito, por conseguinte, invocá-lo directamente perante os tribunais nacionais;
· Passível de adopção como referência por particulares na sua relação com os seus pares, com os Estados-membros e mais autoridades da UE.
Há, é facto, excepcionalmente, isenções na aplicação de Regulamentos a determinados Estados-membros. Nada que ocorra, porém, com o Regulamento de que se trata, que não comporta excepções.
O Regulamento 261/2004 aplica-se, de harmonia com os seus termos, aos passageiros, a todos os passageiros, que partem de um aeroporto situado tanto num Estado-membro como em país terceiro mas com destino a um outro localizado em um Estado-membro, independentemente da sua nacionalidade.
A TAP decerto o não ignorará porque é algo de elementar com que lida no dia-a-dia.
Mas muito mais estranho e desconcertante é que afirme que o Regulamento Europeu, cuja paternidade atribui erroneamente à Comissão Europeia, para dos seus termos se poderem aproveitar os nacionais brasileiros prejudicados, como o transmitiu ao passageiro reclamante, esteja sujeito a ratificação do Congresso Nacional brasileiro.
[Como se dizia antigamente (quando não havia escola para os agentes da autoridade), esta é mesmo “ de cabo-de-esquadra”!].
É mais uma efabulação urdida pela engenhosa TAP, prenhe de embustes nos seus procedimentos, que desse modo tende a furtar-se às responsabilidades perante estrangeiros vítimas dos seus procedimentos desviantes: há milhões para indemnizar dirigentes de cúpula “mal despedidos”, como nas situações recentemente reveladas, não há centenas de euros para passageiros vítimas das suas costumeiras disfunções…
A TAP é useira e vezeira em denegar direitos a passageiros: em parceria com uma outra insígnia da aviação civil (a Easyjet), a operar em Portugal, a dívida acumulada (às vítimas dos seus desvarios operacionais) ascende a mais de 260 000 000 € (dados apurados em Janeiro do ano em curso)…
A TAP que tenha vergonha e pague o que deve!
Mais do que fabricar políticas e falsas representações… cumpra os Regulamentos europeus e passe a agir com lealdade e isenção no mercado!
Mário Frota
presidente emérito da apDC – Direito do Consumo, Portugal
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