Um simples telefonema
A enredar ignorantes
É a bandeira, é o lema
Destes “hábeis” ‘con’ tratantes…
Um telefonema da MEO. Solícita, uma simpática brasileira do outro lado da linha. Uma conversa distendida sobre uma pretensa uma “refidelização” por dois anos, que o contrato, que acabara em 2020 (!), estava de novo a chegar a seu termo…
O cidadão escutava atentamente: a empresa entendera “renovar sem consentimento” o contrato desde 2020 até aos dias que correm…
As novas condições eram ditadas “ao correr da fala”…
O consumidor rogou naturalmente lhe remetessem as (novas) condições por “mala electrónica” para as poder confrontar com as da concorrência e ajuizar da conveniência ou não em contratar.
Que não, peremptoriamente que não, que teria de aceitar primeiro, oralmente, e só depois remeteriam as novas condições já aceitas.
Ora, o consentimento tem de ser livre, esclarecido e ponderado.
A Lei das Condições Gerais dos Contratos de 25 de Outubro de 1985 reza no seu artigo 5.º:
“1 - As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las.
2 - A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efectivo por quem use de comum diligência. …”
Há, desde logo, clara violação de um tal preceito: e os efeitos seriam os da não inclusão das cláusulas no contrato de que se trata com as consequências daí emergentes.
Porém, o DL 24/2014, de 14 de Fevereiro, directamente aplicável por força do n.º 1 do art.º 121 da Nova Lei das Comunicações Electrónicas (Lei 16/22, 16 de Agosto), prescreve no n.º 8 do seu art.º 5.º:
“Quando o contrato for celebrado por telefone [por iniciativa do fornecedor ou prestador de serviços], o consumidor só fica vinculado depois de assinar a oferta ou enviar o seu consentimento escrito ao fornecedor … ou prestador de serviços”.
Consequentemente, nestas circunstâncias nem há sequer um contrato válido: a simples aceitação oral não vincula, não obriga, não procede.
Mas essa parece ser a prática do antigo monopólio, que conta com uma invejável carteira de 5 000 000 (cinco milhões) de assinantes, à revelia das leis do Estado, porque se rege naturalmente, a seu bel talante, por leis privativas que a todos escapam, mas cujos efeitos sofrem.
E, ainda que o consentimento por escrito fosse presente à empresa de comunicações electrónicas, como no caso, do clausulado do contrato teria de constar o direito de retractação (o de dar o dito por não dito) no lapso de 14 dias e bem assim o formulário respectivo.
A omissão da cláusula de retractação conferiria o seu exercício por 12 meses mais que se seguiriam aos 14 dias originais.
Está, por conseguinte, prenhe de ilegalidades o pseudo-contrato oferecido pela Meo a potenciais assinantes, facto que deve pôr de sobreaviso o Regulador.
O Regulador não ignorará decerto comportamentos quejandos, já que do último reporte de 1 de Março pretérito, é possível extrair, neste particular, o que segue:
Recrudescem as reclamações no ponto nevrálgico das celebrações dos contratos: alegam os reclamantes
· Terem sido surpreendidos em contacto com o prestador com a informação de que o seu contrato foi anteriormente renovado, sem que tenham conhecimento de ter recebido alguma proposta contratual ou de ter consentido na renovação do contrato;
· Que o prestador de serviços activou um novo contrato sem que tenha havido assinatura ou confirmação escrita face à proposta apresentada pelo prestador;
· Terem sido ‘refidelizados’ mesmo após terem recusado expressamente a adesão à proposta contratual apresentada pelo prestador;
· Terem recebido contactos do prestador para a instalação de serviços que não contrataram;
· Que o prestador alterou o contrato por iniciativa de outra pessoa (designadamente por familiares);
· Terem sido activados aditivos do serviço sem acção intencional, queixando-se da facilidade de contratação destes aditivos, através do equipamento de televisão, muitas vezes feita sem a consciência de quem o faz.
Com efeito, em matéria de celebração dos contratos vai para aí uma enorme “rebaldaria”, passe a expressão. Ou até mais, muito mais que isso!
Que alguém ponha cobro a tantos desvios, a tamanhos atropelos!
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal
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