“Aluguei um cofre numa dependência do Banco Santander: pago pelo aluguer um valor anual.
Sou agora surpreendido por uma mensagem electrónica em que me transmitem que tenho de pagar € 5, 00 + IVA por cada uma das vezes que acedo ao cofre.
Mais surpreendente é o facto de só agora me ser debitada a comissão relativa "às visitas de Setembro de 2021" (nem me dizem quantas vezes fui ao cofre, nem que importâncias me debitaram e, para cúmulo, este débito refere-se ao ano de… 2021).
E o mais espantoso é que, além da ausência de informação, debitaram-me, abusiva e despudoradamente, tais comissões retroactivamente pois, como mo referem agora, as tabelas só entraram em vigor a 18 de Maio de 2022 - mais de meio ano após as, alegadas, visitas).”
Analisemos a questão suscitada por um distinto consumidor da Maia:
No decurso do contrato – tratando-se de relações jurídicas que se projectam no tempo – impõe-se a observância dos preceitos alusivos à informação em geral e, em particular, à protecção dos interesses económicos do consumidor.
“O … prestador de serviços deve, tanto na fase de negociações como na da celebração do contrato, informar o consumidor de modo claro, objectivo e adequado …, nomeadamente sobre…os encargos dele decorrentes…[LDC: n.º 1 do art.º 8.º]
“O consumidor tem direito à protecção dos seus interesses económicos, impondo-se nas relações jurídicas de consumo … a lealdade e a boa-fé, nos preliminares, na formação e ainda na vigência dos contratos.” [LDC: n.º 1 do art.º 9.º]
No mais, no particular dos serviços financeiros, avulta um especial dever de informação que emana do n.º 1 do artigo 77 do Regime Geral das Instituições Financeiras e de Crédito [RGIFC] sob a epígrafe “dever de informação e de assistência”:
“As instituições de crédito devem informar com clareza os clientes sobre a remuneração que oferecem pelos fundos recebidos e os elementos caracterizadores dos produtos oferecidos, bem como sobre o preço dos serviços prestados e outros encargos a suportar pelos clientes.”
O facto é que a violação dos deveres previstos neste artigo constitui contra-ordenação punível nos termos da alínea h) do artigo 210.º do presente Regime Geral: “coima de 3.000 a 1 500 000 €, tratando-se de ente colectivo”, como é o caso.
No mais, segundo a Lei das Condições Gerais dos Contratos [LCGC]:
“1 - São proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais que:
…
c) Atribuam a quem as predisponha o direito de alterar unilateralmente os termos do contrato, excepto se existir razão atendível que as partes tenham convencionado.”
2 - O disposto na alínea c) do número anterior não determina a proibição de cláusulas contratuais gerais que:
…
b) Atribuam a quem as predisponha o direito de alterar unilateralmente o conteúdo de um contrato de duração indeterminada, contanto que se preveja o dever de informar a contraparte com pré-aviso razoável e se lhe dê a faculdade de resolver o contrato. [LCGC: art.º 22]
Ora, tal nem é sequer enquadrável nas excepções constantes da lei, razão por que, tratando-se de comissões que surgem “ex novo”, em razão das políticas predatórias das instituições financeiras, cada vez mais vorazes no ataque à bolsa dos consumidores, é pura e simplesmente proibido.
Tratando-se, porém, de uma alteração substancial de conteúdo, ao Santander cumpria notificar tempestivamente os consumidores das alterações, a fim de cada um dos seus clientes ajuizar da conveniência de continuar ou não vinculado às obrigações decorrentes do contrato, o que de todo não sucedeu.
Menos ainda se admite a retroactividade das cobranças, o que constitui, para além do mais e segundo o nosso juízo, conduta enquadrável no crime de especulação, previsto e punível pela Lei Penal do Consumo [LPC - DL 28/84: art.º 35] cuja moldura penal é de seis meses a três anos de prisão e multa não inferior a 500 dias.
É lícito se requeira a desconsideração da personalidade colectiva, a fim de fazer responder pessoalmente os gestores e mais responsáveis pela condução da actividade das entidades em causa pelos crimes perpetrados contra os consumidores.
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal
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