FRANÇA
Energia Eléctrica
Não ao “CORTE”(!)
SIM à Limitação de Potência...
(Artigo que sairá hoje, 16 de Novembro de 2021, no Portal Procon RS, de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil,, por deferência do Dr. Diego Ghiringhelli Azevedo, director da Escola Superior de Defesa do Consumidor do Rio Grande do Sul
O antigo monopólio francês da electricidade – a EDF -, em vez de proceder ao “corte” da energia por incumprimento dos consumidores, adopta conduta diferente: passa a aplicar uma redução da potência contratada.
A EDF, a principal empresa de distribuição de energia em França, anunciou a 12 de Novembro em curso, que deixaria de suspender o fornecimento de electricidade aos consumidores que se achassem em situação de incumprimento, não somente durante as tréguas invernais (do 1.º de Novembro a 31 de Março, como o impõe, por razões de humanidade, um decreto presidencial de antanho), mas durante todo o ano.
De há muito que uma tal medida fora reclamada pela Fundação Abade Pierre (Fondation Abbé Pierre) ante a situação de penúria de muitas famílias e as privações de que penosamente padecem, com a agravante das situações criadas pela pandemia em curso (SARS Cov 2).
A partir do 1.º de Abril do próximo ano, a EDF procederá à diminuição da potência contratada (uma espécie de Minilec de Catherine Spaak, a deputada que, na Bélgica, em plenos anos 70 do século passado, entendia – e seguramente que bem! - que todos os cidadãos teriam direito a um mínimo de electricidade compaginável com os níveis civilizacionais da Humanidade) a 1 KVA, o que permitirá às famílias e aos cidadãos singulares ter acesso a coisas tão basilares como o funcionamento do frigorífico (geladeira para os brasileiros, geleira para os angolanos) ou o recarregamento dos equipamentos eléctricos, para além da luz de iluminação.
Tal medida, anuncia a EDF, “aplicar-se-á a todas as situações, salvo se houver uma qualquer impossibilidade física ou técnica de limitação da potência de alimentação eléctrica da habitação”.
No comunicado emitido sexta-feira última, a EDF sublinha que privilegia, há já alguns anos, a limitação da potência ao corte da electricidade. A EDF tem uma massa de clientes que ultrapassa os 22, 3 milhões de particulares e empresas. Uma tal prática, assegura, permitiu reduzir em 1/3, em cinco anos, o número de “cortes”.
Segundo o quotidiano parisiense “Le Figaro”, entre 200 000 e 300 000 fogos, todos os anos, sofrem com o ‘corte’ da energia eléctrica em razão do não pagamento no tempo e no lugar próprios das facturas apresentadas para o efeito.
Segundo o “Médiateur de l’ Énergie” (Ombudsperson, Ouvidor, Provedor da Energia, em versão portuguesa, em paralelo com Provedor de Justiça, hoje uma Ombudswoman), 5,6 milhões de lares estão em permanência em situação de precariedade energética, em França.
20% dos franceses passam frio durante a invernia
De harmonia com o último Barómetro Anual, publicado o mês transacto, 20% dos franceses (a França tem uma população da ordem das 66 000 000 almas) teriam declarado passar frio em suas próprias casas no decurso do inverno, 36% dos quais por razões eminentemente financeiras (qualquer coisa como 23 760 000 de pessoas).
O Mediador francês da Energia, em audiência perante o Parlamento francês, quarta-feira da semana passada (10 de Novembro em curso), declarou [o que, afinal, vimos de há muito dizendo, na esteira da notável Catherine Spaak, filha do secretário-geral da OTAN, Paul Henri Spaak (1957/60), primeiro presidente do Parlamento Europeu (1952-54) e primeiro-ministro belga (1946 – 1947/49)] com particular ênfase, que é favorável a que se dê expressão a um “direito a um abastecimento mínimo de electricidade” (“droit à une alimentation minimale en électricité”) para os lares.
Em França, o Código da Energia define a electricidade “como um produto de ‘primeira necessidade’”, o que o Mediador elementarmente recordou, ao declarar que “sem electricidade, não há luz, não há aquecimento, não há acesso nem à internet nem ao telefone”.
Como se afirma a tal propósito, “as medidas tomadas pelo Governo para prevenir uma precarização energética das famílias – a atribuição de um cheque de energia suplementar de 100€ e a paralisação das tarifas regulamentadas do gás e da electricidade para 2022 – são soluções de emergência e a curto prazo, mas que não resolvem a questão do acesso a um quantum mínimo de electricidade”, como o adverte o Mediador.
O problema não é restrito a França.
O exemplo, porém, parece eloquente!
No que nos toca, entendemos que há que encarar decisivamente toda a sorte de questões que emergem dos serviços de interesse económico geral – entre nós, ainda denominados “serviços públicos essenciais” – onde as carências das famílias são manifestas e a carestia enormemente evidenciada ante os réditos de uma parte imensa da população. O que provoca as maiores tormentas.
Está por fazer uma adequada reflexão neste particular, envolvendo necessariamente os preços dos combustíveis e o seu regime fiscal com notórios reflexos no pão e no mais bens de primeira necessidade!
Com a política aos tombos e a instabilidade instalada, nada se fará sem tranquilidade nem um cerrado propósito de acerto.
Sempre sustentáveis que o “corte” não pode estar ao alcance de quem tem a “faca e o queijo na mão”!
É de direitos humanos que se trata, sejam ou não como tal declarados!
É de DIREITOS HUMANOS que se trata, pois!
Mário Frota
Fundador da apDC –DIREITO DO CONSUMO - Coimbra
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