segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Qual é a “tua”, oh MEO?

A D. Mariazinha foi à Retrosaria “Linhas Cruzadas” e pediu que lhe aviassem dois carros de linha 50, dois novelos de lã 30, uma agulha de 3, 5’ e dois dedais.

Contas feitas, o valor é de 8,35€. Porém, as coisas não se ficam por aí. A Aninhas, que tomou a loja por trespasse, tem ideias avançadas e uma gestão inovadora, lança no final esta rubrica: factura em papel – 1€.

Agora sim, total: 9,35€

Ora, a cobrança de 1€ é, por direitas contas, ilícita.

Quem cobra o que não deve comete o crime de especulação.

Moldura penal: 6 meses a 3 anos de prisão e multa não inferior a 100 dias. Por dia de multa, um montante até 500€.

No entanto, a MEO exige agora, a partir de Abril de 2018, a quem não se submeta à regra da factura pela internet, 1€ pela sua emissão.

Há quem estrebuche. Mas nada se viu ainda de palpável em termos de reacção geral, a não ser a denúncia que depositámos na ANACOM – Autoridade Nacional de Comunicações, entidade reguladora.

Calcorreámos a região assolada pelos fogos: o que se ouve das agressões da MEO ao estatuto dos consumidores é algo de inenarrável!

E no que toca à factura, o que diz, no seu artigo 9.º, a Lei dos Serviços Públicos Essenciais?

“1 - O utente tem direito a uma factura que especifique devidamente os valores que apresenta.

2 - A factura a que se refere o número anterior deve ter uma periodicidade mensal, devendo discriminar os serviços prestados e as correspondentes tarifas.

3 - No caso do serviço de comunicações electrónicas, e a pedido do interessado, a factura deve traduzir com o maior pormenor possível os serviços prestados, sem prejuízo do legalmente estabelecido em matéria de salvaguarda dos direitos à privacidade e ao sigilo das comunicações.

4 - Quanto ao serviço de fornecimento de energia eléctrica, a factura referida no n.º 1 deve discriminar, individualmente, o montante referente aos bens fornecidos ou serviços prestados, bem como cada custo referente a medidas de política energética, de sustentabilidade ou de interesse económico geral (geralmente denominado de custo de interesse económico geral), e outras taxas e contribuições previstas na lei.

5 - O disposto no número anterior não poderá constituir um acréscimo do valor da factura.”

A MEO não pode cobrar qualquer montante pela emissão das facturas em papel.

Se individualmente tal pode constituir, ao fim de um ano, 12€/ por consumidor, em termos gerais tal é susceptível de representar uma vantagem ilícita, um enriquecimento injusto de milhões.

Nem vale a pena aduzir argumentos, por tão evidentes, para justificar a não exigência, tanto mais que cerca de 40% da população (ou mais) não tem acesso à rede, por muito que se “doure a pílula”…

Já o Tribunal Arbitral Nacional de Conflitos de Consumo, por sentença de 31 de Dezembro de 2014, decretara:

“A NOS Comunicações, SA, informou o consumidor, na factura de Dezembro de 2012, que a partir de Janeiro de 2013 passaria a ser cobrado o valor de € 0,80 pelo envio de factura detalhada em papel. O C. não tem conhecimentos informáticos nem meios electrónicos que lhe permitam aceder à facturação através da Internet e que solicitou o envio de factura detalhada.”

Tenha ou não acesso à internet, o facto é que pela emissão da factura não pode cobrar-se o que quer que seja: é algo que se incorpora nos encargos gerais, que se inclui no preço do produto ou serviço.

A ANACOM já deveria ter agido. A omissão, neste particular, é grave! Os consumidores exigem mais de um regulador.

Que tem de estar atento aos sinais. Que tem de prevenir!

Que tem de ser lesto na intervenção!

(escrito de 21 de Março de 2018)

Mário Frota

apDC - DIREITO DO CONSUMO - Coimbra

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