(04 de Agosto de 2023, in diário “As Beiras”)
É que de coisas menores (?) se
desimportam os consumidores… em prol dos fornecedores!
“Uma avaria no fecho
das portas de um automóvel, uma deslocação à oficina, a reparação efectuada e a
factura respectiva apresentada no acto.
Volvidos 7 meses, de novo a avaria no fecho das portas.
Exactamente das portas que haviam sido reparadas. O regresso à oficina. A
exigência de reparação. E, na recolha do veículo, nova factura. Cento e noventa
euros.
O consumidor pagou. Mas ficou a ruminar na ideia. Então não
era a mesma avaria? E estas reparações não têm garantia?”
É que a reparação
Também tem garantia
São 3 anos sem excepção,
Sem qualquer ‘amnistia’…
Perante a questão suscitada, convém consultar a Lei da Compra
e Venda dos Bens de Consumo em que se regram os aspectos inerentes às
garantias:
1.
A
Lei da Compra e Venda dos Bens de Consumo de 18 de Outubro de 2021, em que de
novo se disciplina a garantia de coisas móveis e imóveis, diz de modo expresso na
al. b) do n.º 1 do seu art.º 3.º:
“O
presente [regime] aplica-se aos bens [reparados] no âmbito de um contrato de
prestação de serviços”.
2.
Ora,
de harmonia com o n.º 1 do seu art.º 12.º, sob a epígrafe “responsabilidade do
profissional em caso de [não] conformidade”, se prescreve que
“o profissional é responsável por
qualquer [não] conformidade que se manifeste no prazo de três anos a contar da
entrega do bem.”
3.
Logo,
consumidor, após a reparação beneficia de uma garantia de 3 anos sobre os
pontos específicos objecto da intervenção do profissional, no caso da oficina.
4.
Não
terá, por conseguinte, de efectuar qualquer pagamento como se fosse uma nova e
distinta reparação, quando, afinal, da mesma avaria se tratou.
5.
A
cobrança do montante a que se alude – 190 € - é susceptível de configurar um crime de especulação, previsto e punido
pela Lei Penal do Consumo de 1984, no seu art.º 35.
6.
A
moldura penal da especulação comina com prisão e multa: prisão de seis meses a
três anos e multa não inferior a 100 dias, sendo que cada um dos dias, no
limite, pode atingir 500 €.
7.
Até
se acredita que seja por ignorância do responsável pela oficina que a factura
do serviço prestado haja sido apresentada.
8.
No
entanto, a ignorância, neste passo não escusa.
9.
Claro
que há para aí umas ‘histórias’ mal contadas quando, em estudo recente,
encomendado pela Direcção-Geral do Consumidor, se afirma que cerca de 90% dos agentes
económicos conhecem os direitos dos consumidores. O que é redondamente falso
porque a informação, nem sequer a mais elementar, como no caso, lhes chega… por
incumprimento do Estado da sua missão de informar por mor do art.º 4.º da Lei
34/2004 e do art.º 50 do DL 84/2021!
EM CONCLUSÃO
a.
A
Lei da Compra e Venda de Bens de Consumo
não se restringe simplesmente, como o nome sugere, à compra e venda, antes se
aplica também à empreitada, a outras prestações de serviços e à locação de bens
móveis e imóveis (DL 84/2021: art.º 3.º)
b.
Aplica-se,
por conseguinte a qualquer reparação de um bem móvel, como no caso (DL 84/2021:
al. b) do n.º 1 do art.º 3.º)
c.
O
profissional é responsável por qualquer [não] conformidade que se manifeste no prazo
de três anos a contar da entrega do bem, ou seja, uma qualquer reparação tem
uma garantia de três anos (DL 84/2021: n.º 1 do art.º 12)
d.
Pretendendo
o profissional cobrar um serviço coberto pela garantia, comete, ao que parece,
um crime de especulação (DL 28/84: art.º 35)
e.
A
moldura penal do crime de especulação é de prisão e multa: seis meses a três
anos de prisão e multa não inferior a 100 dias (Dl28/84: idem).
Mário Frota
presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO , Portugal