(Artigo
de opinião publicado no Diário ‘As Beiras’,editado
em Coimbra a 21 de Novembro de 2022)
A tarifa
social da Internet constituía uma bandeira pela democraticidade do acesso a
serviços nela dispensados, algo que, de resto, se consubstancia como direito
humano no quadro da informação e da comunicação universal nos tempos que
correm.
E porque razão é que dos 780 000 consumidores
que se estimava pudessem beneficiar da tarifa social da Internet, menos de 780
(!!!) a tal se houvessem candidatado de Janeiro (?) a 30 de Outubro p.º p.º?
Porque não há informação específica que
chegue aos meios desfavorecidos… aos seus destinatários preferenciais!
Claro que há outras circunstâncias que o
Regulador avança em razão da reflexão que os seus quadros terão excogitado. E é
susceptível de se perfilar como segue:
‘O nível de
pedidos é "influenciado por vários factores": a título ilustrativo,
as restrições associadas às fidelizações das ofertas comerciais de comunicações
electrónicas dificultam, por si só, a adesão de potenciais beneficiários. Se se
dispuser já de um serviço de comunicações objecto de contrato com acesso à internet,
e o período de vinculação estiver ainda a decorrer, o cancelamento do pacote é
susceptível de acarretar uma penalização, por aplicação da lei.”
Ao que acresce,
sustenta-se, "a prática comercial das principais empresas, que oferecem serviços
em pacote, sem dispor, em simultaneidade, de ofertas competitivas isoladas,
serviço a serviço".
O regulador
alega que tal "torna inviável que o
consumidor abandone o pacote e subscreva o serviço de internet associado à
tarifa social isoladamente".
Ademais, a
tarifa social de internet não contempla um serviço básico de televisão ou de
telefone.
O que é, com
efeito, limitativo… porque de todo desenquadrado do contexto.
Prevê o
Regulador que "a utilidade" da tarifa social de internet se "esvaziará"
perante o quadro actual em que 4,5 milhões de consumidores dispõem já de
pacotes com uma multiplicidade de serviços à sua disposição.
"As
características da oferta associada à tarifa social e o grau de iliteracia
digital da população serão outras potenciais razões para a reduzida adesão
verificada", argumenta-se.
Ademais, as
condições propiciadas pelo Governo fogem do desenho que o próprio Regulador traçara
e que era, de todo mais favorável aos mais desfavorecidos.
Mas não se
ignore que a “tarifa social” se submete ao índice mais elevado do IVA, que de
todo se não compagina com as características que deveriam enformar um serviço
do estilo.
O mais relevante, ao que se nos afigura, e
a que não é alheio também o montante exigido à cabeça, como o valor a que acresce
um imposto da ordem dos 23%, parece ser, com efeito, a manifesta ausência de
informação dirigida aos vulneráveis, hipervulneráveis e hipossuficientes… ,
vale dizer, aos info-excluídos, afinal. Porque é desses que se trata, que é a
eles que a tarifa se oferece e contempla.
E escusam as notabilidades do Governo (e,
quiçá, da Regulação, que ainda assim é das mais actuantes e desipotecadas dos
interesses postulados pelo poder político), e dos institutos pagos com os impostos de
todos nós de nomear comissões para apurar, afinal, o fracasso da medida!
A fórmula quanto a nós paira diante dos
olhos.
Usem as televisões e as rádios pagas
directamente pelos consumidores e contribuintes, não para propaganda dos actos
do poder, mas para informação dos beneficiários à míngua de atenção, para a
informação dos consumidores em geral!
Dêem expressão a preceitos legais que
continuam, anos volvidos, em estado de torpor, em hibernação.
Porque não fazer sair do
papel este preceito da Lei-Quadro de Defesa do Consumidor, que há mais de 26
anos espera pacientemente concretize?
“1 - Incumbe
ao Estado, às regiões autónomas e às autarquias locais desenvolver acções e
adoptar medidas tendentes à informação em geral do consumidor, designadamente
através de:
…
b) Criação de
serviços municipais de informação ao consumidor;
e) Criação de
bases de dados e arquivos digitais acessíveis em matéria de direitos do consumidor, de acesso incondicionado.
2 - O
serviço público de rádio e de televisão deve reservar espaços, em termos que a
lei definirá, para a promoção dos interesses e direitos do consumidor.”
E porque não
concretizar o que na Lei do Acesso ao Direito e à Justiça, de 29 de
Julho de 2004, se condensa?
“Incumbe ao Estado realizar, de modo permanente e planeado,
acções tendentes a tornar conhecido o direito e o ordenamento legal, através de
publicação e de outras formas de comunicação, com vista a proporcionar um
melhor exercício dos direitos e o cumprimento dos deveres legalmente
estabelecidos.”
Se houvesse em Portugal uma cultura de informação e tais preceitos
não fossem autêntica letra morta, o panorama seria decerto distinto!
Malfadadamente, à transparência prefere-se, entre nós, a opacidade!
Mário Frota
presidente emérito da
apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal