“O meu filho, que
mora na Grande Lisboa, comprou há cerca de 3 meses, num “stand” do Porto, um
carro em segunda mão, por 18.500 euros. Dias depois, o carro acendeu as luzes
de emergência, pois algo estava a funcionar mal ou não funcionava de todo.
Entrou em contacto
com o “stand”, que o aconselhou a enviar o carro para lá para se inteirarem do
que se passava,
Dias depois, davam o
carro como reparado: um pequeno problema no sistema de abastecimento de
combustível, mais propriamente nos bicos injectores.
É de referir que o
meu filho trabalha fora de Portugal: um mês num país, 15 dias em casa… Pouco
anda, pois, no carro.
Regressou agora de
uma das suas estadas: pegou no carro e verificou que voltara a ter o mesmo problema;
as luzes vermelhas acendiam e o carro deixava de puxar, chegando mesmo a parar.
O responsável do “stand”, muito educadamente, aliás, pediu que o levasse
de novo para reparação, mas da conversa o meu filho ter-se-á apercebido que se
preparam para descartar responsabilidades porque os bicos injectores se
desgastam, com o uso.... e, portanto, estarão fora da garantia.
O vendedor é
obrigado ou não a reparar completamente a viatura ou pode muito simpaticamente
dizer que o carro necessita de injectores novos e que portanto colocam as peças,
não levando dinheiro pela mão d' obra, mas pagando-as o meu filho (e o seu
custo ascende ainda a uns milhares de euros)?”
Apreciada a questão,
cumpre emitir parecer:
1.
A garantia é de toda a coisa e da
coisa toda: e a integridade das partes componentes deve ser assegurada durante
o período da garantia legal ou contratual. Em princípio, sem quaisquer
restrições.
2.
É ao fornecedor que incumbe, ao
relançar no mercado veículos usados, fazê-lo de molde a que no decurso da
garantia legal não haja necessidade de qualquer intervenção.
3.
A garantia de usados, se não tiver
havido qualquer acordo em contrário, é de 3 anos, talqualmente para os novos,
segundo a Lei Nova.
4.
A lei concede, porém, a faculdade de
haver, por acordo, uma redução da
garantia até aos 18 meses: o que quer significar que a garantia de usados pode
ser de 20, 22, 24 meses… nunca, porém, abaixo dos 18 meses.
5.
A presunção
de não conformidade da coisa com o contrato, no caso dos usados, é de 1 ano se a garantia for,
entretanto, reduzida por acordo.
6.
Se se tratar de bem novo, a presunção de não conformidade é de dois
anos a contar da data da entrega da coisa.
7.
Decorrido tal prazo, num e noutro
casos, cabe ao consumidor a prova, nem sempre fácil, de que a não conformidade
existia já à data da entrega do bem.
8.
O
fornecedor pode, porém, recusar a
reposição da conformidade do bem se a reparação ou a substituição for impossível
ou impuser custos desproporcionados, tendo em conta todas as circunstâncias.
9.
Ao
consumidor restará, então, escolher
entre a redução proporcional do preço e o pôr termo ao contrato [a sua resolução], caso o fornecedor:
9.1. Não tenha efectuado pura e
simplesmente a reparação ou a substituição do bem;
9.2. Não tenha efectuado a
reparação ou a substituição do bem [a título gratuito, num
prazo razoável e sem grave inconveniente
para o consumidor];
9.3. Tenha recusado expressamente a
reposição da conformidade do bem;
9.4. Tenha declarado, ou resulte
evidente das circunstâncias, que não vai repor os bens em conformidade num
prazo razoável ou sem grave inconveniente para o consumidor;
9.5.A não conformidade tenha
reaparecido apesar da tentativa de o fornecedor proceder à reposição;
9.6. Ocorra uma nova não conformidade; ou
9.7. A gravidade da não conformidade justifique a
imediata redução do preço ou a extinção do contrato [por meio de resolução].
10.
Por conseguinte, tendo passado apenas
escassos meses sobre a compra e venda, cabe, em tais termos, ao fornecedor
assegurar em plenitude, na íntegra, a garantia, ou recusar-se a fazê-lo, se com
fundamento para tal e com as reacções daí emergentes.
11.
E a título gratuito, o que quer
significar, segundo a lei, “livre dos custos necessários incorridos para repor
os bens em conformidade, nomeadamente o custo de porte postal, transporte,
mão-de-obra ou materiais”.
12.
Convém não olvidar que por cada
reparação acresce a garantia de seis
meses à que resulta da lei ou, no caso, se convencionou. Sem tirar nem pôr.
13.
Na vertente situação, a garantia, em
razão de uma primeira reparação, é já de 24
meses, se acaso tiver havido, por acordo, a redução aos 18 meses ou com
prazo superior se por período mais dilatado.
EM
CONCLUSÃO
a.
Efectuada a primeira reparação, no
quadro da garantia de usados, que ou é de 3 anos ou, por acordo, de prazo não
inferior a 18 meses, o fornecedor poderá recusar a segunda se a reposição de
conformidade por meio da reparação for excessivamente onerosa.
b.
E a garantia tem de abarcar toda a
coisa e a coisa toda, sem excepções, de modo de todo gratuito.
c.
Se o consumidor o recusar
fundadamente, caberá ao consumidor o direito de provocar a redução do preço,
mantendo o contrato, ou o de o desfazer, fazendo-o cessar por meio da
resolução.
Mário Frota
presidente emérito
apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal