António da
Costa Neves Ribeiro, que fora, a um tempo, vice-presidente do Supremo
Tribunal de Justiça e presidente do Conselho Geral da apDC, num artigo sob o
título em epígrafe, registara:
“1. O consumidor acabará sempre por pagar a factura!
Se não paga, então, mais tarde ou mais cedo,
cortam-lhe a água, a luz, o gás ou o telefone.
Poupa na água, não se aquece. E tem o telefone só para
receber chamadas da filha que vive em Lisboa.
Não telefona para ninguém!
Um dia, chega-lhe a factura da luz.
2. Ora, andou a mulher a poupar no gasto, deitou-se
mais cedo, não acendeu a televisão, rapou frio de rachar para evitar ligar o
“radiador”, e pagou três vezes mais do que gastou.
São gastos essenciais à vida. Não se pode ir para a
cama com as galinhas, nem apanhar por sacrifício, frio de rachar, ou estar
sempre a apagar a luz. E por aí fora…!
Por isso, a mulher reclamou uma vez… duas vezes, e
sempre a mesma resposta de quem “fala, fala e não faz nada”!
A mulher releu a factura da luz… do telefone.
Queixou-se à filha que vive em Lisboa.
E esta
reportou-lhe as somas líquidas dos lucros da EDP, da PT e de outros
fornecedores de bens de consumo essenciais.
E então, quem dá voz à minha razão, perguntou a mãe
irritada, como se a filha, silenciosa, tivesse culpa de tudo?
Não sei – respondeu a voz de Lisboa! O melhor é voltar
a reclamar!
3. Cumprimento, pois, a apDC - Associação Portuguesa
Direito do Consumo, e particularmente o seu presidente, e tiro-lhe o meu chapéu
por, ao longo de vários anos (pelo menos, desde 1988), ter sido a voz dos que,
cheios de razão moral, não têm voz para se queixar, porque não se aquecem,
porque não telefonam, porque são enganados no quotidiano das suas vidas, sem
nenhuma hipótese efectiva de defesa dos seus direitos.
A sua voz tem sido a voz de… ; a sua defesa tem sido a
palavra da Associação a que ele dá corpo e alma.”
Como dissemos algures:
Neves Ribeiro jamais se dissociou dos reais problemas do País real, do País profundo, e
da sorte dos desvalidos da fortuna! Jamais se deixou encarcerar nas Torres de
Marfim para que determinados lugares persistentemente convidam.
Neves Ribeiro era Homem de uma rara percepção dos problemas correntes com que se
confrontavam os consumidores. E da Carta de Direitos que constituía como que
uma sua Carta de Alforria, em que se resgata a própria Cidadania que não pode
de nenhum modo “andar a ferros”…
Neves Ribeiro deu um excelso testemunho de vida ao alinhar por quantos não se aquecem
nos rigores do inverno, não fruem dos fulgores civilizacionais das energias de
ponta, não se comunicam porque já ninguém o faz por sinais de fumo ou pelo som
do tan-tan de que os primitivos se socorriam, não desfrutam dos benefícios que
as tecnologias "impuseram" à vida dos mais afortunados, mergulhados
num pântano de exclusões que os poderes das majestáticas e das cosmo-empresas
vão alimentando impiedosamente…
E fazia-o com uma rara distinção, em gestos de tocante
solidariedade, discreta mas empenhadamente, sem alardes, que os que consigo
privavam captavam cirurgicamente.
Na simplicidade de que se ornava e que era autêntica
porque nela fundava toda a sua personalidade!
A Casa que ajudou a erguer – a apDC - e que se sustém
pelo acrisolado amor dos que persistem em não deslustrar o Ideal de Cidadania,
que nela se imbrica e que era o seu, rende-se ao seu Exemplo de Homem, de
Magistrado, de Cidadão.
A insaciável sede de justiça que o dominava é também
obsessão nossa!
Mário Frota
apDC - DIREITO
DO CONSUMO - Coimbra
Ver vídeo: https://www.facebook.com/mario.frota.3/videos/10218042529128940
Projecto com o apoio do Fundo do Consumidor