RÁDIO VALOR LOCAL
DIRE©TO AO CONSUMO
“INFORMAR PARA PREVENIR
PREVENIR PARA NÃO REMEDIAR”
PROGRAMA
28 de Outubro de 2025
CONSULTÓRIO
VL
Joana Sousa - Alenquer
“Comprei um casaco numa loja de roupa e,
ao chegar a casa, vi que não me assentava bem.
Voltei à loja dois dias depois, com o talão, mas disseram-me que só faziam trocas, nunca devoluções em dinheiro.
Pergunta: a loja pode impor essa regra, mesmo que o produto esteja novo e comprado há menos de 14 dias?”
MF
Se a venda não tiver sido feita a contento (a gosto) nem sujeita a prova, estaremos perante um contrato que, como diz a lei, só é susceptível de se modificar ou extinguir, nos termos da lei.
Trata-se de uma compra e venda firme.
E, por isso, não se pode desfazer ao livre alvedrio de qualquer dos contraentes.
Os canonistas diziam “pacta sunt servanda”: os pactos são para ser cumpridos; os acordos têm de ser cumpridos nem que chovam picaretas, dizia o povo.
O que é uma venda a contento (ou a gosto)?
É a compra e venda feita sob reserva de a coisa agradar ao comprador.
E vale, em princípio, não como contrato, mas como mera proposta de venda.
Diz a lei que a coisa deve ser facultado ao comprador para exame.
A proposta considera-se aceita se, entregue a coisa ao comprador, este não se pronunciar dentro do prazo da aceitação, que o vendedor fixará.
Mas a venda a contento pode ser já um contrato, noutra das modalidades.
Diz o Código Civil: Se as partes estiverem de acordo sobre a resolução da compra e venda no caso de a coisa não agradar ao comprador, aplica-se a disciplina da resolução, ou seja, a coisa tem efeito retroactivo: devolve-se a coisa e restitui-se o preço.
O vendedor pode fixar um prazo razoável para a resolução, se nenhum for estabelecido pelo contrato ou, no silêncio deste, pelos usos.
Mas há também a denominada venda sujeita a prova.
A mulher que vai à loja, porque o marido não tem tempo para se deslocar, e que leva para casa uns sapatos ou umas camisas para ele provar. Se ficar bem, se a coisa servir, fecha-se o contrato. Se não, devolve-se e recebe-se o dinheiro de volta.
Venda sujeita a prova: a de a coisa ser idónea para o fim a que se destina: se serve, serve, se não serve, devolve-se e recebe-se o dinheiro de volta.
Ora, só se o casaco apresentasse uma qualquer não conformidade poderia exigir a substituição e, detectado o vício nos primeiros 30 dias, a devolução da coisa com a restituição do preço pago.
Agora, nestes termos, em que a compra é firme, se nenhuma falta de conformidade houver, o estabelecimento não tem de aceitar a devolução pura e simples.
E constitui uso comercial a hipótese de aceitar a devolução contra um vale para a compra de outro qualquer bem no tempo em que o consumidor o pretender, não se justificando o estabelecimento de qualquer prazo sob pena de perda do dinheiro.
Os 14 dias a que a ouvinte se refere são só observáveis nos contratos fora de estabelecimento, nos contratos por telefone, nos contratos electrónicos, no âmbito do comércio electrónico. Com duas excepções, porém: nos contratos ao domicílio o prazo não é de 14 dias, mas de 30. Exactamente como nos contratos no decurso de uma excursão organizada pelo fornecedor.
Se, porém, do contrato não constar o período dentro do qual os consumidores poderão dar o dito por não dito, os 14 e os 30 dias, respectivamente, acresce a esses prazos o de 12 meses dentro dos quais poderá exercer esse seu direito.
VL
Ricardo Cordeiro - Cartaxo
“Sem que nada o fizesse prever
verifiquei que saiu da minha conta, novas comissões mensais. Em causa, foi o
que me disserem, um “pacote de manutenção” que nunca tinha sido acordado.
No balcão garantiram-me que era uma “actualização automática”.
Perguntava se o banco pode alterar unilateralmente as condições do contrato sem consentimento expresso do cliente?”
MF
A Lei-Quadro de Defesa do Consumidor estabelece, em geral, que a informação tem de ser prévia, no seu artigo 7.º, sob a epígrafe “informação em particular”.
Mas também o seu artigo 9.º- A prescreve que:
1 - Antes de o consumidor ficar vinculado pelo contrato ou oferta, o fornecedor de bens ou prestador de serviços tem de obter o acordo expresso do consumidor para qualquer pagamento adicional que acresça à contraprestação acordada relativamente à obrigação contratual principal do fornecedor de bens ou prestador de serviços.
2 - A obrigação de pagamentos adicionais depende da sua comunicação clara e compreensível ao consumidor, sendo inválida a aceitação pelo consumidor quando não lhe tiver sido dada a possibilidade de optar pela inclusão ou não desses pagamentos adicionais.
3 - Quando, em lugar do acordo explícito do consumidor, a obrigação de pagamento adicional resultar de opções estabelecidas por defeito que tivessem de ser recusadas para evitar o pagamento adicional, o consumidor tem direito à restituição do referido pagamento.
Além disso, a Lei das Condições Gerais dos Contratos estabelece na al. c) do n.º 1 do art.º 22 que:
1 - São proibidas, consoante o quadro negocial padronizado, designadamente, as cláusulas contratuais gerais que:
c) Atribuam a quem as predisponha o direito de alterar unilateralmente os termos do contrato, excepto se existir razão atendível que as partes tenham convencionado;
E ainda com as seguintes excepções:
O disposto na alínea c) do número anterior não determina a proibição de cláusulas contratuais gerais que:
a) Concedam ao fornecedor de serviços financeiros o direito de alterar a taxa de juro ou o montante de quaisquer outros encargos aplicáveis, desde que correspondam a variações do mercado e sejam comunicadas de imediato, por escrito, à contraparte, podendo esta resolver o contrato com fundamento na mencionada alteração;
b) Atribuam a quem as predisponha o direito de alterar unilateralmente o conteúdo de um contrato de duração indeterminada, contanto que se preveja o dever de informar a contraparte com pré-aviso razoável e se lhe dê a faculdade de resolver o contrato.
Por conseguinte, não é lícito que haja tais alterações.
E, por isso, não nem de efectuar quaisquer pagamentos suplementares, devendo restituir-se-lhe tudo o que pagou a mais.
Denuncie o caso ao Banco de Portugal.
VL
Anabela Agostinho – Vila Franca
Eu e o meu marido tínhamos uma viagem
marcada para Roma, mas a companhia aérea cancelou o voo. Deram-nos um voucher
válido por 12 meses, mas nós preferíamos receber o dinheiro de volta. Gostava
de saber: em que situações o passageiro tem direito ao reembolso em dinheiro e
quando é que é obrigado a aceitar um crédito futuro?
MF
Eis os direitos que têm e vêm directamente do Regulamento Europeu de 2004:
Artigo 5.º
Cancelamento
1. Em caso de cancelamento de um voo, os passageiros em causa têm direito a:
a) Receber da transportadora aérea operadora assistência nos termos do artigo 8.º; e
b) Receber da transportadora aérea operadora assistência nos termos da alínea a) do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 9.º, bem como, em caso de reencaminhamento quando a hora de partida razoavelmente prevista do novo voo for, pelo menos, o dia após a partida que estava programada para o voo cancelado, a assistência especificada nas alíneas b) e c) do n.º 1 do artigo 9.º; e
c) Receber da transportadora aérea operadora indemnização nos termos do artigo 7.º, salvo se:
i) tiverem sido informados do cancelamento pelo menos duas semanas antes da hora programada de partida, ou
ii) tiverem sido informados do cancelamento entre duas semanas e sete dias antes da hora programada de partida e se lhes tiver sido oferecido reencaminhamento que lhes permitisse partir até duas horas antes da hora programada de partida e chegar ao destino final até quatro horas depois da hora programada de chegada, ou
iii) tiverem sido informados do cancelamento menos de sete dias antes da hora programada de partida e se lhes tiver sido oferecido reencaminhamento que lhes permitisse partir até uma hora antes da hora programada de partida e chegar ao destino final até duas horas depois da hora programada de chegada.
2. Ao informar os passageiros do cancelamento, devem ser prestados esclarecimentos sobre eventuais transportes alternativos.
3. A transportadora aérea operadora não é obrigada a pagar uma indemnização nos termos do artigo 7.º, se puder provar que o cancelamento se ficou a dever a circunstâncias extraordinárias que não poderiam ter sido evitadas mesmo que tivessem sido tomadas todas as medidas razoáveis.
4. O ónus da prova relativamente à questão de saber se e quando foi o passageiro informado do cancelamento, recai sobre a transportadora aérea operadora.
Eis os valores e os requisitos da indemnização que o Regulamento estabelece:
Direito a indemnização
1. Em caso de remissão para o presente artigo, os passageiros devem receber uma indemnização no valor de:
a) 250 euros para todos os voos até 1500 quilómetros;
b) 400 euros para todos os voos intracomunitários com mais de 1500 quilómetros e para todos os outros voos entre 1500 e 3500 quilómetros;
c) 600 euros para todos os voos não abrangidos pelas alíneas a) ou b).
Na determinação da distância a considerar, deve tomar-se como base o último destino a que o passageiro chegará com atraso em relação à hora programada devido à recusa de embarque ou ao cancelamento.
2. Quando for oferecido aos passageiros reencaminhamento para o seu destino final num voo alternativo nos termos do artigo 8.o, cuja hora de chegada não exceda a hora programada de chegada do voo originalmente reservado:
a) Em duas horas, no caso de quaisquer voos até 1500 quilómetros; ou
b) Em três horas, no caso de quaisquer voos intracomunitários com mais de 1500 quilómetros e no de quaisquer outros voos entre 1500 e 3500 quilómetros; ou
c) Em quatro horas, no caso de quaisquer voos não abrangidos pelas alíneas a) ou b), a transportadora aérea operadora pode reduzir a indemnização fixada no n.o 1 em 50 %.
3. A indemnização referida no n.o 1 deve ser paga em numerário, através de transferência bancária electrónica, de ordens de pagamento bancário, de cheques bancários ou, com o acordo escrito do passageiro, através de vales de viagem e/ou outros serviços.
4. As distâncias referidas devem ser medidas pelo método da rota ortodrómica.”
Tem ainda eventualmente direito a reembolso.
Artigo 8.º
Direito a reembolso ou reencaminhamento
1. Em caso de remissão para o presente artigo, deve ser oferecida aos passageiros a escolha entre:
a) - O reembolso no prazo de sete dias, de acordo com as modalidades previstas no n. 3 do artigo 7.º, do preço total de compra do bilhete, para a parte ou partes da viagem não efectuadas, e para a parte ou partes da viagem já efectuadas se o voo já não se justificar em relação ao plano inicial de viagem, cumulativamente, nos casos em que se justifique,
- um voo de regresso para o primeiro ponto de partida;
b) O reencaminhamento, em condições de transporte equivalentes, para o seu destino final, na primeira oportunidade; ou
c) O reencaminhamento, em condições de transporte equivalentes, para o seu destino final numa data posterior, da conveniência do passageiro, sujeito à disponibilidade de lugares.
2. A alínea a) do n.o 1 aplica-se igualmente aos passageiros cujos voos fazem parte de uma viagem organizada, salvo quanto ao direito a reembolso quando este se constitua ao abrigo da Directiva 90/314/CEE.
3. Sempre que uma cidade ou região for servida por vários aeroportos e uma transportadora aérea operadora oferecer aos passageiros um voo para um aeroporto alternativo em relação àquele para o qual tinha sido feita a reserva, a transportadora aérea operadora deve suportar o custo da transferência do passageiro desse aeroporto alternativo para o aeroporto para o qual a reserva tinha sido feita, ou para outro destino próximo acordado com o passageiro. nos n.ºs 1 e 2
Donde, não tem de aceitar o voucher.
E, perante os direitos enunciados, verificar se faz jus ou não à indemnização prevista neste instrumewnto normativo.
VL
Teresa Silva – Lisboa
Vi num folheto de um supermercado aqui no bairro um desconto num detergente,
mas quando fui à loja disseram-me que já não havia, e ainda faltavam dias para
o fim da promoção. Fiquei na dúvida: isto é publicidade enganosa ou basta ao
supermercado dizer que o produto esgotou?
MF
Rege aí a Lei das Práticas Comerciais Desleais de 26 de Março de 2008.
De harmonia com o artigo 8.º, constitui prática comercial desleal, na modalidade de enganosa.
São consideradas enganosas, diz-se em proémio, em qualquer circunstância, as seguintes práticas comerciais:
. Propor a aquisição de bens ou serviços a um determinado preço sem revelar a existência de quaisquer motivos razoáveis que o profissional possa ter para acreditar que não pode, ele próprio, fornecer ou indicar outro profissional que forneça os bens ou serviços em questão ou equivalentes, àquele preço durante um período e em quantidades razoáveis, tendo em conta o bem ou serviço, o volume da publicidade feita ao mesmo e os preços indicados;
. Propor a aquisição de bens ou serviços a um determinado preço e, com a intenção de promover um bem ou serviço diferente, recusar posteriormente apresentar aos consumidores o bem ou o serviço publicitado;
. Propor a aquisição de bens ou serviços a um determinado preço e, com a intenção de promover um bem ou serviço diferente, recusar as encomendas relativas a este bem ou serviço ou a sua entrega ou fornecimento num prazo razoável;
. Propor a aquisição de bens ou serviços a um determinado preço e, com a intenção de promover um bem ou serviço diferente, apresentar uma amostra defeituosa do produto;
. Declarar falsamente que o bem ou serviço está disponível apenas durante um período muito limitado ou que só está disponível em condições especiais por um período muito limitado a fim de obter uma decisão imediata e privar os consumidores da oportunidade ou do tempo suficientes para tomarem uma decisão esclarecida;
Qualquer destas situações conduz a uma contra-ordenação económica grave, graduada do modo que segue:
A coima que se lhe associa depende da dimensão da empresa, se micro, pequena, média ou grande:
. Micro-empresa: de 1 700 a 3 000 €
. Pequena empresa: de 4 000 a 8 000 €
. Média empresa: de 8 000 a 16 000 €
. Grande empresa: de 12 000 a 24 000 €
Se de pessoa singular se tratar, a coima oscilará entre 650 a 1 500 €.
VL
António Santos Silva – Alverca
Marquei uma consulta numa clínica
privada de Alverca. No site dizia que custava 45 euros, mas no dia cobraram-me
60, alegando que a tabela tinha sido actualizada. Gostava de saber se podem
alterar o preço sem avisar o cliente antes. E o que posso fazer neste caso.
MF
A Lei-Quadro de Defesa do Consumidor estabelece claramente na alínea c) do n.º 1 do seu artigo 8.º:
“O fornecedor de bens ou prestador de serviços deve, tanto na fase de negociações como na fase de celebração de um contrato, informar o consumidor de forma clara, objetiva e adequada, a não ser que essa informação resulte de forma clara e evidente do contexto, nomeadamente sobre:
§ Preço total dos bens ou serviços, incluindo os montantes das taxas e impostos…”
Logo, tudo se tem de processar em momento anterior ao da celebração do contrato.
Ademais, no n.º 5 do artigo 7.º da lei se estabelece imperativamente que:
“As informações concretas e objectivas contidas nas mensagens publicitárias de determinado bem, serviço ou direito consideram-se integradas no conteúdo dos contratos que se venham a celebrar após a sua emissão, tendo-se por não escritas as cláusulas contratuais em contrário.”
Não pode, pois, sem uma rectificação séria e suficientemente difundida, pelo mesmo modo em que aparece a publicidade e de forma robusta, alterar-se o preço de forma surpreendente, de molde a apresentar, no acto de pagamento, um preço-surpresa que em muito excede as bases em que o contrato se celebrou.
Menos ainda no momento do pagamento.
Estamos perante um crime de especulação, previsto e punido pela Lei Penal do Consumo, art.º 35, que comina pena de prisão de seis meses a três anos e multa não inferior a 100 dias a condutas tais.
Deve lavrar a sua reclamação no Livro respectivo, disponível na Clínica, ou no Livro Electrónico a que pode aceder nos termos gerais, se tal estiver ao seu alcance.

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