sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Erro sobre as qualidades da coisa? Ou garantia, que é outra loisa??

 


Artigo de Opinião

Dr. Mário Frota, Presidente emérito da apDC – Direito do Consumo, Coimbra

 Erro sobre as qualidades da coisa? Ou garantia, que é outra loisa??

 

“Comprei um veículo híbrido que consumiria, ao que anunciava a marca, 3,8 litros/100 Km, a velocidade regular. O facto é que o consumo era sempre da ordem dos 6 – 7 litros, a velocidade constante de 120 Km.

O que quero é exigir responsabilidades ao concessionário ou à própria marca e não sei como. Poderei anular o contrato?”

 1. A situação em análise enquadra-se no âmbito das hipóteses de não conformidade, de harmonia com o que prescreve a Lei da Compra e Venda de Consumo:

“… os bens devem… corresponder à quantidade e possuir as qualidades e outras características, inclusive no que respeita à durabilidade, funcionalidade, compatibilidade e segurança, habituais e expectáveis nos bens do mesmo tipo considerando, designadamente, a sua natureza e qualquer declaração pública feita pelo profissional, ou em nome deste, ou por outras pessoas em fases anteriores da cadeia de negócio, incluindo o produtor, nomeadamente na publicidade ou na rotulagem” (DL 84/2021: al. d) do n.º 1 do art.º 7.º).

2. A ser assim, com efeito, o consumidor tem 3 anos para denunciar a não conformidade (e não dois meses como na lei anterior), após detectar as diferenças:

“O profissional é responsável por qualquer falta de conformidade que se manifeste no prazo de três anos a contar da entrega do bem ” (DL 84/2021: n.º 1 do art.º 12).

3. “Os direitos atribuídos ao consumidor … caducam decorridos dois anos … da data da comunicação da falta de conformidade”, o que quer significar que, após a denúncia da não conformidade, terá dois anos para propor a acção, em tribunal, sob pena de caducidade ((DL 84/2021: n.º 1 do art.º 17).

4. “Nos casos em que a não conformidade se manifeste no prazo de 30 dias após a entrega do bem, o consumidor pode solicitar a imediata … resolução do contrato (a sua extinção por incumprimento), com a devolução do bem e a restituição do preço na íntegra (DL 84/2021: art.º 16).

5. Os demais remédios parece não se ajustarem na circunstância: a reparação e a substituição, porque, após os 30 dias, ter-se-ia de considerar a reparação ou a substituição (esta também presente no art.º 16) como soluções inadequadas, porque todos os modelos têm gastos da ordem dos 6 / 7 litros, que não os anunciados 3,8 l / 100 Km. E não será nem a reparação nem a substituição a conduzir à reposição da conformidade.

6. Poderá o consumidor enveredar eventualmente pela redução adequada do preço, se essa for a sua opção: mas o pôr-se termo ao contrato parece ser a mais adequada.

7. Para além da extinção do contrato, pode o consumidor, na circunstância, exigir do fornecedor a reparação dos prejuízos pelos consumos excessivos entretanto efectuados por referência aos dados publicitados (Lei 24/96: n.º 1 art.º 12)

CONCLUSÃO

1. Há não conformidade se se anunciar um consumo baixo de combustível (3,8 l /100 Km.) e o real exceder tais valores (no caso para cerca do dobro).

2. O consumidor pode, nestes casos, pôr termo ao contrato, tanto nos primeiros 30 dias (direito de rejeição), como dentro do período da garantia legal, porque nem a reparação nem a substituição constituirão solução adequada.

3. A comunicação da não conformidade ao vendedor deve ser feita no lapso de 3 anos, que é o da garantia legal.

4. Após a comunicação, o consumidor tem dois anos para accionar o fornecedor sob pena de caducidade do direito de acção.

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