quarta-feira, 7 de junho de 2023

QUEM É QUE AFINA A PROSA À PUBLICIDADE ENGANOSA?


Diz de modo amplamente sugestivo a publicidade de uma das insígnias da grande distribuição alimentar:

“Cereja embalada a 3,49 €…”

 

Palavras como cerejas

Contos a que acrescem pontos

E assim nos “apedrejas”

E nos deixas meio  tontos…

 

Que o que rende

É “enganar” a gente!

 

Diz, com efeito, a publicidade, em voz “off”, precedida de imagens ilustrativas:

“Cereja embalada a 3,49 €…”

E onde está o logro, o engano?

É que, diz a lei dos preços, a unidade de medida é o quilo: e, no caso, é de embalagens de meio quilo (algo que de todo se não revela na palavra), em imagens atractivas, que se trata...

E o peso vem grafado a letras miudinhas no suporte, que não é detectável a olho nu.

Dá-se a entender que é da unidade de medida que se fala e de que se exibe o preço: mas a unidade de medida é o quilo e não metade, ou seja, meio quilo.

O consumidor tem de acreditar só em metade do que dizem e dobrar sistematicamente o preço anunciado? É essa a nova “técnica” adoptada pelas agências de publicidade, agora que o crime da “reduflação” está na moda?

Não se olvide que, em dados termos, a reduflação é crime de fraude sobre mercadorias, a despeito do que para aí propalam “certos senhores”, numa tentativa de  dourar a pílula…

Ou é de esperteza saloia que se trata, como se infere desta “montagem”? Mas lá que cai sob a teia da publicidade enganosa, não parece restarem dúvidas

Diz o Código da Publicidade (que remete neste passo, no seu artigo 11, para a o artigo 7.º Lei das Práticas Comerciais Desleais, no quadro das práticas enganosas):

“1 - É enganosa a [publicidade] que contenha informações falsas ou que, mesmo sendo factualmente correctas, por qualquer razão, nomeadamente a sua apresentação geral, induza ou seja susceptível de induzir em erro o consumidor em relação a um ou mais dos elementos a seguir enumerados e que, em ambos os casos, conduz ou é susceptível de conduzir o consumidor a tomar uma decisão de transacção que este não teria tomado de outro modo:

d) O preço, a forma de cálculo do preço ou a existência de uma vantagem específica relativamente ao preço; …”

Ora, a Lei dos Preços (DL 138/90, de 26 de Abril), a propósito de unidades de medida de referência, reza no n.º 1 do seu artigo 3.º o seguinte:

Relativamente aos géneros alimentícios, o preço da unidade de medida referir-se-á:

 

a)    Ao litro, no que diz respeito aos géneros alimentícios comercializados por volume;

 

b)     Ao quilograma, quando diz respeito aos géneros alimentícios comercializados a peso.”

 

E, no que tange, à publicidade, a lei é expressa ao aludir, no seu artigo 6.º, exactamente sob tal epígrafe, o que segue:

“1 - A publicidade, sempre que mencione preços de bens ou serviços, deve … indicar de forma clara e perfeitamente visível o preço total expresso em moeda com curso legal em Portugal, incluindo taxas e impostos.

 

2 - A publicidade escrita ou impressa e os catálogos […], quando mencionem o preço de venda dos géneros alimentares e produtos não alimentares …, devem igualmente conter, nos mesmos termos do número anterior, a indicação do preço da unidade de medida…”.

 

Logo, é de um embuste que se trata: para além do que se consigna na lei, toda a gente pensa ainda no quilo (e no litro) como unidades de referência e, não, em 488 gr, 532 gr, ou 619 gr…

 

As agências de publicidade andam tão falhas de imaginação que enveredam por estes prpocessos? É desse modo que cumprem o seu código deontológico?

Não há limites na forma de atrair os consumidores para os produtos que se anunciam?

E as autoridades demitem-se de intervir só porque estamos perante insígnias de enorme poder e projecção?

Os consumidores merecem mais. Merecem, sobretudo, que os tratem com dignidade que não a golpes de franca menoridade e supina desconsideração…

É que os preços atraem as pessoas. E, depois de se acharem no interior dos estabelecimentos, detectado o logro, não levam aqueles artigos porque a preços exorbitantes (o dobro do anunciado, à exaustão, no pequeno ecrã), mas levam outros, indistintamente…

Cumpra-se a lei. Para que não sejam só vítimas dela os merceeiros da esquina que não têm desafortunadamente, passe a expressão, “onde cair mortos”…

 

 

Mário Frota

presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal

 

 

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