quinta-feira, 17 de novembro de 2022

De promessas está o inferno cheio…

 

De artifícios e embustes

Está prenhe  a publicidade

Inda que haja reajustes

 É patente a iniquidade…

De promessas está o inferno cheio…

Tudo se passa ainda sob o império da Lei Antiga (DL 67/2003, de 08 de Abril de 2003), que será a aplicável no caso vertente:

 

“Comprei um veículo híbrido (Honda Civic) que consumiria , pelo anúncio, 3,8 litros/100 Km, a velocidade regular.

O consumo anda, porém, entre os 6 / 7 litros, a velocidade constante: 120 Km.

Que fazer para exigir responsabilidades ao concessionário ou à própria marca?”

Ponderados os factos, a situação é susceptível de configurar ou

          prática negocial desleal (enganosa) ou

          publicidade enganosa ou

          erro sobre as qualidades da coisa ou

1.         A concreta hipótese de facto  enquadra-se, ao que nos parece, no âmbito das hipóteses de não conformidade da Lei Antiga das Garantias dos Bens de Consumo [alínea d) do n.º 2 do artigo 2.º], aplicável ainda ao caso:

“Presume-se que os bens de consumo não são conformes com o contrato se se verificar algum dos seguintes factos:

…Não apresentarem as qualidades e o desempenho habituais nos bens do mesmo tipo e que o consumidor pode razoavelmente esperar, atendendo à natureza do bem e, eventualmente, às declarações públicas sobre as suas características concretas feitas pelo vendedor, pelo produtor ou pelo seu representante, nomeadamente na publicidade ou na rotulagem.”

2.         A ser assim, pois, o consumidor teria 2 meses para denunciar a desconformidade, após detectar as diferenças:

 “Para exercer os seus direitos, o consumidor deve denunciar ao vendedor a falta de conformidade num prazo de dois meses, caso se trate de bem móvel…” (n.º 2 do artigo 5.º - A)

E dentro dos 2 anos contados da entrega da coisa, já que essa é garantia dos bens móveis, consoante o n.º 3 do artigo:

“Caso o consumidor tenha efectuado a denúncia da desconformidade, tratando-se de bem móvel, os direitos atribuídos ao consumidor nos termos do artigo 4.º caducam decorridos dois anos a contar da data da denúncia…”

3.         E, de entre os remédios de que o comprador podia lançar mão, o da extinção do contrato figura como o mais adequado à circunstância: podia, pois, pôr termo ao contrato, devolvendo o veículo e exigindo a restituição do montante pago ou o cancelamento do crédito concedido. Uma vez que a reparação do automóvel não parece satisfazer os interesses em presença. Tão pouco a sua substituição ou a redução adequada do preço. Que são os mais remédios previstos na lei.

4.         Sem prejuízo da indemnização a que houver lugar pelos danos causados ao comprador (LDC: art.º 12).

5.         Mas o consumidor só pode agir contra o concessionário, que não contra o fabricante. Poderia eventualmente “voltar-se” contra o fabricante, nestes casos:

“Sem prejuízo dos direitos que lhe assistem perante o vendedor, o consumidor … pode optar por exigir do produtor a sua reparação ou substituição, salvo se tal se manifestar impossível ou desproporcionado tendo em conta o valor que o bem teria se não existisse falta de conformidade, a importância desta e a possibilidade de a solução alternativa ser concretizada sem grave inconveniente para o consumidor.” (n.º 1 do artigo 6.º). Para exigir só – e tão só - a reparação ou a substituição.  O que não é patentemente a situação!

 

Mário Frota

Presidente emérito da apDC- DIREITO DO CONSUMO - Portugal

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