terça-feira, 18 de outubro de 2022

RÁDIO VALOR LOCAL DIRETO AO CONSUMO

 


“Informar para Prevenir”

PROGRAMA

18 de Outubro de 2021

 

 

PERGUNTA

PRODUTOS E SERVIÇOS NÃO SOLICITADOS

O pior, diz um ouvinte, é que apesar de a lei parecer dizer que não se tem de pagar o que não se encomendou, o que não se contratou, mas nos chega a casa, continuam os vendedores a querer cobrar à força tais coisas. E mandam facturas e insistem e ameaçam…

Em que ficamos?

RESPOSTA

Comecemos, em geral, pela LEI-QUADRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR:

Aí se estabelece de forma singular no n.º 4 do seu artigo 9.º:

“O consumidor não fica obrigado ao pagamento de bens ou serviços que não tenha prévia e expressamente encomendado ou solicitado, ou que não constitua cumprimento de contrato válido, não lhe cabendo, do mesmo modo, o encargo da sua devolução ou compensação, nem a responsabilidade pelo risco de perecimento ou deterioração da coisa.”

 

PERGUNTA II

Mas, decerto, que pelo que de si já ouvimos, a coisa não se fica por aí. Não é assim?

RESPOSTA

Passemos à lei que o proíbe também em geral tais práticas, com realce, porém, para os SERVIÇOS PÚBLICOS ESSENCIAIS:

O DECRETO-LEI n.º 24/2014, de 14 de Fevereiro, que no seu artigo 28.º, sob a epígrafe “fornecimento de bens não solicitados” reza o seguinte:

“1 - É proibida a cobrança de qualquer tipo de pagamento relativo a fornecimento não solicitado de bens, água, gás, electricidade, aquecimento urbano ou conteúdos digitais ou a prestação de serviços não solicitada pelo consumidor…

2 - Para efeitos do disposto no número anterior, a ausência de resposta do consumidor na sequência do fornecimento ou da prestação não solicitados não vale como consentimento.”

 

PERGUNTA III

 Aqui, o velho ditado  “quem cala consente” não vale de maneira nenhuma.

Mas há mais regras a disciplinar estas coisas? Há mais leis a proibi-las, não?

RESPOSTA

Sim, no que se trata, depois, de se exigir dinheiro por aquilo que o consumidor não solicitou, não encomendou e, como diz a Lei-Quadro, nem é o resultado de qualquer contrato validamente celebrado, há lei a preveni-lo.

E, depois, às práticas comerciais desleais, na modalidade práticas das agressivas:

PRÁTICAS COMERCIAIS DESLEAIS

É o Decreto-Lei n.º 57/2008, de 26 de Março, que estatui, no seu artigo 12, o que segue:

“Práticas comerciais consideradas agressivas em qualquer circunstância

São consideradas agressivas, em qualquer circunstância, as seguintes práticas comerciais:

f) Exigir o pagamento imediato ou diferido de bens e serviços ou a devolução ou a guarda de bens fornecidos pelo profissional que o consumidor não tenha solicitado, sem prejuízo do disposto no regime dos contratos celebrados à distância acerca da possibilidade de fornecer o bem ou o serviço de qualidade e preço equivalentes.”

 

 

PERGUNTA IV

Mas também já se falou aqui de empréstimos concedidos aos consumidores sem que tenham sido pedidos, num abuso considerável, que de onde em onde ocorre e surge sempre alguém a denunciar.

RESPOSTA

E no que tange aos serviços financeiros à distância, particular relevo, entre outros, para o diploma legal que disciplina os

CARTÕES DE CRÉDITO NÃO SOLICITADOS

Rege aí o DL 95/2006, de 29 de Maio, em cujo artigo 7.º se diz com meridiana transparência:

“Serviços financeiros não solicitados

1 - É proibida a prestação de serviços financeiros à distância que incluam um pedido de pagamento, imediato ou diferido, ao consumidor que os não tenha prévia e expressamente solicitado.

2 - O consumidor a quem sejam prestados serviços financeiros não solicitados não fica sujeito a qualquer obrigação relativamente a esses serviços, nomeadamente de pagamento, considerando-se os serviços prestados a título gratuito.

3 - O silêncio do consumidor não vale como consentimento para efeitos do número anterior.

4 - O disposto nos números anteriores não prejudica o regime da renovação tácita dos contratos.“

O silêncio não vale declaração: quem cala não consente. Uma vez mais. E perante realidades próximas. Em que não há expresso consentimento de banda do consumidor.

PERGUNTA V

Mas temos também as entradas nos restaurantes que são postas na mesa, que os empregados dos restaurantes levam para a mesa sem qualquer cerimónia e que depois aparecem na conta, no final da refeição. Não é assim?

RESPOSTA

Assim é, com efeito.

E, por último, pois, no tocante aos serviços de restauração, hotelaria e similares.

NO REGIME JURÍDICO DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADES DE COMÉRCIO, SERVIÇOS E RESTAURAÇÃO,

em vigor desde 1 de Março de 2015, se diz expressamente no artigo 135:

“1 - Nos estabelecimentos de restauração ou de bebidas devem existir listas de preços, junto à entrada do estabelecimento e no seu interior para disponibilização aos clientes, obrigatoriamente redigidas em português, com:

a) A indicação de todos os pratos, produtos alimentares e bebidas que o estabelecimento forneça e respectivos preços, incluindo os do couvert, quando existente;

b) A transcrição do requisito referido no n.º 3.

2 - Para efeitos do disposto no presente artigo, entende-se por couvert o conjunto de alimentos ou aperitivos identificados na lista de produtos como couvert, fornecidos a pedido do cliente, antes do início da refeição.

3 - Nenhum prato, produto alimentar ou bebida, incluindo o couvert, pode ser cobrado se não for solicitado pelo cliente ou por este for inutilizado.”

E para a violação de cada um destes preceitos, excepção feita à regra geral, depois concretizada em cada um dos diplomas particulares, a lei comina coimas e sanções acessórias de montantes variáveis.

Aliás, há um ouvinte que se nos dirige que, à garrafa de vinho, num restaurante no Algarve, num almoço com a mulher, preferiu o copo de vinho.

Veio o primeiro copo e, aproveitando-se da distracção do casal, foram enchendo os copos e, no final, apresentam a conta de 5 ou 6 copos de vinho, sem que tenham sido solicitados os mais copos.

E pergunta-nos, não é assim?, se teria de pagar os copos não solicitados, já que não deu o seu consentimento para o efeito.

Com efeito, estamos perante fenómeno análogo ao que vimos de tratar.

 

PERGUNTA VI

No período pós-pandemia sucedem-se os acidentes nas auto-estradas. E há registos de acidentes provocados com pedras arremessadas das passagens superiores que atravessam as auto-estradas, com cargas deixadas por veículos pesados que nelas circulam, por animais que atravessam olimpicamente as faixas de rodagem, etc.

Nestes casos há ou não responsabilidade das concessionárias. E se há como é que é possível fazer actuar tais responsabilidades?

RESPOSTA

Os acidentes nas auto-estradas sucedem-se também em razão quer de

. atravessamento de animais, quer de

. objectos inanimados nelas deixados, quer ainda de

. pedras arremessadas de passagens superiores, como de

. líquidos na via (v. g. ,lençóis de água).

Sempre se discutiu se se estava perante um contrato ou se a responsabilidade de tais factos emergente se situava fora de qualquer relação contratual.

E o facto de ser ou não um contrato não é de somenos.

Tratando-se de um contrato, cabe à concessionária a prova de que o facto não procede de culpa sua.

A não haver contrato, é ao automobilista que cabe a prova de que a culpa do acidente é imputável à concessionária.

Desde 1996 que, de acordo com a Lei de Defesa do Consumidor, se pode dizer que se está perante um contrato (lei 24/96: n.º 2 do art.º 2.º).

Porém, poucos se “atreveram” desde então a qualificar tal relação como contratual.

Uma lei de 2007, sem ter tomado posição sobre a natureza da relação, mandou inverter o ónus da prova nessas circunstâncias, obrigando as concessionárias a fazer prova de que a culpa do acidente não lhes cabe.

Eis alguns julgados dos tribunais superiores [Tribunal da Relação do Porto: acórdão de 16 de Março de 2015):

I - Em caso de acidente causado por cães (ou outros animais) que se introduzam numa auto-estrada, presume-se o incumprimento da concessionária.

II - O art.º 12º, nº 1, da Lei nº 24/2007, de 18.7, impõe à concessionária da auto-estrada o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança que sobre si impendem, relativamente à ocorrência de alguma das situações nele previstas.

III - Para cumprir esse ónus não basta à concessionária fazer a prova de que foi diligente no cumprimento genérico dos seus deveres, devendo provar qual foi o evento, concreto, que não lhe deixou realizar o cumprimento.

IV - Em caso, de acidente causado pelo atravessamento de animais, a concessionária só afastará aquela presunção se demonstrar que a presença do animal na via, se deve a causa que não lhe é imputável, ou é atribuível a outrem.”

E Supremo Tribunal de Justiça - acórdão de 2 de Novembro de 2010:

“I - A Brisa é obrigada a assegurar, de modo continuado e permanente, a conservação das auto-estradas de que é concessionária, devendo proceder às intervenções necessárias e adequadas para, salvo casos de força maior devidamente comprovados, nelas se possa circular sem perigo.

 II -Por isso, enquanto concessionária, não obstante na passagem superior o tráfego de peões ser reduzido, não pode dizer que é, pura e simplesmente, alheia ao acto de arremesso, não lhe cabendo qualquer responsabilidade pelos danos derivados. 

 III -  É certo que o arremesso foi efectuado por alguém, mas desconhece-se em que circunstâncias concretas o mesmo ocorreu, pelo que em face da matéria assente, ressalta à evidência que o sistema de protecção existente ao nível da passagem superior não é minimamente fiável para obviar quer ao arremesso, quer à queda de pedras, para as faixas de rodagem da auto-estrada que se encontram ao nível inferior …”

 

PERGUNTA VII

Então o que manda a lei neste particular? O que é que a lei estabelece?

RESPOSTA

Nas auto-estradas… em caso de acidente rodoviário, com consequências danosas para pessoas ou bens, o ónus da prova do cumprimento das obrigações de segurança cabe à concessionária, desde que a causa respeite a:

. Objectos arremessados para a via ou existentes nas faixas de rodagem;

. Atravessamento de animais;

. Líquidos na via, quando não resultantes de condições climatéricas anormais.

A confirmação das causas do acidente é obrigatoriamente verificada no local por autoridade policial competente.

Em conclusão:

Importa ter em consideração estes ditames da lei para assacar a responsabilidade que às concessionárias das auto-estradas cabe sempre que ocorram situações destas.

Tirar fotos do local.

Chamar de imediato as forças de segurança. Que dos factos se ocuparão e levantarão os autos da ocorrência.

Não tocar num só dos objectos no local do sinistro, aguardando serenamente a chegada dos elementos do corpo de segurança (GNR – Brigada de trânsito) e, eventualmente, se for o caso, das da emergência médica.

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Imprensa Escrita - 6-11-2024