Um consumidor advertido, dá-nos nota de que em Leiria – fenómeno que deve estar ocorrer por todo o País – se publicita um DESCONTO DE 50% sobre o Preço Recomendado pela marca, em dois amplos corredores, nos Hipermercados Continente, pejados de cerveja.
E se o consumidor, mais desperto, se propõe perguntar do que se trata, como no-lo confidencia o consumidor, eis a resposta, na ‘ponta da língua’, sem tergiversações:
“Agora tem de ser assim porque saiu uma lei que entrou em vigor em Maio…”
Vai-se à procura da noção de ‘preço recomendado’ e da lei nada consta: e é do glossário do “legislador” Continente [que dita as suas regras] que avulta a definição.
Mas só terá acesso à página quem se dispuser a permitir os “cookies”, não havendo alternativa, como é de regra, a um “recusar todos”…
De modo de quem não quiser oferecer os seus passos pelas deambulações na Rede à Sonae – Distribuição fica sem saber, na realidade, o que é “PREÇO RECOMENDADO”…
Vejamos então o que diz a Lei da Venda com Redução de Preços?
Não estaremos perante uma prática enganosa, depois da alegada concertação dos preços nas cervejas, de que a AdC tanto se tem feito eco?
O que diz, no seu preâmbulo, o Decreto-Lei n.º 109-G/2021, de 10 de Dezembro, que transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva Omnibus?
No que toca às vendas com redução de preços:
“Ademais, ainda a respeito das alterações introduzidas ao Decreto-Lei n.º 70/2007, de 26 de Março, na sua redacção actual, passa a salvaguardar-se que, nas práticas comerciais de redução de preço, as comparações com preços de referência devem ser efectivamente reais, por forma a assegurar a livre e esclarecida formação de vontade pelos consumidores, impondo-se que aquelas sejam claras e vedando-se expressamente a utilização de unidades de medida distintas e a realização de comparações de produtos em condições distintas (como a comparação de um produto vendido em embalagens («packs») com o mesmo produto vendido de forma unitária), devendo, no caso dos produtos introduzidos pela primeira vez no mercado, ser anunciado o preço a praticar após o período de venda com redução de preço, cuja efectiva prática, por um período razoável, deve ser susceptível de ser demonstrada pelo operador económico, de modo a garantir que o preço de referência anunciado é efectivamente praticado.”
E o que prescrevem os dispositivos aparentemente em presença?
Decreto-Lei n.º 70/2007, de 26 de Março
PREÇO DE REFERÊNCIA
1 - A redução de preço anunciada deve ser real, por referência ao preço mais baixo anteriormente praticado para o mesmo produto ou, quando se trate de um produto não comercializado anteriormente pelo agente económico, por referência ao preço a praticar após o período de redução.
2 - (Revogado.)
3 - O preço a praticar na venda com redução de preço deve respeitar o disposto no regime jurídico das práticas individuais restritivas de comércio relativamente às vendas com prejuízo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 166/2013, de 27 de Dezembro.
4 - Exceptuam-se do disposto no número anterior, a venda com redução de preço sob a forma de venda em saldos e as liquidações.
5 - Incumbe ao operador económico a prova documental do preço mais baixo anteriormente praticado e, no caso de serem utilizadas condições mais vantajosas do que as utilizadas nos períodos de vendas sem redução de preço, a prova de que a vantagem é real e concretizável
6 - No caso de produtos agrícolas e alimentares perecíveis ou de produtos que se encontrem a quatro semanas da expiração da sua data de validade, a redução de preço anunciada deve ser real por referência ao preço mais baixo anteriormente praticado durante os últimos 15 dias consecutivos em que o produto esteve à venda ou durante o período total de disponibilização do produto ao público, caso este seja inferior. [Artigo 5.º]
COMPARAÇÃO REAL DE PREÇOS
“1 - A comparação ao preço de referência tem de ser clara e deve observar o seguinte:
a) Utilização da mesma unidade de medida, não sendo admitido que o preço a praticar na venda com redução de preço seja expresso numa unidade de medida menor do que a unidade com a qual é comparada;
b) Comparação de produtos na mesma condição, sendo proibida, designadamente, a comparação de bens vendidos em embalagem com o valor unitário de cada produto que as integra.
2 - No caso de produtos introduzidos pela primeira vez no mercado, sempre que seja anunciado o preço a praticar após o fim do período de venda com redução de preço, o operador económico deve demonstrar que esse preço é efectivamente praticado por um período razoável nos três meses seguidos à promoção.[Artigo 5.º-A]
AFIXAÇÃO DE PREÇOS EM ESTABELECIMENTOS COMERCIAIS
“Na realização de práticas comerciais abrangidas pelo presente decreto-lei em estabelecimentos comerciais, a afixação de preços obedece, sem prejuízo do disposto no Decreto-Lei n.º 138/90, de 26 de Abril, na sua redacção actual, aos seguintes requisitos:
a) Os letreiros, etiquetas ou listas devem exibir, de forma bem visível, o novo preço e o preço mais baixo anteriormente praticado, sem prejuízo da indicação adicional e facultativa da percentagem de redução;
b) No caso de se tratar de um conjunto de produtos perfeitamente identificados, pode ser indicada, em substituição do novo preço, a percentagem de redução uniformemente aplicada ou um preço único para o conjunto referido, mantendo nos produtos que o compõem o seu preço inicial;
c) No caso de se tratar do lançamento de um produto não comercializado anteriormente pelo agente económico, deve constar o preço promocional e o preço efectivo a praticar findo o período promocional;
d) No caso de venda de produtos com condições promocionais deve constar especificamente o preço mais baixo anteriormente praticado e o preço promocional, o respectivo período de duração e, caso existam, os encargos inerentes às mesmas, à luz do disposto no Decreto-Lei n.º 133/2009, de 2 de Junho, na sua redacção actual.” [Artigo 6.º]
Entendemos fazer figurar os dispositivos legais em vigor, na íntegra, para que, a despeito das dificuldades que a sua leitura e interpretação tantas vezes acarretam, os consumidores possam verificar que, em rigor, não se trata de qualquer redução de preços prevista e regulada na lei.
E achamos estranho que as cervejeiras se permitam indicar aos retalhistas o PVP (Preço de Venda ao Público) dos seus produtos. O que não tira nem põe!
De qualquer forma, trata-se de prática susceptível de induzir em erro o consumidor, incursa, ao que se nos afigura, na Lei das Práticas Comerciais Desleais.
Do facto daremos parte à Entidade de Supervisão do Mercado para os efeitos que houver por pertinentes e adequados.
Como nos cumpre, aliás!
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