sexta-feira, 7 de novembro de 2025

Contratos: cumprir nem que “chovam picaretas”? Ou desistir, fazendo-lhes caretas?


“Comprei um casaco numa loja de roupa e, ao chegar a casa, vi que não me assentava bem.

Voltei à loja dois dias depois, com o talão, mas disseram-me que só faziam trocas, nunca devoluções em dinheiro.

Pergunta: a loja pode impor essa regra, mesmo que o produto esteja novo e comprado há menos de 14 dias?”

 Eis o que se nos oferece dizer:

 1.    Se a venda não for a contento nem sujeita a prova, o contrato só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei (Cód. Civil: n.º 1 do art.º 406).

 2.    No caso, é de uma compra e venda de que se não pode desistir. E, por isso, não se desfaz por vontade do vendedor ou do comprador.

 3.    Os canonistas proclamavam: “pacta sunt servanda pereat mundum”, ou seja, “os pactos são para cumprir nem que acabe o mundo”!.

 4.    O povo: “os acordos são para cumprir nem que chovam picaretas”!

 5.    O que é uma venda a contento? É a que se faz sob reserva de a coisa agradar ao comprador. E vale, em princípio, não como contrato, mas como mera proposta de venda.

 5.1.       A coisa deve ser facultada para exame.

5.2.       A proposta considera-se aceita se, entregue a coisa ao comprador, este não se pronunciar dentro do prazo de aceitação.

 6.    Mas pode tratar-se de um contrato: “se as partes estiverem de acordo sobre a resolução (a extinção) da compra e venda no caso de a coisa não agradar ao comprador”, o efeito é retroactivo - devolve-se a coisa e restitui-se o preço (Cód. Civil: art.º 924).

 7.    Há também a venda sujeita a prova: a mulher vai à loja (porque o marido não tem tempo para o fazer) e leva para casa um casaco para ele provar; se lhe ficar bem, fecha-se o contrato. Se não, devolve-o e retitui-se-lhe o dinheiro.

7.1.       Venda sujeita a prova: a de a coisa ser idónea para o fim a que se destina: se serve, serve, se não serve, devolve-se a coisa e restitui-se o preço pago (Cód. Civil: art.º 925).

8.    Ora, na circunstância, só se o casaco apresentasse uma qualquer não conformidade (deficiência, anomalia…) é que poderia exigir a sua substituição; se nos primeiros 30 dias após a entrega, poderia pôr desde logo termo ao contrato: devolução da coisa, restituição do preço (DL 84/2021: art.ºs 15 e 16).

 9.    No caso, em que a compra e venda é firme, se não houver uma não conformidade, o estabelecimento não tem de aceitar a devolução da coisa.

 10. Constitui uso comercial a hipótese da devolução contra um vale para a ulterior compra de outro bem pelo consumidor.

 11.  Os 14 dias a que a consumidora se refere são só observáveis nos contratos fora de estabelecimento e à distância [por telefone e por meio electrónico (B2C)]. Com duas excepções: nos contratos ao domicílio e no decurso de uma excursão organizada pelo fornecedor, o prazo de retractação é de 30 dias  (DL 24/2014: n.º 1 do art.º 10).

 12.  Se, porém, do contrato, reduzido a escrito ou noutro suporte duradouro,  não constar o período dentro do qual o consumidor poderá dar o dito por não dito, aos 14 e 30 dias, respectivamente, acrescerá o prazo de 12 meses dentro dos quais poderá então exercer o tal direito de retractação ou desistência (DL 24/2014: n.º 2 do art.º 10).

 

CONCLUSÃO

a.    Uma compra e venda feita regularmente em estabelecimento tem de ser cumprida pontualmente, ponto por ponto, e só pode modificar-se ou extinguir-se por mútuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidos na lei (Cód. Civil: n.º 1 do art.º 406).

b.    A mais relevante excepção é a que decorre de uma qualquer não conformidade (vício, avaria, deficiência, anomalia) que a coisa apresente, podendo recorrer-se, nos termos da lei, a qualquer dos remédios relevantes à disposição do consumidor [reparação, substituição, redução adequada do preço e extinção do contrato (por meio de resolução) (DL 84/2021: art.º 15).

 c.    Só ‘no limite’ é que haverá lugar à extinção do contrato (resolução) ou, por opção do consumidor, se a não conformidade ocorrer nos 30 dias subsequentes à entrega dos bens (DL 84/2021: art.º 16).

 d.    As mais modalidades em que os feitos ficarão em aberto são as da venda a contento (ou a gosto) e da venda sujeita a prova (Cód. Civil: art.ºs 923 a 925).

 e.    A susceptibilidade do exercício do direito de retractação em 14 ou 30 dias, consoante os casos, inere tão só aos contratos fora de estabelecimento ou à distância (telefone, electrónicos), o que não é patentemente a hipótese contemplada (DL 24/2014: n.º 1 do art.º 10.º).

 

Tal é, salvo melhor juízo, o nosso parecer.

  

Mário Frota

presidente emérito da apDC - DIREITO DO CONSUMO - Portugal

Iprensa Escrita - 7-11-2025





 

Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 14/2025, de 6 de novembro


Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 14/2025

1292/20.4T8FAR-A.E1.S1-A

Uniformização de Jurisprudência no Supremo Tribunal de Justiça

A Acção e os Recursos

AA e esposa BB intentaram acção declarativa de condenação contra o Município de Castro Marim, pedindo a condenação deste no pagamento da quantia de € 150.000,00, acrescida de juros contados desde a citação, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por eles sofridos em consequência da ocupação ilícita pelo Réu de um prédio de que eram proprietários, desde 2 de Junho de 2002 até 22 de Maio de 2018, data em que venderam o dito prédio ao Réu.

O Réu excepcionou a prescrição do direito dos Autores em virtude de terem decorrido mais de três anos desde a data em que os mesmos Autores tiveram conhecimento desse direito.

Foi proferida sentença que, considerando que a referida ocupação consubstanciava um facto continuado, julgou improcedente a excepção peremptória de prescrição e determinou o prosseguimento dos autos.

Apelou o Réu para o Tribunal da Relação que, por acórdão de 15 de Abril de 2021, julgou procedente a apelação e verificada a excepção de prescrição, com a consequente absolvição do Réu do pedido.

Inconformados, desta feita, os Autores, interpuseram eles recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, que, todavia, julgou improcedente a revista, confirmando o acórdão recorrido. Ler mais

quinta-feira, 6 de novembro de 2025

Comissão Europeia não hesitará em agir contra Shein se venda de produtos ilegais for um "problema sistémico"

 

De acordo com Thomas Régnier, porta-voz do executivo comunitário para a Soberania Tecnológica, caso se verifique que a venda de produtos ilegais é um problema sistémico na plataforma da Shein, “a Comissão não hesitará em agir”.

Ainda esta semana, o governo francês apelou à Comissão Europeia para tomar medidas mais “apertadas” em relação à Shein, acusando a empresa chinesa de violar as leis europeias devido à venda de bonecas sexuais com aspecto infantil e de armas na sua plataforma de compras online.

Citado pela Agência Lusa, Thomas Régnier, porta-voz do executivo comunitário para a Soberania Tecnológica, afirmou que caso se verifique que a venda de produtos ilegais é um problema sistémico, “a Comissão não hesitará em agir”. Ler mais 

Idosa deve ser indenizada por empréstimos não contratados

 


A 14ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) confirmou sentença da Comarca de Carangola que condenou o banco Bradesco a indenizar uma pensionista por empréstimos não contratados. A idosa deve receber R$ 10 mil por danos morais e R$ 4.920 por danos materiais.

Segundo o processo, a pensionista, pessoa idosa e analfabeta, foi surpreendida no início de 2023 com sua conta bancária zerada. Ela argumentou que sempre usou a conta apenas para recebimento e saque de proventos previdenciários, e que precisou de ajuda para entender que foram contratados empréstimos em seu nome, imediatamente transferidos via Pix a uma terceira pessoa. Ao perceber o prejuízo, decidiu acionar a Justiça.

O Bradesco alegou ausência de falha na prestação do serviço, sustentando que a culpa do ocorrido é exclusiva da vítima ou de terceiros. Afirmou que não houve danos materiais, porque os valores da pensão previdenciária foram regularmente creditados, nem danos morais, uma vez que não haveria comprovação de abalo psicológico da cliente. Ler mais

Imobiliário “aquecido” vale cada vez mais às câmaras. IMT cresce até dez vezes numa década

 

No espaço de uma década, a receita do imposto cobrado na transação de um imóvel cresceu até dez vezes nas contas de algumas autarquias.

O dinamismo do mercado imobiliário está a refletir-se num reforço financeiro das câmaras em Portugal, tendo já elevado o Imposto Municipal sobre Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) à categoria de mais valioso imposto para as autarquias, mostra o Anuário Financeiro dos Municípios Portugueses, promovido pela Ordem dos Contabilistas Certificados (OCC) e desenvolvido pelo Politécnico do Cávado e do Ave (IPCA). Os encaixes financeiros em sede de IMT chegam a aproximar-se de metade do total das receitas obtidas por um município.

Se, em 2014 (primeiro ano desta análise do Anuário), o encaixe fiscal resultante das transações representava 32,3% do valor do IMI, Imposto Municipal de Imóveis (pago anualmente pelos proprietários), agora, em 2024, significou 115,2%. Este é um claro reflexo de quão importante se tornou para as autarquias o dinamismo do mercado imobiliário. Ainda assim, nas câmaras de pequena e média dimensão, o IMI ainda é, de forma generalizada, mais proveitoso que o IMT. Ler mais

Salário médio líquido acelera 9% para 1.298 euros. Veja as profissões com maiores aumentos

 


No terceiro trimestre, trabalhadores dependentes ganharam mais 104 euros limpos em média face há um ano. Gestores, diretores e políticos continuam a ser a classe mais bem paga.

O salário médio líquido dos trabalhadores por conta de outrem subiu quase 9% no terceiro trimestre para 1.298 euros. São mais 104 euros no bolso, livre de impostos e contribuições face há um ano. A evolução dos ordenados volta assim a acelerar depois de terem abrandado no trimestre anterior, quando tinham crescido pouco mais de 7%.

Militares, técnicos e agricultores registaram os maiores aumentos mas gestores, diretores e políticos continuam a representar a classe mais bem paga. O ordenado médio líquido deste grupo profissional atingiu os 2.037 euros, distando agora 1.236 euros face aos ordenados mais baixos dos trabalhadores não qualificados, segundo os cálculos do ECO com base nos novos dados publicados, esta quarta-feira, pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), juntamente com as estatísticas do emprego relativas ao período entre julho e setembro de 2025. Ler mais

Programa de Pós-Doutoramento em Direito - Universidade de Coimbra

 Exmo./a Senhor/a,  Agradecemos a divulgação junto de potenciais interessados/as.  O Instituto Jurídico da Faculdade de Direito da Universid...