(semana
de 09 de Setembro de 2024)
“Obsolescência é a
qualidade de obsolescente ou obsoleto; característica do que está a cair em
desuso, a tornar-se antiquado.”
Do latim obsolescentĭa,
particípio presente neutro
plural substantivado de obsolescĕre,
«cair em desuso».
A obsolescência
programada, na sua essência, é a pré-determinação do ciclo de vida de um
produto. Como se, ao nascer, se inscrevesse, na sua matriz, a concreta data do
seu passamento, da sua morte. Como se o produto, no momento do seu lançamento
no mercado, se fizesse acompanhar já de uma certidão de óbito, com a data pré-definida
do seu fim…
Constituindo o resultado
natural da inovação & desenvolvimento tecnológicos, representa em si um
enorme problema se se manifestar precocemente ou, o que é pior, se for, de caso
pensado, programada.
Em qualquer das
hipóteses, a desactualização (e a depreciação sob qualquer das perspectivas)
dos equipamentos electrónicos, p. e., ocorre em momento temporal anterior ao
expectável em vista da vida útil normal de um tal tipo ou categoria de bens de
consumo.
Há quem acentue a
diferença entre a obsolescência precoce [ou prematura] e a obsolescência
programada que se funda, aliás, na
intenção posta no fenómeno:
o a obsolescência programada é, como o nome indica,
determinada pelos produtores ou
fabricantes, como forma de promover o acesso pelos consumidores a
novos produtos, mais elaborados, tecnologicamente mais avançados e, em
princípio, com uma mais adequada “performance”;
o a obsolescência precoce assenta na natureza própria dos
materiais empregues na produção que fenecem, soçobram, se esgotam numa dada
dimensão temporal…
A Lei-Quadro de Defesa do
Consumidor, no n.º 7 do seu artigo 9.º, em aditamento cujo começo de vigência
ocorreu a 28 de Maio de 22, reza o
seguinte:
“É vedada ao profissional
a adopção de quaisquer técnicas através das quais o mesmo visa reduzir
deliberadamente a duração de vida útil de um bem de consumo a fim de estimular
ou aumentar a substituição de bens.”
O que equivale a dizer:
“É
proibida a obsolescência prematura”!
E a obsolescência
programada é crime, em França, como entre nós…
Estudos do Gabinete
Europeu do Ambiente permitem concluir que o tempo de vida útil de um smartphone, em relativo equilíbrio
com os ciclos naturais e humanos de reposição de recursos, deveria situar-se
entre os 25 e os 232 anos.
Outra é a realidade: a “vida útil” de um smartphone
é, hoje em dia, de 3 anos…
A aprovação de regras que
estendam a longevidade de alguns dos bens, em 5 anos, representaria, no Espaço
Económico Europeu,
§ a
diminuição de 12 milhões de toneladas anuais de equivalente-CO2, o que
§ significaria
retirar de circulação 15 M de veículos movidos a combustíveis fósseis… num
universo de 250 M…
Um novo “direito à
reparação” se instituiu, no ordenamento europeu, de molde a dar mais vida às
coisas.
Reparar… por forma a que
seja mais acessível manter o produto que substituir, descartando-o?
Ou será mais oneroso
reparar pelo valor da mão-de-obra com que mercado ora nos brinda?
Tal dependerá obviamente
da categoria dos produtos e da sua peculiar concepção…
Trata-se, na realidade,
de uma autêntica revolução a que tende a esboçar-se.
Será que a inversão do
paradigma não constituirá obstáculo à “Inovação & Desenvolvimento”?
Tratar-se de um direito
transversal susceptível de recair sobre todos e cada um dos bens de consumo?
Ou o seu sentido e
alcance é bem menos extenso do que se projectara?
O facto é que a Directiva
‘Direito à Reparação’ que a lume veio a 10 de Julho p.º p.º e obrigará à
adaptação das legislações nacionais até 31 de Julho de 2026, só contempla, no
quadro actual, 10 dos bens de consumo ali previstos, a saber:
1. Máquinas
de lavar roupa para uso doméstico e máquinas combinadas de lavar e secar roupa
para uso doméstico
2. Máquinas
de lavar louça para uso doméstico
3. Aparelhos
de refrigeração
4. Ecrãs electrónicos
5. Equipamento de soldadura
6. Aspiradores
7. Servidores
e produtos de armazenamento de dados
8. Telemóveis,
telefones sem fios e tábletes
9. Secadores de roupa para uso doméstico
10. Bens em que estejam incorporadas
baterias de meios de transporte ligeiros.
Ainda que com a abertura
para inclusão de mais bens,
A Directiva cria uma
Plataforma Europeia em Linha que incluirá ferramentas de fácil utilização para
a pesquisa dos reparadores por Estado-Membro.
E ainda um Formulário
Europeu de Informação sobre as Reparações que auxiliará a identificar e
escolher serviços de reparação de proximidade adequados.
Mário Frota
presidente emérito da
apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal