(in Portal do PROCON RS, Porto Alegre, publicado em 06 de
Abril de 2021)
Por Resolução de 4 de Julho de
2017, o Parlamento Europeu, deveras apostado na eliminação dos obstáculos
tanto à obsolescência precoce quanto à planeada ou programada de produtos em
circulação no mercado, arrolou um sem-número de directrizes que carreou à
Comissão Europeia, vale dizer, ao Executivo, ao Governo da União Europeia. E
que vem reiterando em pretextos sucessivos.
E, a tal propósito, exprimiu a sua voluntas
de um modo impressivo, como segue:
I
CONCEBER PRODUTOS SÓLIDOS, DURADOUROS
E DE QUALIDADE
1. Que, sempre que exequível,
se defina critérios de resistência mínimos, alusivos, nomeadamente, à robustez
do produto, à capacidade de reparação e de evolução, por categoria de produto,
desde a concepção, com o suporte, aliás, em normas desenvolvidas pelas três organizações
europeias de normalização: CEN, CENELEC
e ETSI;
2. Que se logre um equilíbrio
entre o aumento da duração de vida dos produtos, a conversão dos resíduos em
recursos (matérias-primas secundárias), as simbioses industriais, a inovação, a
procura dos consumidores, a protecção do ambiente e a política de crescimento
em todas as fases do ciclo do produto, considerando que o desenvolvimento de
produtos cada vez mais eficientes em termos de recursos não deve incentivar uma
sua curta duração de vida ou a sua eliminação prematura;
3. Que importa recordar que
questões como durabilidade, garantias comerciais alargadas, disponibilidade de
peças de reposição, facilidade de reparação e faculdade de substituição de
peças, devem integrar a oferta comercial dos produtores, como resposta às
diversas necessidades, expectativas e preferências dos consumidores e como
relevante elemento de concorrência num mercado livre;
4. Que se impõe realçar o
papel de estratégias comerciais como a locação financeira de produtos na
criação de produtos duradouros, na qual as empresas de locação mantêm a
propriedade das unidades fornecidas e dispõem de incentivos para os recolocarem
no mercado e investirem na criação de produtos mais duradouros, o que
resultaria em menor volume de novas produções e de produtos descartáveis;
5. Que evoca a posição do
próprio Parlamento Europeu no que toca à revisão do pacote «Economia Circular», que altera a Directiva «Resíduos», e reforça o
princípio do alargamento da responsabilidade dos produtores, criando, deste
modo, incentivos para uma concepção mais sustentável dos produtos;
6. Que a Comissão Europeia e os Estados-membros
apoiem os produtores que desenvolvam conceitos modulares, facilmente
desmontáveis e permutáveis;
7. Que a procura de
durabilidade e de possibilidade de reparação dos produtos acompanhe o objectivo
de sustentabilidade através, por exemplo, da utilização de materiais que não
agridam o ambiente;
8. Que se registe - com
preocupação - a quantidade de resíduos electrónicos gerados por modems, routers e descodificadores
ou adaptadores de televisão quando os
consumidores se transferem de operador de comunicações electrónicas; que cumpre
recordar a uns e outros que, em conformidade com o Regulamento (UE) 2015/2120,
os consumidores já possuem o direito de utilizar equipamentos terminais à sua
escolha quando se opere a mudança de operador.
II
PROMOVER A POSSIBILIDADE DE REPARAÇÃO
E A PROVER À DURABILIDADE DOS PRODUTOS
9. Que a Comissão Europeia
diligencie em ordem à susceptibilidade de reparação dos produtos:
- incentivando
e facilitando medidas que tornem a opção de reparação mais atractiva para o
consumidor,
- através do
recurso a técnicas de construção e materiais que propiciem a reparação do
artigo ou a substituição dos seus componentes de modo mais fácil e menos
dispendiosa; é que os consumidores não devem ficar presos num ciclo
interminável de reparação e manutenção de produtos defeituosos,
- promovendo,
em caso de não conformidade recorrente ou de um
período de reparação superior a um mês, a prorrogação da garantia por período
equivalente ao tempo necessário para se concretizar a reparação,
- apelando a
que as partes cruciais para o funcionamento do produto sejam substituíveis e
reparáveis, fazendo da capacidade de reparação do produto um dos seus elementos
essenciais, quando benéfico, e desencorajando, a menos que tal se justifique
por razões de segurança, a incorporação nos produtos de componentes essenciais,
tais como pilhas e lâmpadas LED,
- instando
os produtores a fornecer manuais de manutenção e orientações de reparação no
momento da compra, especialmente em relação a produtos para os quais a
manutenção e a reparação são particularmente importantes, a fim de proporcionar
a possibilidade de alargamento do ciclo de vida do produto,
- garantindo
a possibilidade de utilização de substitutos de peças de reposição originais de
igual qualidade e desempenho, para efeitos de reparação de todos os produtos,
em conformidade com a legislação aplicável,
- desenvolvendo
a normalização, sempre que possível, das peças sobressalentes e ferramentas
necessárias para a reparação, a fim de melhorar o rendimento dos serviços de
reparação,
- encorajando
os produtores a fornecer manuais de
manutenção e orientações de reparação em diferentes línguas aos reparadores
autorizados, sempre que solicitado,
- incentivando
os produtores a desenvolver a tecnologia relativa às pilhas/baterias por forma
a garantir que o tempo de vida da pilha/bateria e dos acumuladores corresponda
melhor ao tempo de vida esperado do produto ou, em alternativa, a tornar a
substituição das pilhas/baterias mais acessível, a um preço proporcional ao
preço do produto;
10. Que considera ser benéfico
garantir a disponibilidade das peças sobresselentes essenciais ao bom e seguro
funcionamento dos produtos:
- incentivando
a acessibilidade das peças sobresselentes, para além do produto montado,
- incitando
os operadores económicos a fornecer um serviço técnico adequado para os produtos
que fabricam ou importam, e a fornecer peças sobressalentes essenciais para o
funcionamento adequado e seguro dos produtos a um preço compatível com a sua natureza
e vida útil,
- indicando
claramente a disponibilidade ou indisponibilidade de peças sobressalentes para
os produtos, as condições e o prazo de disponibilidade e, quando adequado,
através da criação de uma plataforma digital;
11. Que se incentive os
Estados-membros a estudar incentivos adequados susceptíveis de promover
produtos de elevada qualidade, duradouros e reparáveis, a estimular a reparação
e venda em segunda mão e a desenvolver formação no domínio da reparação;
12. Que se realce a importância
de salvaguardar a possibilidade de recorrer a reparadores independentes,
nomeadamente dissuadindo soluções no domínio da técnica, da segurança ou do software que impeçam a reparação fora
dos circuitos autorizados;
13. Que se incentive a
reutilização de peças no mercado de segunda mão;
14. Que se reconhece a
possibilidade de utilizar a impressão 3D para disponibilizar peças a
profissionais e consumidores; insta a que a segurança dos produtos, a
falsificação e a protecção dos direitos de autor sejam salvaguardadas a este
respeito;
15. Que importa recordar que,
para efeitos de criação de uma economia
circular bem-sucedida, desempenham também importante papel a
disponibilidade de componentes normalizados e modulares, a concepção para a
desmontagem e para produtos de longa duração e os processos de produção
eficientes.
Este leque de directrizes, sob forma de Resolução, que sirva de base
para uma radical mudança de paradigma, a caminho de 2030, ano-limite dos
objectivos do Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, a despeito dos
retardamentos provocados pelo surto pandémico que assola ainda o globo de forma
particularmente agressiva. Daí que haja de desencadear uma ofensiva radical
para que tais objectivos se alcancem de modo confortável, já que a degradação a
que em passos acelerados se assiste pode ditar, com efeito, o abastardamento
das medidas e uma vertiginosa precipitação
para níveis francamente indesejáveis, em clara oposição às metas visadas nos
Objectivos do Desenvolvimento das Nações Unidas que cumpre, a todos os títulos,
salvaguardar.
Um enorme caderno de encargos recai sobre a Comissão Europeia.
A Resolução de 25 de Novembro de 2020 do Parlamento Europeu reitera e
desenvolve alguns dos pontos enunciados, tão instante, tão célere é o propósito
de se queimarem etapas e de lograr soluções exequíveis, a breve trecho, neste
particular.
Mário Frota
apDC – DIREITO DO CONSUMO -
Coimbra