segunda-feira, 27 de março de 2023

DISCRIMINAÇÃO EM RAZÃO DA QUALIDADE DOS PRODUTOS NA MODA NA UNIÃO EUROPEIA?

Na União Europeia, para além da discriminação de preços em razão da nacionalidade e lugar de residência ou estabelecimento,  ter-se-á detectado uma prática discriminatória assente na dualidade da qualidade dos produtos, com realce para o caso específico dos géneros alimentícios.

Produtos alimentares, aparentemente os mesmos, com análoga composição, mas de qualidade manifestamente inferior, dirigidos a consumidores de determinados Estados-membros que pagam, afinal, outro tanto por produtos depreciados em razão quiçá da sua menor exigência por mor das suas deficientes qualificações e efectiva impreparação, exactamente como consumidores (para se ser consumidor é indispensável que haja competências, qualificação, formação, em suma).

De acordo com a Comunicação (2017/C 327/01), 29 de Setembro de 2017, emanada da Comissão Europeia, ter-se-á efectuado um levantamento das situações que ocorrem a tal propósito, definindo-se a gama de produtos em que tal se observa, não circunscrita às passagens aéreas e às albergarias, estalagens ou outros lugares de hospedagem.

Daí que haja de reforçar os cuidados neste particular para que as pessoas não sejam surpreendidas e deixe de haver uma Europa de europeus de primeira, outra de segunda e outra ainda de terceira…

Entre nós, o facto cabe na moldura criminal da fraude sobre mercadorias para que rege a Lei Penal do Consumo de 20 de Janeiro de 1984 (DL 28/84), no seu artigo 23, a saber:

(Fraude sobre mercadorias)

1 - Quem, com intenção de enganar outrem nas relações negociais, fabricar, transformar, importar, exportar, tiver em depósito ou em exposição para venda, vender ou puser em circulação por qualquer outro modo mercadorias:

a) Contrafeitas, falsificadas ou depreciadas, fazendo-as passar por autênticas, não alteradas ou intactas;

b) De natureza diferente ou de qualidade e quantidade inferiores às que afirmar possuírem ou aparentarem,

será punido com prisão até 1 ano e multa até 100 dias, salvo se o facto estiver previsto em tipo legal de crime que comine para mais grave.

2 - Havendo negligência, a pena será de prisão até 6 meses ou multa até 50 dias.

3 - O tribunal poderá ordenar a perda das mercadorias.

4 - A sentença será publicada.”

Trata-se, no entanto, de domínios que não saltam à vista, mas podem não escapar ao paladar, em determinadas circunstâncias.

(Cautelas com as marcas brancas que podem padecer de quebras de qualidade por referência ao produto-padrão).

Há exemplos correntes, como por exemplo, pão de centeio, pão preto, sem centeio, mas com um pó preto, feito “sabe lá Deus como e de quê”, que se assemelha e dá a coloração pretendida ao produto.

Café com misturas de fraca qualidade ou com quantidades de chicória ou outros subprodutos,  a fazer-se passar pelo café habitualmente disponível e da preferência do consumidor.

E os exemplos sucedem-se à exaustão.

Para não falar da reduflação, que é fenómeno distinto, mas que pode estar associado, se à quebra de qualidade se adicionar a perda de peso, volume ou quantidade…

 

E.T: Por falar de reduflação, convém atentar no que a própria Wikipédia regista e apresenta um extenso rol de situações de todo detectadas, ao longo dos tempos, em que o fenómeno se revê, com uma precisão tal e tamanha cópia de pormenores que talvez se não possa asseverar das dificuldades em se arrolar típicas manifestações de reduflação numa extensa gama de produtos.

Segue a enunciação:

Em 2010, a Kraft reduziu a sua barra Toblerone de 200g para 170g.

O café vendido em sacos de 1lb (453,6g) diminuiu para 400g ou menos na década de 1980

Os sacos de chá de Tetley foram vendidos em caixas de 88 em vez de 100.

A Nestlé reduziu a sua caixa de Chocolate After Eight Mint Thins de 200g para 170g.

Os Cadbury's Crunchie foram vendidos em pacotes de três em vez de quatro.

Em 2013, a Danone encolheu os seus recipientes de iogurte de 8 onças para 6 onças.

Em Janeiro de 2009, a Häagen-Dazs anunciou que iria reduzir o tamanho das suas embalagens de gelados nos EUA de 16 onças (470 ml) para 14 onças (410 ml).

Os waffles de batata "olho de ave" foram reduzidos de um pacote de 12 para um pacote de 10.

Em 2015, a Cadbury Fingers retirou dois dedos de cada embalagem, reduzindo o peso de uma embalagem de 125 gramas para 111 gramas.

Em Julho de 2015, a Cadbury Roses que pesava 975g em 2011, foi reduzida para menos de 730g, enquanto que a Cadbury Heroes foi reduzida para 695g. No entanto, o preço permaneceu o mesmo em cerca de £9.

Em 2016, a Mondelez International reduziu novamente o tamanho da barra Toblerone UK 170g para 150g, enquanto a barra de 400g se reduziu para 360g. Isto foi feito alargando a distância entre os triângulos de chocolate.

Em 2017, o Milka Alpine Milk e Milka Nuts & Raisins foi reduzido de 300 g para 270 g, enquanto a Triolade foi reduzida de 300 g para 280 g, tudo sem alterar o tamanho do saco.

Em 2017, a McVities reduziu o número de bolos Jaffa em cada pacote padrão de 12 para 10, aumentando o custo por bolo de 9,58p para 9,9 p

Em 2018, Koopmans reduziu o peso das suas embalagens de farinha de trigo sarraceno em 20% de 500g para 400g - alegando "renovado" na embalagem, sem especificar que "renovado" significava apenas que era fornecido menos produto. Não se sabe se os preços por grosso foram afectados, ao passo que é certo que os preços a retalho permaneceram exactamente os mesmos.

Em 2020, a Unilever reduziu o tamanho das cubas de gelado da Ben & Jerry's na Europa, passando de 500ml para 465ml, mantendo ao mesmo tempo o RRP de cerca de 5 euros. Apesar disso, a Unilever criticou publicamente as marcas de gelados rivais por encolherem nos Estados Unidos, onde o gelado da Ben & Jerry's ainda é vendido em cubas de tamanho (473ml).

Em 2021, a Sainsbury's substituiu os seus 80g Spicy Thai Crackers por um pacote de 40g, mas o preço foi reduzido para menos de metade, resultando num aumento de preço por peso superior a 15%.

Em 2021, a General Mills encolheu as suas caixas de cereais de tamanho familiar de 19,3 onças para 18,1 onças. Isto significa que o custo unitário por onça do produto aumentou, mas para o consumidor, o preço médio nos Estados Unidos permaneceu em $2,99 e a quantidade de cereal na caixa parece praticamente o mesmo aos olhos do consumidor.

Em 2022, a Procter & Gamble reduziu o número de folhas de folha dupla por rolo de 264 para 244 folhas no mega pacote de 18 rolos. Isto equivale aproximadamente a um rolo e meio numa embalagem de 18.

E a lista continua…

 

 

Mário Frota

presidente emérito da apDC – DIREITO DO CONSUMO – Portugal.

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