diário ‘as beiras’
Coimbra
11
de Novembro de 2022
Se
mudares de residência e puseres termo ao contrato… apesar da prepotência, nada
pagas, “sai” barato
CONSULTA
“Dificuldades próprias da
minha vida levam a que me mude dos arrabaldes de Lisboa para Porto de Mós.
Tenho um contrato com a Vodafone de um pacote de serviços por 24 meses. Propus
à operadora a transferência do contrato para a localidade que a partir de agora
me vai servir de residência. A operadora recusa-se a fazê-lo porque não dispõe
de infra-estruturas naquela zona. Para me desvincular, exige-me 960 €, que é,
segundo os seus cálculos, o que lhe deveria pagar se acaso o contrato chegasse
normalmente ao seu termo. Claro que a solução me parece de uma violência extrema
até porque eu não me recusei ao contrato, a operadora é que não me pode
continuar a prestar o serviço por não os ter na localidade. Que solução para o
meu caso?”
PARECER
1.
No quadro actual, pelo recurso ao n.º 1 do
artigo 437 do Código Civil, é possível sustentar que a ruptura do contrato em
meio a uma fidelização que se prolonga no tempo pode ocorrer sem quaisquer
consequências, no caso para a consumidora.
2.
Com efeito, nele se diz que
“Se as circunstâncias em que as partes
fundaram a decisão de contratar tiverem sofrido uma alteração anormal, tem a
parte lesada direito à resolução do contrato, ou à modificação dele segundo
juízos de equidade, desde que a exigência das obrigações por ela assumidas
afecte gravemente os princípios da boa fé e não esteja coberta pelos riscos
próprios do contrato”.
3.
Com efeito, se por um lado a mudança de
residência é inevitável, por outro, a interessada não pretende romper o
contrato, antes se processe a alteração do lugar da prestação do serviço, na
pressuposição de que a oferta da empresa de comunicações electrónicas cubra
todo o território nacional: e tal – o facto de a empresa não dispor de serviços
no concelho - não lhe é obviamente imputável.
4.
Daí que, em nossa opinião, à ruptura do
contrato se não possa associar qualquer compensação ou indemnização à empresa.
5.
Se o facto, porém, ocorresse após a
entrada em vigor da Lei Nova de
Comunicações Electrónicas de 16 de Agosto de 2022, a saber, 14 de Novembro
em curso, já a solução sairia directamente dos seus preceitos.
6.
Com efeito, no n.º 1 do seu artigo 133, se
estabelece que
“A empresa … não pode exigir ao consumidor
titular do contrato o pagamento de quaisquer encargos relacionados com o incumprimento
do período de fidelização nas seguintes situações:
a) Alteração do local de residência
permanente do consumidor, caso a empresa não possa assegurar a prestação do
serviço contratado ou de serviço equivalente, nomeadamente em termos de
características e de preço, na nova morada;
b) Mudança imprevisível da habitação
permanente do consumidor titular do contrato para país terceiro;
c) Situação de desemprego do consumidor
titular do contrato, motivado por despedimento da iniciativa do empregador por
facto não imputável ao trabalhador, que implique perda do rendimento mensal
disponível do consumidor;
d) Incapacidade para o trabalho,
permanente ou temporária de duração superior a 60 dias, do consumidor,
nomeadamente em caso de doença, que implique perda do rendimento mensal disponível
do consumidor.”
7.
E, no seu n.º 2, se diz expressamente que
o consumidor porá termo ao contrato mediante comunicação escrita dirigida à
empresa, até por correio electrónico, com uma antecedência mínima de 30 dias, e
a apresentação de determinados elementos comprovativos, consoante a situação.
8.
De qualquer modo, na lei também se diz
que, para além das situações pontuais previstas nos enunciados artigos, é ainda
possível pôr temo ao contrato por aplicação dos regimes de resolução e de
modificação do contrato por alteração das circunstâncias, previstos no Código
Civil: o que quer significar que as hipóteses mencionadas não são fechadas,
antes outras se consentem, de harmonia com as ocorrências que se verificarem.
CONCLUSÃO
a. No
quadro da lei ainda vigente, se houver alteração das circunstâncias, designadamente
mudança de domicílio, é possível pôr termo ao contrato de comunicações
electrónicas, a meio da sua duração, sem quaisquer consequências,
designadamente sem incorrer em indemnização à empresa, por aplicação da lei
geral.
b. No
quadro da Lei Nova, que vigorará
desde 14 de Novembro em curso, esta específica situação está expressamente prevista
num dos seus preceitos: Lei 16/2022 – alínea a) do n.º 1 do art.º 133. E tal não determinará o pagamento de
qualquer compensação ou indemnização.
Eis, salvo melhor juízo,
a nossa opinião.
Mário Frota
Presidente emérito
da apDC – DIREITO DO CONSUMO - Portugal